Uma grande empresa têxtil estava à beira da falência na década de 1990 e parou de pagar tributos. Em 2000, aderiu a um programa de refinanciamento do governo. Quitou os valores em três anos, com juros e multa, sem descontos. Esse é um resumo de uma das histórias contadas pela presidente da Lupo em entrevista à repórter desta Folha Daniele Madureira.
Ela relata ainda que a companhia sobreviveu ao longo dos anos planejando suas operações em função de benefícios fiscais. Quando um deles foi reduzido, decidiu abrir uma nova fábrica, mas no Paraguai, onde está seu principal concorrente, uma empresa chinesa.
Mais de 130 mil empresas aderiram ao primeiro Refis. Em dois anos, mais de 70% delas foram excluídas por inadimplência. A prática de muitos contribuintes (a Lupo foi uma exceção) era suspender o pagamento após alguns meses e esperar por um novo programa. Foram cerca de dez até 2017. Em 2020, a nova legislação sobre negociações tributárias colocou um ponto final nesse ciclo, questão que abordei em outra coluna.
O pagamento dentro do Refis também evitava a punição por sonegação, já que o entendimento predominante no Judiciário é que o fato de a empresa enfrentar dificuldades financeiras ou optar por pagar funcionários e fornecedores em detrimento do fisco não afasta a responsabilidade penal do administrador. São poucos os casos em que a Justiça considerou a necessidade de evitar o fechamento imediato do negócio.
Outro tema abordado na entrevista foi a abertura da filial no Paraguai. Um vídeo compartilhado por um tributarista mostra o desespero de um empresário argentino quando se compara a carga tributária do seu país com a de um industrial paraguaio. Não colocaram um brasileiro ao lado.
Além de impostos mais baixos, o sistema tributário no Paraguai possui o regime para maquiladoras, empresas voltadas para o mercado exterior que pagam imposto único de 1% com a obrigação de cumprir uma cota de conteúdo nacional. Elas respondem por dois terços das exportações paraguaias, e 64% do que é vendido para o exterior vem para o Brasil, com destaque para autopeças e têxteis.
Se os impostos são menores, por que todas as empresas não se mudam para lá? E o que explica tamanha discrepância entre as cargas tributárias dos dois países?
A arrecadação no Brasil em percentual do PIB é de 32%, bem superior à do Paraguai (18%). Enquanto o vizinho tem uma carga próxima da média da América Latina (21%), estamos próximos da OCDE (34%), grupo de países mais desenvolvidos. Nosso governo conta com uma receita anual de US$ 4.726 por habitante. Os vizinhos têm US$ 1.733, segundo estudo publicado pelo comitê de secretários de Fazenda.
Cerca de 70% das empresas que se instalaram pelo regime de maquilas nos últimos 25 anos são brasileiras. Muitas vão em busca de menos impostos e energia barata. Também estão no vizinho o grupo Guararapes, dono da Riachuelo, entre outros.
Empresários que estão lá se queixam de dificuldade no acesso a crédito, falta de mão de obra qualificada, infraestrutura precária e alta informalidade —mais do que por aqui. O vizinho também ocupa posição pior que a do Brasil em rankings de corrupção e desenvolvimento humano.
O caso da Lupo reforça a necessidade de melhora no nosso sistema tributário. As vendas do Paraguai para o mercado brasileiro estão completamente desoneradas, algo que só teremos por aqui a partir de 2027 nos tributos federais e 2033 nos demais.

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