MISSA DO GALO
“Nunca pude entender a conversação que tive com uma senhora, há
muitos anos, tinha eu dezessete, ela trinta. Era noite de Natal”.
Este é o princípio do conto de Machado de Assis, em seu livro “Páginas
Recolhidas”.
No caso, é compreensível que o rapazinho Nogueira não
compreendesse a conversação que teve com Dona Conceição. A
diferença de idade e as circunstâncias explicam a sua perplexidade.
Mas, já velho, muitos anos depois, ele não a compreendia.
Na verdade, raramente, ou nunca, compreendemos as conversas que
temos com as mulheres. É um jogo de equívocos, sejam elas mais
novas, ou mais velhas do que nós.
Exatamente por isso, as mulheres são deliciosas, enquanto nós outros,
bem ou mal intencionados, somos paspalhões.
As mulheres, quando dizem que vão, ficam; e quando afirmam que
ficam, vão.
Acresce que a era Noite de Natal, com o seu sortilégio.
Mas não é preciso que o seja. Qualquer dia, ou qualquer noite são
bastante para que não entendamos a conversação que temos com as
mulheres.
Eu, por mim, e vejam que sou experimentado, tive diálogos por muito
tempo, com uma senhora, com a qual me encontrava casualmente na
rua.
Falávamos sobre o tempo, se ia ou não chover naquela tarde, ou de
noite. Era um jogo de negaças. Queríamos e não queríamos. Dez,
doze minutos depois, nos despedíamos. Mas eu levava para casa o
seu perfume. Aquela mulher encantadora, nunca pude esquecê-la.
Nunca se sabe se a mulher é inteiramente nossa. Cercada de
mistérios, a mulher é a própria vida, que também jamais chegamos a
entender.
A mulher não faz afirmações. Concorda, discordando. Sorri, quando
estamos embaraçados. E se também sorrimos, torna-se séria e grave.
A sua imagem é sempre crepuscular. E mesmo quando amanhece, a
mulher anoitece.
A pergunta que fazemos, quando voltamos para casa é: “Que é que ela
queria dizer?”
Benditas sejam todas as mulheres!
Envoltas no seu mistério, continuam, intocáveis.
Antonio Carlos Augusto Gama
Promotor de Justiça, aposentado
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