sexta-feira, 17 de outubro de 2025

É preocupante o esvaziamento da B3, Adriana Fernandes, FSP

 

Brasília

Listada na Bolsa de Valores, a Reag Capital saiu da B3 nesta semana em meio aos desdobramentos da megaoperação Carbono Oculto, que investiga o envolvimento do PCC na economia formal.

O caso revelou fragilidades nos instrumentos de governança da B3, a maior bolsa de mercado de capitais da América Latina. Mas não é só isso. É preocupante o seu esvaziamento: deverá haver um número recorde de fechamentos de capital em 2025 e já são quatro anos sem nenhuma oferta inicial de ações, as chamadas IPOs, como mostrou reportagem do jornal Valor Econômico.

A imagem mostra o interior de um ambiente financeiro moderno, com iluminação azul. No fundo, há uma grande tela exibindo gráficos e dados financeiros. O espaço é amplo, com paredes e piso em tons neutros, e há algumas poltronas brancas dispostas no ambiente.
Sede da Bolsa de Valores brasileira, em São Paulo - Divulgação/B3

Os problemas atuais deveriam servir de referência para melhorar as normas e também ampliar a discussão sobre o quanto a Bolsa, que vem apresentando resultados expressivos para os acionistas, tem contribuído para criar alternativas de acesso ao mercado de capitais e fomentar a entrada de novos participantes.

Uma empresa com margem de lucro tão elevada, que distribui dividendos para acionistas (a maioria estrangeiros), tem investido no fomento e desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro? Quais propostas regulatórias que ela levou à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) nos últimos anos que poderiam ter fomentado um mercado mais acessível?

Não parece ser o caso. Fora o período da pandemia de Covid-19, quando o excesso de liquidez e juros em recordes de baixa criou oportunidades para crescimento do mercado e tantos brasileiros passaram a investir em Bolsa, o mercado de ações continua sendo pouco profundo.

A B3 parece ter se acomodado com resultados de monopólio. A CVM lançou recentemente uma simplificação de acesso. A B3, com seu poder financeiro, poderia ter liderado esse processo anos atrás. A combinação monopólio com lucros elevados pode ter provocado uma acomodação. Só agora estamos vendo novos entrantes ganhando espaço. A ATG, no Rio, e A5X, em São Paulo.

A implementação do mercado de carbono no país vai exigir o protagonismo de uma Bolsa. Uma economia grande, como a brasileira, precisa de um mercado de capitais forte para crescer.

Novo darwinismo social, Oscar Vilhena Vieira, FSP

 As primeiras formas de regulação do trabalho surgiram na Inglaterra, ainda no período medieval. O Estatuto dos Artífices, de 1563, fruto de um acordo judicial, impôs ao Estado "incentivar a lavoura e garantir aos empregados salários proporcionalmente convenientes, tanto em tempo de escassez como de fartura".

Essa expressão da "economia moral" do mundo feudal, nas palavras do historiador E. P. Thompson, ruiu em face do vertiginoso processo de urbanização e industrialização, na passagem do século 17 para o 19. A mão de obra, onde não havia escravidão, passou a ser objeto das leis de mercado. Sob o manto da autonomia individual, cada um poderia, teoricamente, negociar o valor do seu trabalho.

Entregador usa ciclovia na avenida Paulista - Eduardo Knapp - 3.dez.22/Folhapress

A primazia da autonomia da vontade foi coroada no caso Lochner v Nova York (1905), em que a Suprema Corte norte-americana declarou inconstitucional legislação que estabelecia o máximo de dez horas para a jornada de trabalho, sob o pretexto de que a Constituição não permitia ao Estado interferir na liberdade de contratação entre trabalhadores e empregadores.

As múltiplas crises, guerras e revoluções decorrentes do "darwinismo social" da Era Lochner foram determinantes para o surgimento dos direitos dos trabalhadores e do próprio estado de bem-estar. No Brasil, esse contramovimento, no dizer de Karl Polany, começou com a CLT e só se completou com a Constituição de 1988, que reafirmou os direitos dos trabalhadores e universalizou direitos sociais à Previdência e à assistência, além dos direitos à saúde e à educação.

Esse edifício civilizatório, ainda bastante incompleto, encontra-se agora sob a ameaça de um novo darwinismo social. Sob o manto da autonomia individual, da livre iniciativa e do empreendedorismo, diversos ministros do Supremo Tribunal Federal parecem dispostos a tornar facultativo o regime dos direitos do trabalhador.

Como ficou demonstrado em audiência pública promovida pelo STF sobre a "pejotização" e nas argumentações orais referentes ao processo de "uberização" do trabalho, duas são as consequências diretas desses movimentos. A primeira, evidentemente, é afastar a incidência de direitos humanos básicos das relações de trabalho. Se o contrato é com uma pessoa jurídica, ainda que encobrindo uma verdadeira relação de trabalho, não há como se falar em discriminação racial ou de gênero, jornada extenuante, ambiente insalubre, férias, licença maternidade, sindicalização ou direito de greve.

De outro lado, há substantiva perda de arrecadação. De 2022 a 2025, dos 5,5 milhões de empregados CLT desligados, 4,4 milhões se tornaram MEI. Isso significou uma perda de R$ 70 bilhões para a Previdência Social; R$ 27 bilhões para o FGTS; e R$ 8 bilhões para o Sistema S (MTE, 2025). Isso sem falar nas perdas de imposto de renda, sobretudo em relação aos contribuintes mais ricos. Se metade dos 35 milhões de empregados CLT brasileiros migrar para MEI ou Simples, as perdas estimadas serão de R$ 384 bilhões por ano (Marconi, Brancher, FGV, 2023), inviabilizando a Previdência e as demais políticas sociais promovidas pela Constituição.

Evidente que as regras trabalhistas precisam de constante atualização. Só não podemos aceitar que a "economia moral" do futuro seja mais perversa que a medieval.

Efeito Jorge Messias trinca a relação entre bolsonarismo e evangélicos, Juliano Spyer, FSP

 A notícia da sexta-feira (17) foi que Lula recebeu e orou com um bispo evangélico no Planalto. Mas a manchete certa seria outra: a direita evangélica está oficialmente fraturada.

Para quem está distante desse meio, Samuel Ferreira é apenas "um bispo" —assim como Caetano Veloso é "um compositor" ou o papa Leão 14 é "um católico". A descrição é correta, mas insuficiente para explicar quem ele representa entre os 47 milhões de evangélicos brasileiros.

Ferreira é uma das principais lideranças da Assembleia de Deus, a maior igreja do país depois da Católica. Segundo o Censo de 2010, ela tinha 12 milhões de membros. É a principal organização pentecostal do Brasil e a de maior apelo popular.

Sete pessoas vestindo roupas formais estão em círculo com os braços nos ombros uns dos outros, em ambiente interno iluminado por luz natural. Eles parecem concentrados e unidos, com cabeças inclinadas para baixo, sugerindo um momento de reflexão ou apoio mútuo.
Presidente Lula ora com o bispo Samuel Ferreira (à esq.) e o advogado-geral da União, Jorge Messias, candidato a uma vaga no STF - Ricardo Stuckert - 16.out.25/PR/Divulgação

A estratégia mais eficiente do bolsonarismo para se manter no poder foi costurar alianças com líderes das grandes igrejas. Até recentemente, ninguém —nem mesmo Edir Macedo, que representa o centrão pragmático do mundo evangélico— ousava se aproximar do PT ou de Lula, sob risco de isolamento e punição.

Dentro das grandes denominações, quem rejeitava candidatos de direita ou questionava a instrumentalização política das igrejas era rotulado de "abortista" ou "gayzista".

Essa lógica corporativa trincou com a visita de Samuel Ferreira, acompanhado de Jorge Messias, ao Palácio do Planalto. Igrejas históricas, especialmente a Presbiteriana, e as chamadas de "parede preta", como a Lagoinha, continuarão sendo redutos do antipetismo. Mas o jogo voltou a ficar aberto, com igrejas retomando a disposição para ficar junto do poder, independentemente do lado.

O gesto do bispo causou desconforto dentro da organização que ele preside, a Assembleia de Deus ministério Madureira. Por isso, o deputado Otoni de Paula (MDB-RJ), da mesma denominação, foi às redes aplaudir o encontro com o presidente.

"A política trabalha com a polarização, a igreja trabalha com a reconciliação", disse. E defendeu que encontrar com o presidente não significa concordar com o que ele pensa.

Em seguida ao encontro com Ferreira, Lula discursou no 16º Congresso do PC do B. "2026 é um ano sagrado. Nós temos que fazer as coisas diferente. [...] Evangélico não é contra nós, nós é que não sabemos falar com eles. O erro está na gente, não está neles. [...] Nós nos distanciamos do povo", disse o presidente.

Lula, prestes a completar 80 anos, caminha para uma nova disputa eleitoral. Será uma corrida dura: seu governo não tem maioria no Congresso, acumula derrotas e entregou pouco até agora —além de enfrentar a ameaça das tarifas de Trump.

A polarização prejudica o debate público, a esquerda ainda não domina o uso das redes sociais e metade dos eleitores, segundo dados da Quaest, desaprova o governo.

Para a imprensa pouco atenta ao campo evangélico, Samuel Ferreira é apenas mais um bispo. Mas as fotos dele orando e abraçando Lula circularam amplamente entre fiéis, apresentando o presidente como um homem de fé e amigo dos evangélicos.

A desbolsonarização das igrejas aumenta o risco de Tarcísio buscar a reeleição mais segura em São Paulo e disputar 2030 sem Lula no páreo. O governo deve convidar mais pastores para o Planalto.

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