Durante quase três anos, o líder chinês Xi Jinping apresentou-se como o comandante em chefe contra um insidioso vírus descoberto no fim de 2019 em seu país.
Munido do arsenal que apenas uma tecnoditadura com amplo controle sobre a liberdade de seus cidadãos pode oferecer, assombrou o mundo com sua resposta inicial à pandemia da Covid-19.
Lockdowns draconianos, restrição de entrada e saída, testes, ferramentas tecnológicas de acompanhamento e o desenvolvimento rápido de uma campanha de vacinação fizeram do berço da crise um relativo oásis.
Como seria previsível, Xi usou o desempenho politicamente, bradando a cada discurso a superioridade do tal socialismo com características chinesas sobre os ocidentais que empilhavam seus mortos.
Exportou a propaganda com as vacinas, o que de resto era seu direito: mesmo baseados em tecnologias ora menos eficazes para as novas variantes do Sars-CoV-2, os imunizantes salvaram milhões.
O triunfo teve um preço. A economia, que havia desacelerado a 2,2% de crescimento em 2020 e tido uma forte retomada de 8,1% em 2021, voltou a engasgar —com 3,2% de expansão projetada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
O Ocidente, por sua vez, buscou algum grau de autonomia quando observou complexos fabris chineses serem fechados por causa de uma mera ocorrência de Covid-19.
Mais importante, multidões protestaram de forma inédita no fim de novembro contra as regras rígidas, atacando o governo do país asiático. Como o mundo de 2022 não toleraria um novo massacre da praça da Paz Celestial, Xi cedeu.
Só que, em vez de lançar mão de um plano B, de transição, ele começou a abandonar todos os preceitos de sua política de Covid zero desde o início do mês.
Pessoas com sintomas respiratórios passaram a ser obrigadas a comparecer ao trabalho, não há mais quarentena para entrar na China e o arcabouço de vigilância está sendo desmontado.
O resultado é uma onda nunca vista de contaminações pelo país, que os apologistas do regime dizem ser aceitável porque a Covid-19 se mostra menos fatal hoje.
É aposta, que incorre no risco de fomentar novas e imprevisíveis variantes, mas o fato de que o governo suspendeu a contagem de casos e a testagem em massa sugere um apagão sanitário já denunciado pela Organização Mundial da Saúde. As mortes poderão ser contadas em milhões, dizem especialistas.
Apenas na segunda (26), Xi enfim falou sobre o tema. Proferiu platitudes, sem citar a opacidade oficial ou prestar contas acerca da reviravolta —uma lembrança de como ditaduras funcionam.
Nenhum comentário:
Postar um comentário