quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Carta - Carlos Drummond de Andrade

 Há muito tempo, sim, não te escrevo.

Ficaram velhas todas as notícias.

Eu mesmo envelhecí: olha em relevo

estes sinais em mim, não das carícias

(tão leves) que fazias no meu rosto:

são golpes, são espinhos, são lembranças

da vida a teu menino, que a sol-posto

perde a sabedoria das crianças.


A falta que me fazes não é tanto

à hora de dormir, quando dizias

"Deus te abençoe", e a noite abria em sonho.


É quando, ao despertar, revejo a um canto

a noite acumulada de meus dias,

e sinto que estou vivo, e que não sonho.

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