sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Hélio Schwartsman - Garupa remunerada, FSP

 Comento hoje a queda de braço entre a Prefeitura de São Paulo e as empresas que querem forçar o serviço de mototáxi na cidade. Minha primeira observação diz respeito ao pacto político sobre o qual o país se erige.

No papel, o Brasil é uma federação. Na prática, porém, é pequena a autonomia de estados e municípios para legislar sobre as questões relevantes. Quase tudo o que importa, do direito penal e civil até o trânsito e a propaganda, é competência privativa da União.

O terminal Grajaú, na região sul de São Paulo, é um dos principais pontos de mototáxis na capital; juiz negou multa à 99 pelo serviço de transporte de passageiros - Bruno Santos - 4.jul.22/Folhapress

Num Estado que eu desenhasse, caberia às cidades definirem se terão ou não serviços de mototáxi. São elas, afinal, que arcam com os impactos mais diretos dessa atividade, seja na forma de vítimas de acidentes que vão parar nos hospitais municipais, seja do esvaziamento do transporte coletivo —uma conta que está ficando cada vez mais difícil de fechar.

No Brasil como ele é (não como eu gostaria que fosse), as empresas de mototáxi me parecem ter um caso jurídico melhor que o da prefeitura. Quer dizer, acho que até nosso criativo STF teria dificuldades para afirmar que sua decisão de 2019 que considerou inconstitucionais leis municipais que restringem em demasia serviços de transporte por aplicativos vale para veículos de quatro rodas, mas não para os de duas.

Ao fim e ao cabo, a prefeitura terá de ceder e seria prudente começar a preparar desde já a melhor regulamentação possível. A perspectiva de alta nos politraumas é preocupante, mas não necessariamente teremos o inferno na terra.

Até pela estrutura de incentivos econômicos do negócio, motoqueiros que levam passageiros deverão ser mais cuidadosos do que os que transportam mercadorias e correm constantemente contra o relógio.

Mesmo que a prefeitura conseguisse prolongar a situação de impasse (serviço não ilegal, mas não autorizado comercialmente), ela acabaria perdendo. Vale aqui o que o comediante George Carlin dizia da prostituição: não dá para querer proibir a venda de algo que pode ser dado de graça totalmente dentro da lei. Se a carona na garupa é permitida, fica difícil impedir a garupa remunerada.

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