sábado, 22 de novembro de 2025

Os vampiros e a Polícia Federal, Luís Francisco Carvalho Filho, FSP

 A gênese do PL Antifacção aprovado pela Câmara dos Deputados é indicação alarmante da desmoralização política do Brasil.

A começar pela escolha do relator, o capitão Derrite, bolsonarista de carteirinha e secretário do presidenciável Tarcísio de Freitas. Derrite não é especialista em segurança pública, é especializado em letalidade policial.

O capitão Derrite deixou a PM depois de ser investigado em operações que resultaram em 16 homicídios, informou a revista piauí. Letal demais, o "matador de ladrão". Em 2024, o estado de São Paulo teve o maior crescimento de mortes decorrentes de intervenção policial do país (60,9%).

Muito além da disputa eleitoral em torno da narrativa da segurança pública em 2026, operando para derrotar a proposta legislativa do governo Lula, um dos alvos da missão Derrite é enfraquecer a PF.

A explicação é simples. A partir do governo FHC, sobretudo no governo de Lula, a Polícia Federal experimentou um processo de profissionalização, moralização e modernização que destoa das policias estaduais. A PF ainda é vulnerável —como se viu no governo Bolsonaro. Às vezes, não é eficiente, demora. Erra também. Mas a PF adquiriu inquestionável capacidade técnica para desbaratar com inteligência esquemas criminosos mais ou menos sofisticados.

Diversas cédulas de real empilhadas em grupos sobre uma mesa de madeira com detalhes decorativos. Ao fundo, objetos como uma escultura verde, papéis e sacolas estão visíveis.
Dinheiro apreendido pela PF na Operação Carbono Oculto - Reprodução/Polícia Federal

Não é coincidência. O enfraquecimento da PF interessa a partidos políticos do centrão. A Operação Compliance Zero, por exemplo, incomoda a bancada Master no Parlamento e, aparentemente, os governos do Rio de Janeiro e de Brasília e diversas prefeituras municipais.

A PF recolhe sinais de delito que se consuma graças à permissividade de autoridades locais, sinais ignorados pelos investigadores. As polícias estaduais estão contaminadas pela corrupção, pela inépcia e pelo abuso de poder. As corregedorias são enfeites institucionais, não costumam funcionar. O enriquecimento ilícito é amplamente tolerado. Milícias e facções proliferam porque contam com o envolvimento direto e indireto de agentes do poder público. Policiais criminosos só são identificados e punidos quando imagens comprometedoras aparecem nas redes sociais e no noticiário.

Homem visto de costas conta várias cédulas de dinheiro azul empilhadas sobre mesa redonda de vidro. Ao redor, bolsas e objetos pessoais estão espalhados, e há plantas no centro da mesa.
Dinheiro (R$ 1,6 milhão) encontrado pela Polícia Federal na casa de um dos investigados na Operação Compliance - Divulgação/Polícia Federal

Não há relação hierárquica entre a Polícia Federal e as policiais estaduais, mas a PF tem atribuição constitucional de apurar crimes federais eventualmente praticados por policiais estaduais, como evasão de divisas, contrabando, descaminho.

A primeira investida de Derrite (recuou depois) foi para condicionar a ação da PF à vontade de governadores, uma tentativa inusitada de blindagem formal. Depois, a ideia era sufocar as finanças da PF, para torná-la inoperante, drenando recursos de financiamento de suas atividades para fundos locais, como que entregando para vampiros a guarda de bancos de sangue.

A nova lei, qualquer que seja o texto final, não fará desaparecer do panorama político brasileiro o crime organizado. É suspeitíssimo, porém, o esforço para afastar a PF da luta contra o crime organizado, assim como é sintomático o descaso em relação à corrosão moral das polícias e sua incapacidade de reagir com inteligência.

modelo carioca de enfrentamento armado —danem-se os inocentes— é o paradigma que Derrite e seus aliados, atrás de votos, querem espalhar pelo país.

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