sábado, 29 de setembro de 2018

É grande o risco de recessão já em 2019? NÃO, MARCELLE CHAUVET

A economista Marcelle Chauvet, durante entrevista à Folha em Brasília - Pedro Ladeira - 14.ago.17/Folhapress
Após sofrer uma das mais profundas recessões econômicas da história, o Brasil passa por uma recuperação lenta e delicada. No passado, recessões profundas também foram seguidas de recuperações lentas, mas estas demoraram em torno de sete trimestres para se transformarem em uma plena expansão. 

Neste terceiro trimestre de 2018 completam-se 7 trimestres desde o fim da recessão, mas ainda não estamos perto de alavancarmos para uma expansão acelerada.

Fins de períodos recessivos são marcados por grande incerteza econômica. O público pode interpretar um crescimento gradual como ameaça de volta à recessão. O crescimento lento leva à incerteza, e a incerteza leva ao crescimento lento. Há centenas de variáveis a serem estudadas, expectativas, opiniões.

Há os fatores externos. Como avaliar tudo isso e chegar a uma previsão objetiva? Modelos estatísticos de probabilidade de recessão produzem avaliações que não estão impregnadas por percepções pessimistas ou otimistas e dão sinais mais precisos em tempo real.

A informação sobre o estado da economia possibilita reavaliação de projeções de vendas e lucros por empresas e planejamento dos consumidores, os quais obtêm respostas para perguntas-chave: a economia está enfraquecendo ou fortalecendo? O que o modelo diz agora, com dados disponíveis até setembro de 2018? 

A probabilidade de recessão no momento é de apenas 4%. Mas o Brasil corre risco alto de recessão em 2019? A pergunta deve ser respondida mediante análise de cenários. Estamos diante de dois focos grandes de incerteza: eleitoral e situação externa.

Cenário 1: se o presidente eleito imediatamente acalmar o mercado, investidores e consumidores, dando garantias de que o ambiente será propício aos negócios e que se comprometerá com reformas que reduzam a dívida pública sem sufocar o frágil crescimento econômico, o risco de uma recessão em 2019 é baixo.

O cenário externo pode também se reverter. Nas últimas semanas houve um grande fluxo de capitais para o Brasil. A alta do dólar torna os ativos dos emergentes uma barganha.

Se o arrefecimento do crescimento da economia mundial diante da guerra comercial liderada pelos EUA afetar o seu crescimento econômico, o banco central americano pode estabilizar a taxa de juros, o que seria favorável para atrair capital externo para o Brasil.

Cenário 2: se o novo governo for de um extremo ou de outro e não tiver a credibilidade necessária para acalmar o mercado interno e externo, tudo pode acontecer, inclusive uma nova recessão. 
No passado recente, a incerteza com relação às políticas econômicas de um presidente recém-eleito causou uma recessão. Produtores e consumidores podem frear ainda mais os planos de gastos --o que, associado a um já alto nível de ociosidade e a uma frustração quanto às reformas públicas necessárias, pode fragilizar a economia.

O cenário externo pode também piorar. A intensificação da guerra comercial poderia gerar inflação alta nos EUA, o que levaria a aumento dos juros locais, crescimento mundial lento, queda do preço de commodities e aumento do risco de economias emergentes como o Brasil.
Marcelle Chauvet
Professora titular da Universidade da Califórnia, mestre em economia pela Universidade de Brasília e Ph.D. pela Universidade da Pensilvânia; membro do Codace-FGV (Comitê de Datação de Ciclos Econômicos)

    É grande o risco de recessão já em 2019? SIM Sergio Vale

    Recessões são eventos econômicos relativamente comuns. O Brasil passou 35% dos trimestres desde 1981 em recessão. Pode parecer algo elevado, mas os EUA passaram por recessão em 34% do tempo também desde 1981. A diferença é a quantidade de recessões. Enquanto os EUA tiveram quatro delas, nós tivemos nove. Ou seja, em média tivemos uma recessão a cada quatro anos no Brasil. Não saberia dizer se é recorde, mas certamente é uma referência preocupante.
    Essas recessões foram geradas por um conjunto de eventos domésticos e externos, sendo a maioria das causas, como era de se esperar, domésticas. As origens domésticas são variadas, mas nos remetem a algum grau elevado de má condução da política econômica. O caso mais recente veio do governo Dilma, cuja conjunção de inabilidade política com esgarçamento das políticas fiscal e monetária levou a maior recessão de nossa história.
    Estamos saindo da última crise e novamente nos deparamos com a questão se há possibilidade de nova recessão no próximo mandato presidencial. Infelizmente, a resposta parece ser sim.
    A eleição parece que ficará nas mãos de dois candidatos com visões extremistas. De um lado, difícil acreditar que Haddad vá conseguir domar sua tropa de keynesianos ávidos para desmontar o novo regime fiscal que foi iniciado em 2016.

    A simples não realização das reformas necessárias, especialmente a da previdência, terá o papel de mostrar aos investidores que o governo não quer fazer o ajuste fiscal mesmo tendo uma dívida próxima de 80% do PIB e crescente. Não será fácil manter e aperfeiçoar o regime fiscal criado se não houver crença dentro do próprio partido do presidente que isso é necessário.

    Aqui não me parece ser suficiente trazer um grande nome de mercado, pois o problema não é apenas econômico, mas político, como vimos no dueto Dilma-Levy que naufragou. A não aprovação das reformas necessárias afugentaria o mercado, causando depreciação cambial mais intensa, com a sequência inflação-juros altos-recessão que já conhecemos tão bem. Uma recessão num governo Haddad poderia vir mais rapidamente.
    Do outro lado, o ultraliberalismo de Paulo Guedes parece não casar com seu chefe. Pelas idas e vindas da equipe econômica de Bolsonaro, poderemos perder tempo enquanto se tenta a enésima versão de uma reforma da previdência que, aqui também, terá dificuldade de passar pela parca composição política do possível presidente.

    Seu temperamento certamente provocará dificuldades com o Congresso permanentemente. Sem falar nos riscos de autoritarismo que podem surgir de um governo Bolsonaro. Por exemplo, no ano do autogolpe de Fujimori no Peru em 1992 o PIB caiu 0,5%. Pode parecer absurdo falar em autogolpe, mas basta lembrar que isso foi sugestão do candidato a vice-presidente, general Mourão. Uma recessão num governo Bolsonaro poderia vir mais tarde, após as tentativas frustradas de reforma.
    Nos dois casos, a falta de um controle nos gastos da previdência pode forçar a um ajuste mais severo na arrecadação. Mas diversos estudos têm mostrado que ajustes fiscais baseados em aumentos de impostos em uma economia ainda enfraquecida só aprofundam a recessão.
    Mais preocupante ainda, não parece haver vontade de nenhum dos dois lados de baixar as armas. O clima de destempero que estamos vivendo atualmente e que pode voltar às ruas tem grande probabilidade de continuar com qualquer um que vença. 2019 e os anos seguintes poderão ver novas manifestações populares, talvez em um grau mais elevado do que se viu até 2016. Durma com uma crise dessas.
    Sergio Vale
    Mestre em economia pela Universidade de Wisconsin (EUA) e economista-chefe da MB Associados

    Dever cívico, Juliana Sofia, FSP

    Por que a ex-mulher de Bolsonaro nega fatos por ela relatados?

    Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), durante ato para o candidato, em Resende (RJ)
    Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), durante ato para o candidato, em Resende (RJ) - Eduardo Anizelli/Folhapress
    Não é necessário ser militante do movimento #MeToo ou apoiadora do #EleNão para querer elucidar a atitude de negação de Ana Cristina Valle, ex-mulher do candidato Jair Bolsonaro (PSL), às revelações de que ela relatou ao Itamaraty ter sido ameaçada de morte pelo deputado, fato que a fez deixar o país.
    Um telegrama assinado pelo então embaixador brasileiro em Oslo e arquivado no ministério —órgão com extremado senso de respeito a protocolos oficiais— é objetivo: “A senhora Ana Cristina Siqueira Valle disse ter deixado o Brasil há dois anos [em 2009] ‘por ter sido ameaçada de morte’ pelo pai do menor [Bolsonaro]. Aduziu ela que tal acusação poderia motivar pedido de asilo político neste país [Noruega].”
    Bolsonaro e Ana viviam à época uma separação litigiosa, em que a guarda do filho do casal era disputada. As alusões ao comportamento agressivo do parlamentar foram testemunhadas. Sabe-se agora mais. A querela judicial derivou para outras acusações contra o candidato por ocultação de patrimônio e por furto.
    Uma Ana Cristina exasperada reage, nega, esquiva-se. “Pai do meu filho, meu ex-marido. Ele é muito querido, por mim e por todos. Ele não tem essa índole.” Por ora, o que aparece como motivação para a ex-mulher do presidenciável refutar o passado é um acordo com interesses financeiros e conveniência eleitoral —ela tenta uma vaga na Câmara dos Deputados pelo Podemos e usa o sobrenome Bolsonaro.
    O debate político nos EUA vem sendo dominado nas últimas semanas pela conturbada nomeação de um juiz à Suprema Corte. BrettKavanaugh, escolhido pelo presidente Donald Trump, foi acusado por ao menos três mulheres de agressões sexuais, o que impôs à indicação risco de ser gongada pelo Senado.
    À Comissão Judiciária da Casa, a professora Christine Ford narrou o terror vivido há mais de 30 anos. “Estou aqui porque acredito ser meu dever cívico contar o que aconteceu comigo quando Brett Kavanaugh e eu estávamos no ensino médio.”