A história do capitalismo moderno é a das consultorias que ajudaram a moldá-lo. Considere "Tempos Modernos" (1936). O que Chaplin mira é a gestão científica de Frederick Taylor, que saltou do papel para as fábricas por meio das primeiras firmas consultivas, como a de Arthur D. Little, pioneiro na disciplina de tratar funcionários como peças de máquina.
A posição de força dos Estados Unidos no pós-guerra levou à explosão dos conglomerados, que se espalharam pelo Ocidente. O fator estruturante foi a ideia de estratégia empresarial separada da operação, que consultorias como McKinsey e BCG ensinaram às corporações.
O sucesso foi tão grande que começaram a faltar executivos experientes para contratar. A solução veio da McKinsey, que passou a recrutar jovens de universidades de elite e a moldá-los internamente. Foi esse movimento que deu forma à indústria das escolas de negócios e MBAs que hoje abastece o LinkedIn e os cofres acadêmicos.
Também foram as consultorias que inventaram que big data é importante, transformaram governança corporativa em dogma e converteram DEI em agenda. E ainda inovaram na engenharia da má-fé.
Os tipos ordinários incluem a recomendação de produtos desnecessários para gerar comissão e o uso de ex-autoridades para forjar relações privilegiadas com o Estado. Já os mais sofisticados vão na linha dos conluios para maquiar balanços bilionários e da atuação da McKinsey junto à Purdue Pharma para a promoção do opiáceo OxyContin, enquanto aconselhava o governo americano no combate à epidemia com a qual contribuía.
O foco atual é a implantação de projetos de IA, o que tem produzido altas taxas de insucesso em função das soluções genéricas e orientações superficiais. Mas há um ponto mais profundo: as próprias consultorias estão sendo subvertidas por essa tecnologia, porque os princípios capitalistas sobre os quais se estruturaram estão ficando para trás.
O capitalismo das consultorias é o da intermediação da inteligência por meio de diagnósticos e recomendações. Ele separa análise e ação, transformando compreensão em autoridade. Em contraste, a IA reavalia continuamente os planos de ação enquanto eles se desenvolvem e oferece capacidades analíticas ao toque de um botão, o que favorece a migração do regime do planejamento para o dos ajustes contínuos sob incerteza.
O resultado é um novo capitalismo de dispositivo, em que o poder é deslocado do argumento para o mecanismo. Isso coloca em jogo a própria ideia de compreender para controlar, que estrutura o saber moderno desde Weber e que legitima as consultorias, conselhos gestores e outras instâncias orientativas voltadas à produtividade.
Saber é descrever corretamente ou, dito de outro modo, comprimir a complexidade do real em representações mentais estáveis. A IA funciona de maneira oposta: quanto maior a sua eficiência cognitiva e prática, maior a opacidade de seus processos internos.
Vai chegar um momento em que a sensação será como se estivéssemos lidando com uma outra espécie, que gera suas principais contribuições tateando o mundo em busca do melhor acoplamento. Esse deslocamento deve rebaixar os rituais de orientação e validação típicos do capitalismo de conselho, tornando o sistema econômico mais pragmático do que jamais se ousou pensar.

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