terça-feira, 1 de novembro de 2022

Bolsonaro deve responder no TSE por abuso de poder em ações que podem levá-lo à inelegibilidade, FSP

 Fora do mandato, o presidente Jair Bolsonaro (PL) deve responder a investigações por uso da máquina pública na campanha e pela rede de fake news ligada a seus aliados. Algumas situações já estão sob análise e se cogita o envio de outras ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

PT, por exemplo, estuda apresentar uma nova ação por abuso de poder político pelas operações realizadas pela Polícia Rodoviária Federal neste domingo (30).

O presidente Jair Bolsonaro - Gabriela Biló/Folhapress

A cúpula da corporação descumpriu ordem do presidente do TSE, Alexandre de Moraes, de vetar as operações que envolvessem o transporte público de passageiros, como mostrou a Folha.

A campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) viu na ação da PRF uma tentativa de interferir nas urnas, especialmente no Nordeste, onde o petista tem vantagem de votos.

As ações não resultarão em cassação de mandato, que se encerra em 31 de dezembro, mas, se procedentes, levariam à perda dos direitos políticos de Bolsonaro, provocando sua inelegibilidade.

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Apurações do gênero são complexas e demoradas, chegando geralmente a desfechos anos depois de iniciadas, como mostra a jurisprudência do TSE. Como ele fora do cargo, porém, o ritmo pode ser outro. E a configuração do plenário da corte eleitoral é hoje desfavorável a Bolsonaro.

O ritmo das ações é ditado pelo corregedor e o presidente do TSE, postos hoje ocupados pelos ministros Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes. Benedito fica na corte até novembro de 2023 e Moraes, até junho de 2024.

O tribunal é composto ainda por Ricardo LewandowskiCármen Lúcia, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach, além dos ministros substitutos.

Nas últimas semanas, adversários acusaram Bolsonaro de ferir a legislação eleitoral em uma série de episódios. Quando o governo, por exemplo, autorizou o ingresso de novas 500 mil famílias no Auxílio Brasil, além da antecipação de parcelas do benefício. A avaliação de que o presidente desrespeitou limites legais é corroborada por especialistas ouvidos pela Folha.

A lista inclui a confecção de milhões de cartões do Auxílio Brasil com a bandeira do Brasil, símbolo muito usado na campanha do mandatário, e a liberação de parcela extra do auxílio de R$ 1.000 para caminhoneiros e taxistas.

Citam ainda o uso do aparato estatal para reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada, com transmissão pela TV Brasil, e o desvirtuamento de agendas oficiais, seja no 7 de Setembro ou na viagem à Inglaterra por ocasião da morte da Rainha Elizabeth II. Bolsonaro usou a sacada da embaixada brasileira em Londres para fazer discurso político.

Algumas condutas do presidente e atos do governo são objeto de ações judiciais que tramitam no TSE. A conversão da solenidade do 7 de Setembro na Esplanada dos Ministérios em comício eleitoral é uma delas.

Houve uma decisão liminar (urgente e provisória) da corte eleitoral que proibiu candidatos, incluindo Bolsonaro, de veicular "todo e qualquer material de propaganda eleitoral, em todos os meios, que utilizem imagens do presidente da República capturadas durante os eventos oficiais de comemoração do Bicentenário da Independência".

Questionou-se na ação o desvio de finalidade das comemorações da Independência, custeado com recursos públicos e transmitido ao vivo pela TV Brasil.

A coligação de Lula também apresentou uma ação para desarticular suposta rede de fake news pró-Bolsonaro. Nesse caso, em que se repete o pedido de cassação da chapa, o corregedor também abriu apuração, vetou o lançamento às vésperas do segundo turno de documentário sobre a facada que o chefe do Executivo sofreu em 2018 e desmonetizou provisoriamente canais bolsonaristas.

O tipo de ação disponível para questionar atos que desequilibraram a disputa eleitoral é a chamada Aije (Ação de Investigação Judicial Eleitoral). São avaliados atos de abuso de poder econômico, político, de autoridade, além do uso indevido de meios de comunicação.

Em casos mais graves, a Aije tem o poder de cassar o registro da chapa ou o diploma dos eleitos e também de tornar os alvos inelegíveis por oito anos.

A Aije pode ser protocolada por partidos políticos, coligações, federações partidárias, candidatas e candidatos e pelo Ministério Público Eleitoral, comandado atualmente por Augusto Aras.

A Procuradoria-Geral Eleitoral se omitiu sobre o uso da desinformação e a exploração da máquina pública durante a campanha.

Sem discutir casos concretos, o procurador regional da República Ubiratan Cazetta afirma que as investigações eleitorais são "sofisticadas" e "demoradas".

"A ação precisa responder a quesito fundamental: o tamanho do ilícito. Mensurar o impacto do abuso no eleitorado. Não é tarefa fácil", diz Cazetta, que preside a Associação Nacional de Procuradores da República e atuou como procurador-regional eleitoral no Pará por duas ocasiões (2004-2006 e 2008-2010).

Em 2017, o TSE absolveu a chapa formada por Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) por 4 votos a 3, em ação apresentada em 2014 pelo PSDB. O tucano Aécio Neves perdeu a disputa.

Em outra Aije, o tribunal também levou cerca de três anos para votar e rejeitar a cassação de Bolsonaro e Hamilton Mourão (Republicanos) por participação em esquema de disparo em massa de fake news nas eleições de 2018.

Na avaliação do advogado Luiz Fernando Pereira, coordenador-geral da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), Bolsonaro incorreu "em condutas graves de abuso de poder político " que desequilibraram o pleito.

"Existe a possibilidade de o presidente ficar inelegível por oito anos", afirma Pereira, para quem o ritmo de tramitação das investigações no TSE pode ser mais ágil com Bolsonaro fora do cargo.

Sem condenação de presidentes da República no histórico do tribunal, diz o especialista, casos de cassação de governadores servem de parâmetro. O TSE levou sete governadores à perda do mandato desde a redemocratização por acusações de abuso do poder político e/ou econômico.

O primeiro caso ocorreu no Piauí em 2001, quando Mão Santa (MDB), então chefe do Executivo estadual, foi condenado pela corte eleitoral por compra de voto (distribuição de medicamentos e anistia de contas de água, entre outras irregularidades).

Para Pereira, o volume de benefícios distribuídos por Bolsonaro é, proporcionalmente, "muito maior do que aquele que, nos estados, levou à cassação de governadores".

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