segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

2022 foi o terceiro ano mais importante do século e deixa quatro desafios para 2023, Mathias Alencastro, FSP

 


Depois do ano de 2005, quando a lógica das relações entre Estados Unidos e China mudou definitivamente, e de 2016, o ano da eleição de Donald Trump e do referendo do brexit, 2022 entra para a história como o terceiro ano mais importante do século. Ele nos lega quatro desafios.

IMPEDIR A GRANDE DIVERGÊNCIA

Num debate tomado por paixão ideológica e interpretações históricas frágeis, duas verdades sobre a Guerra da Ucrânia parecem imutáveis. Por um lado, a "operação militar especial" russa, que deveria levar à queda de Kiev em três dias, fracassou em todos os seus objetivos. Por outro, os Estados Unidos viram na contraofensiva ucraniana uma forma de pressionar rivais geopolíticos.

O impasse no campo de batalha impediu a grande divergência entre Ocidente e Oriente que era dada como inevitável no começo da guerra. Os últimos grandes eventos do ano mostraram que Estados Unidos e China estão dispostos a negociar uma saída na guerra russo-ucraniana. O desafio é aumentar o custo do conflito para a Rússia e, ao mesmo tempo, baixar o custo da negociação, criando uma saída segura para os ucranianos, e uma solução política para o regime de Vladimir Putin.

RELANÇAR A POLÍTICA CLIMÁTICA

A eleição de Lula, e a derrota do primeiro governo abertamente ecocida da história, encerra um ciclo de turbulência na diplomacia climática iniciado pela saída dos Estados Unidos dos Acordos de Paris em 2017. Depois de anos de dificuldades, a União Europeia foi obrigada a fazer a transição energética na marra, pressionada pela guerra.

O choque da guerra está estimulando os países do Sul a acelerarem a sua entrada na era pós-carbono. Mas todo o cuidado é pouco. Mal implementadas, as políticas públicas verdes podem provocar revoltas sociais, como no caso dos Coletes Amarelos na França.

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva participa de reunião na COP27, no Egito, ao lado de indígenas como Sonia Guajajara, em 17 de novembro.
O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva participa de reunião na COP27, no Egito, ao lado de indígenas como Sonia Guajajara, em 17 de novembro. - Mohammed Salem/REUTERS

REGULAR AS BIG TECHS

A deriva circense de Elon Musk no Twitter, o fiasco anunciado do megainvestimento de Mark Zuckerberg na realidade virtual, e a detenção de Sam Bankman-Fried depois da falência bilionária da FTX, um dos maiores fundos de criptomoedas, abriu uma janela de oportunidade única para empresas e Estados voltarem à mesa de negociações.

Levado à beira do colapso por um presidente que radicalizou a política a partir das redes sociais, o Brasil tem a força e a legitimidade para fazer da regulação das novas tecnologias o ponto de partida da nova governança global.

PRESERVAR AS DEMOCRACIAS

Em 2022 as democracias dobraram, mas não quebraram. Os movimentos de extrema direita precisam aprender a viver sem os autocratas que surgiram depois da crise financeira de 2008 e do advento da comunicação digital de massa. Passado, pelo menos temporariamente, o risco de colapso das democracias, o desafio agora é desenhar novas formas de governabilidade.

Na União Europeia, a instabilidade dos Parlamentos nacionais está sendo compensada pelo fortalecimento das instituições de Bruxelas. Na América Latina, a queda do governante peruano Pedro Castillo é um lembrete que a integração regional depende da consolidação das democracias. O tempo corre. Daqui a um ano, a região se preparará para um novo mata-mata: o embate presidencial entre democratas e a direita trumpista nos Estados Unidos.

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