quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

'Fui diagnosticado com demência aos 49 anos', FSP

 

BBC News Brasil

Peter Alexander não esperava ser diagnosticado com demência aos 49 anos. Isso significava deixar o emprego —e se adaptar a um novo modo de vida. Agora, aos 56 anos, Peter se dedica a combater o estigma em torno de uma condição geralmente associada a pessoas idosas.

"Posso nem sempre ser capaz de expressar isso da mesma maneira, mas ainda sou a mesma pessoa que era, por dentro ainda sou Peter", disse. Ele tinha 49 anos quando marcou uma consulta com um neurologista e foi encaminhado para fazer um exame de imagem.

Um homem está sentado em um sofá claro, sorrindo para a câmera. Ele usa um suéter escuro e óculos com armação fina. Ao fundo, há uma mesa branca com alguns objetos decorativos e plantas.
Peter Alexander foi diagnosticado com demência aos 49 anos - BBC

"Eu estava começando a ter dificuldades para cumprir os prazos (no trabalho), o que nunca tinha sido um problema antes, e durante as reuniões eu não conseguia pensar em uma palavra ao falar", contou Peter, que é natural da Inglaterra, mas mora na Irlanda do Norte com a esposa, Jill, há vários anos.

"Me lembro claramente da data: era 14 de janeiro de 2018 quando os resultados chegaram e o médico disse: 'Peter, eu diagnostiquei você com demência frontotemporal'."

"Basicamente me disseram que não era mais seguro para mim trabalhar porque eu tinha discernimento reduzido e estava perdendo meu filtro, então foi muito difícil me adaptar."

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'Pode se manifestar de diferentes maneiras'

A demência frontotemporal é uma forma incomum da condição, que causa problemas de comportamento e linguagem. "As pessoas pensam que quando se tem demência é apenas uma questão de esquecer as coisas, mas é mais complexo, pode se manifestar de diferentes maneiras."

Duas pessoas estão posando para a foto em um ambiente interno decorado com madeira e detalhes ornamentais. A mulher à esquerda usa um blazer claro com listras e uma blusa preta, enquanto o homem à direita veste uma camisa branca e um blazer xadrez. Ambos estão sorrindo e parecem estar em um evento formal.
Peter mora na Irlanda do Norte com a esposa, Jill - BBC

"Não quero ser tratado de forma diferente, é imperativo que as pessoas realmente vejam a pessoa, vejam além da condição."

"Infelizmente, para muita gente, o diagnóstico pode demorar muito, e isso coloca uma enorme pressão sobre a unidade familiar."

O que é demência?

A demência é uma síndrome (um grupo de sintomas relacionados) associada a um declínio contínuo do funcionamento do cérebro. A perda de memória é um dos sintomas mais comuns, principalmente a dificuldade de se lembrar de eventos recentes.

Outros podem incluir mudanças de comportamento, humor e personalidade, perder-se em lugares familiares ou não conseguir encontrar a palavra certa durante uma conversa. Pode chegar ao ponto em que as pessoas não sabem quando precisam comer ou beber.

Mais de 22 mil pessoas vivem com demência na Irlanda do Norte, de acordo com a instituição britânica Alzheimer's Society. A expectativa é de que este número quase triplique, chegando a 60 mil até 2051.

No Brasil, cerca de 8,5% da população com 60 anos ou mais vive com a condição —aproximadamente 2,71 milhões de pessoas. De acordo com o Ministério da Saúde, a previsão é de que 5,6 milhões sejam diagnosticadas até 2050.

Embora a demência seja vista com frequência como uma doença da velhice, cerca de 5% das pessoas com a condição são classificadas como tendo demência precoce. O termo se refere a pessoas cujos sintomas começaram quando elas tinham menos de 65 anos. A Alzheimer's Society estima que existam mais de 70 mil pessoas no Reino Unido vivendo com demência precoce.

Nos últimos meses, Peter se uniu a outras pessoas da Irlanda do Norte que vivem com demência para fazer um filme sobre sua vida cotidiana. O documentário, chamado "Hear Our Voice" (Ouça nossa voz, em tradução livre), concentra-se principalmente em pessoas com demência precoce.

Ele oferece um cenário de como é viver com demência, na esperança de criar uma melhor compreensão e empatia. Peter aparece ao longo do filme e faz a narração.

"Foi concedido respeito às pessoas que sofrem de demência para fazer e assumir o controle do filme, para nos ajudar a superar os desafios únicos que enfrentamos", diz ele.

Duas pessoas estão posando para a foto em um ambiente interno decorado com madeira e detalhes ornamentais. A mulher à esquerda usa um blazer claro com listras e uma blusa preta, enquanto o homem à direita veste uma camisa branca e um blazer xadrez. Ambos estão sorrindo e parecem estar em um evento formal.
Christopher Southwell é especialista em psiquiatria para idosos na Southern Trust - BBC

O filme apresenta membros da organização Dementia NI, dedicada a pessoas com demência na Irlanda do Norte. O grupo foi criado em 2015 por cinco pessoas que viviam com demência, mas dez anos depois já conta com 15 grupos em toda a Irlanda do Norte.

Os grupos trabalharam em parceria com a Southern e a South Eastern Health Trust, que prestam serviços de saúde no país, ao realizar o projeto "Hear Our Voice". Christopher Southwell, especialista em psiquiatria para idosos na Southern Trust, diz acreditar que o filme promove uma mensagem poderosa.

"A demência é uma doença que tem um grande impacto sobre os pacientes e suas famílias e, às vezes, como profissionais de saúde, reconhecemos que há coisas que podem ser feitas melhor", ele afirma.

"Quando me envolvi e, finalmente, assisti ao filme, foi importante para mim poder dizer a pessoas como Peter e outros por trás do documentário que eu 'ouço sua voz' e levo em consideração o que você está dizendo."

Membros da organização Dementia NI se encontraram recentemente com o ministro da Saúde, Mike Nesbitt, na Assembleia Legislativa - BBC

Membros da Dementia NI se encontraram recentemente com o ministro da Saúde, Mike Nesbitt, na Assembleia Legislativa, conhecida como Stormont. Eles pediram que ele priorizasse a redução do tempo necessário para obter um diagnóstico de demência.

"Parabenizo as Trusts e a Dementia NI por desenvolverem este poderoso documentário que, sem dúvida, desafiará os estereótipos existentes e será uma maneira informativa de educar as pessoas sobre a melhor forma de apoiar os indivíduos que vivem com demência", disse Nesbitt, em comunicado, pouco depois do lançamento do documentário.

'A demência não nos define'

Karen Kerr, chefe de engajamento da organização Dementia NI, disse que os membros do grupo eram "fervorosos em relação à importância de obter um diagnóstico precoce".

"Quando você recebe um diagnóstico precoce, abrem-se muitas oportunidades para que se possa continuar a viver bem, com um senso de propósito, e é isso também que o filme está tentando destacar."

"Quando ouvimos pessoas como Peter, acho que isso demonstra que as pessoas com demência têm voz não apenas para si mesmas, mas para todos os afetados pela demência." Peter acrescenta: "Quando se trata de pessoas como eu, com demência, por favor, não nos descarte, temos uma voz, a demência não nos define".

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