quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

Poderia ter sido muito pior, Hélio Schwartsman, FSP

 Sou um abolicionista penal. Por mim, só manteríamos atrás das grades criminosos irremediavelmente violentos, incapazes de viver em sociedade. Para os demais, teríamos de encontrar penas diferentes do encarceramento.

Minha posição pode parecer utópica, mas é só o prolongamento de uma tendência já em curso há uns três séculos. Na Inglaterra de Shakespeare, a sanção usualmente aplicada a condenados por traição era enforcamento, afogamento e esquartejamento —e, idealmente, o réu deveria chegar ainda respirando à última parte do castigo. Hoje, à exceção dos EUA, todos os países desenvolvidos pararam de utilizar a pena de morte, e os índices de criminalidade são uma fração do que eram no passado.

Senador sentado em cadeira azul escura durante sessão parlamentar, vestindo terno preto, camisa branca e gravata verde. Ele aponta com o braço direito estendido para frente, com expressão séria. Pessoas ao fundo estão parcialmente visíveis.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, durante sessão de votação do PL da Dosimetria - Pedro Ladeira/Folhapress

Mas deixemos de lado o mundo como eu gostaria que fosse e discutamos o mundo como ele é. O PL da Dosimetria recém-aprovado pelo Legislativo é um avanço ou um retrocesso? Eu diria que, pelo timing, a mensagem transmitida pelo PL é ruim. Ela sugere que o STF errou ao condenar os golpistas dentro dos parâmetros legais fixados pelo próprio Legislativo há menos de cinco anos. Não creio que tenha errado. A intervenção dos parlamentares deixa a sensação de que o sistema se dobra aos interesses de políticos poderosos, o que não deveria ocorrer numa República séria.

Mas os 27 anos de cadeia para Bolsonaro não eram um exagero? Se exercícios comparativos servem para algo, vale destacar que Alemanha, Canadá, França e Reino Unido preveem até prisão perpétua para autores de golpes frustrados. As sanções da legislação pátria não parecem configurar caso de punitivismo exacerbado.

Reconhecendo que o Brasil não é mesmo uma República séria, podemos respirar aliviados. Em primeiro lugar, foi descartada a anistia ampla pretendida pelos bolsonaristas. Não menos importantes, as reduções de pena não são automáticas. Os presidiários terão de entrar com ações de revisão criminal, e o STF terá algum espaço de manobra para recalcular as penas segundo os novos parâmetros. Em suma, poderia ter sido muito pior.

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