29 de dezembro de 2022. O fim do ano marca o fim de uma era para o futebol. Para muito mais que o futebol.
Eu tinha dez anos quando o Senna morreu. Foi a primeira – e uma das únicas vezes – que vi meu pai chorar e assim soube quão grave aquilo era.
Alguns meses mais tarde, morreria Tom Jobim, brasileiro desde o nome que houvera feito nossa música tocar em todos os lugares do mundo, eu soube desde cedo.
Que ano aquele 1994.
28 anos depois, o Brasil morre um pouco de novo para o resto do mundo.
Muito mais que um ídolo nacional e o rei do futebol, Pelé disputa o título de maior atleta de todos os tempos – e segue vencendo para a maioria dos opinadores, quarenta anos depois de parar de jogar.
A existência do Pelé torna real o Brasil. Em qualquer lugar do planeta, mesmo para aqueles que sabem pouco ou nada sobre nosso país, o Brasil existe, porque existe Pelé. Não sei se ainda somos o país do futebol depois das últimas copas, mas certamente seguimos sendo o país do Pelé.
"Só não conhece Pelé quem não nasceu ainda", alguém acaba de dizer na televisão, em uma homenagem ininterrupta há quase 24 horas.
Fãs de todos os continentes dão depoimentos sobre a perda, tão sentida.
Sempre que morre uma grande celebridade, discute-se a validade do luto de multidões que não a conheciam pessoalmente, mas se sentem profundamente abaladas. É uma relação unilateral, em que apenas uma das partes despende emoção e interesse, enquanto o ser amado não faz ideia de cada um que o ama.
Mas isso não faz com que seja uma relação inexistente. Saber que uma pessoa está viva e a acompanhar à distância pode ser suficiente para preencher o espaço que ela ocupa nas nossas vidas. Muitas vezes e para muita gente, um espaço considerável, dos mais importantes. Temos todo direito de sofrer pela sua morte.
A informação de que Pelé estava em cuidados paliativos exclusivos gerou grande comoção. Ainda assim, havia uma negação coletiva a respeito do seu estado de saúde. Não porque cuidados paliativos signifiquem a proximidade da morte, como já explicamos aqui. Mas porque Pelé estava na reta final de uma doença para a qual não havia perspectiva de cura ou sobrevida longa desde que foi anunciada.
Nos últimos dias, muito se falou sobre Pelé. Segundo a Agência Alma Preta, um dos feitos que mais orgulha os fãs aconteceu no continente africano, há 52 anos, quando o governo nigeriano providenciou o cessar-fogo de uma guerra civil que houvera começado dois anos antes – e que ainda duraria mais dois – para receber o Santos de Pelé.
Perguntei ao meu pai qual foi, para ele, o grande feito do brasileiro mais famoso do mundo. Aos 17 anos, um jovem negro, de pele retinta, tornava conhecido como nunca o Brasil- um dos países mais racistas do planeta. Mesmo sendo duramente criticado durante grande parte da sua vida por não se posicionar de forma mais firme na luta antirracista, Pelé será sempre exemplo de excelência e um dos símbolos mais importantes deste Brasil que, para muitos, nunca deixará de ser o país do futebol.
O adeus a Edson Arantes do Nascimento, eterno Pelé, está estampado nas capas dos jornais mais importantes do mundo. Para que não exista qualquer dúvida de até onde chegou, a Nasa publicou imagem de uma galáxia espiral na constelação Sculptor. Nela, as cores do Brasil.
Para que o universo inteiro possa ver.
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