Douglas Nascimento
São Paulo se transforma de maneira tão veloz que muitos fatos curiosos de sua história simplesmente desaparecem sem deixar vestígios. Ou, nesse caso, quase.
No Parque do Ibirapuera seus frequentadores, especialmente aqueles que desfrutam da pista de cooper, com certeza já notaram uma enorme cruz de pedra localizada ao lado do charmoso restaurante Selvagem. É praticamente impossível não nota-la de tão grande.
O que quase ninguém imagina é que a cruz não tem nada a ver com um local para preces, mas sim com um antigo cemitério de animais que era localizado exatamente ali.
A ORIGEM
Corria o ano de 1929 quando alguns paulistanos se juntaram com a União Internacional Protetora dos Animais – UIPA (esta a mais antiga sociedade civil brasileira, fundada em 1895) para construir no final da Rua França Pinto, trecho que atualmente é a Avenida IV Centenário, o primeiro hospital veterinário e cemitério de animais de São Paulo. O local passou a ser sede da UIPA, com hospital, asilo (como se chamava a área de animais para doação) e o cemitério.
Em uma época que o Parque do Ibirapuera ainda estava longe de virar realidade, essa região ainda não era tão valorizada como atualmente e existiam muitos terrenos disponíveis. A área total do complexo dedicado aos animais totalizava 13.200 metros quadrados.
Quem viesse até a UIPA tinha a seu dispor toda a assistência veterinária disponível para o tratamento de seus animais de estimação, fossem eles cães, gatos ou mesmo animais de grande porte, como cavalos, em uma época que os veículos com tração animal ainda eram usados na capital paulista.
Já o cemitério foi adotado por muitas famílias que apreciavam dar uma morada final digna para seus animais de estimação, sendo que rapidamente o cemitério foi tendo seus espaços preenchidos. Os túmulos eram tão variados quanto os encontrados em cemitérios humanos, sendo que alguns eram tão grandiosos que pareciam sepulturas de pessoas.
O FIM
A história do local começaria a mudar após a inauguração do Parque do Ibirapuera, ocorrida em 21 de agosto de 1954. A partir deste momento a UIPA começou a sofrer pressão para que procurasse outro lugar para operar. O bairro estava começando a se valorizar e a elite que se formava ao redor do parque não via com bons olhos – veja só – um local que atendia animais de pessoas carentes. E também onde já se viu, manter um cemitério junto de um parque? Apesar de por aqui alguns torcerem o nariz, parques compartilhados com cemitérios são realidades em outras cidades do mundo, como Boston (EUA).
A UIPA permaneceria no Ibirapuera até 1972 quando o então Prefeito, Figueiredo Ferraz, determinou a desapropriação da área e a saída da UIPA e do cemitério de animais. Ferraz cedeu outra local para a entidade na Marginal Tietê, onde ela está até hoje, contudo não teve consideração com os animais sepultados ali cujos túmulos foram todos eles destruídos, a exceção de dois que até hoje repousam ali servindo, apesar de um tanto escondidos, de recordação do extinto cemitério.
PINGUIM, O FIEL AMIGO
Se o túmulo do pastor alemão chama atenção pelo grande tamanho, o de Pinguim é exatamente o oposto. Localizado a poucos passos de distância do primeiro, o mausoléu de Pinguim é um pequeno obelisco onde estão gravadas as inscrições com data de nascimento e morte do animal, além de um breve epitáfio feito por suas donas, Nina e Nice.
Apesar de estarem preservados falta um pouco de cuidado por parte da Urbia Parques, que administra o Ibirapuera, em dar a devida sinalização aos dois túmulos que agora são monumentos. Não há qualquer identificação em nenhum deles e no caso do pequeno obelisco de Pinguim todo o paisagismo foi feito deixando-o de costas para as pessoas (veja na galeria abaixo) que ao verem o objeto pensam que é apenas uma pedra. Isso pode e deve ser revisto.
Quando estiver passeando no Ibirapuera e passar nesta parte do parque, não deixe de dedicar um momento a Pinguim, ao pastor alemão e aos demais animais que um dia ali descansaram.
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