quinta-feira, 25 de dezembro de 2025

Endividado, Jockey Club agora sofre com as bets, FSP

 Vicente Vilardaga

São Paulo

O Jockey Club era uma referência da elite paulistana. Hoje é um lugar esvaziado, cheio de dívidas de impostos municipais e alvo de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) aberta para investigar irregularidades fiscais e imobiliárias nas suas atividades.

O Jockey foi fundado em 1875 com o nome de Clube de Corridas Paulistano, cuja sede era o Hipódromo da Mooca. Em 1941 mudou-se para a Cidade Jardim. Seu dois prédios principais, tombados pelo Conpresp e pelo Condephaat, compõem um impressionante conjunto art déco e foram projetados pelo arquiteto Elisário Bahiana. Em 1950, passaram por uma remodelação com projeto do francês Henri Sajous.

Cinco cavalos com jóqueis coloridos competem em pista de grama. Cavalo da direita lidera com jóquei de capacete amarelo e camisa preta e branca.
Corridas na pista de grama de 3.000 metros no Jockey Club acontecem apenas aos sábados - Eduardo Knapp/Eduardo Knapp/Folhapress

O turfe se apresentava como umas das únicas formas legais e acessíveis de aposta, mas agora concorre com as bets e perdeu o público jovem. O movimento de pessoas e cavalos no Jockey diminuiu muito nos últimos 20 anos. Atualmente, há, por semana, uma única reunião ou programa (série de páreos) aos sábados.

Décadas atrás, o Jockey fazia três programas por semana e já chegou a ter cinco até os anos 1990. Nessa época, a Vila Hípica da Cidade Jardim alojava 1.500 cavalos. Quem quisesse deixar um animal no local precisava entrar numa fila de espera. Hoje são 300, segundo o jornalista Cyro Fiuza, que acaba de lançar o livro "Jockey Club de São Paulo: uma História no Tempo".

"A decadência está relacionada à falta de marketing e de atrativos 'extraturfe'. Entre um páreo e outro leva meia hora e é um momento para se realizar algum evento", diz Fiuza. "Antes havia atividades e personalidades e artistas eram levados para as corridas."

Público das corridas de cavalos cai ano a ano e hoje representa 10% do que já foi no passado - Eduardo Knapp/Folhapress

A frequência no hipódromo caiu. Cada programa de sábado ou domingo chegava a reunir cinco mil pessoas. No Grande Prêmio São Paulo, realizado em maio, compareciam de 15 mil a 20 mil pessoas. Atualmente, cerca de 500 espectadores e apostadores assistem à corrida semanal, muitos atraídos pelos dois restaurantes e um bar que há no local.

Além disso, um Grande Prêmio chegava a movimentar num páreo principal R$ 2,5 milhões. Uma reunião normal movimentava R$ 1 milhão. Hoje, as corridas de sábado rendem R$ 300 mil. Outro termômetro do momento é a perda de sócios do clube. Segundo Fiuza, ele tem 300 sócios pagantes. Esse número já foi de 2.000. A mensalidade atual é de R$ 540.

Há anos, o hipódromo paulistano também tem sido alvo de ações de cobrança de cerca de R$ 800 milhões em impostos municipais, IPTU e ISS. A prefeitura tem planos de desapropriar parte do imóvel para instalar um parque público e abater a dívida. O Jockey resiste e, em setembro, entrou com um pedido de recuperação judicial, aceito em primeira instância, para reestruturar suas pendências e evitar a falência, mas algumas semanas depois o Tribunal de Justiça suspendeu a decisão.

Edifício histórico do Museu do Ipiranga com fachada branca e colunas, rodeado por árvores e jardins. Em frente, estrutura moderna de vidro conecta o museu à calçada. Ao fundo, área verde e pista de corrida.
Prédio principal do Jockey Club em estilo art déco projetado por Elisário Bahiana e Henri Sajous - Mathilde Missioneiro/Folhapress

O Jockey informou que reconhece a dívida tributária, mas não o valor. Segundo o clube, o total devido gira em torno de R$ 300 milhões, mais ou menos o que a prefeitura precisa pagar para ressarci-lo por causa da desapropriação, em 2014, da Chácara do Ferreira, sua antiga propriedade na avenida Francisco Morato que virou um parque.

Já a CPI foi aberta em novembro, depois de denúncias de desvio de recursos obtidos com a Lei Rouanet e com a venda de TDCs (Transferência do Direito de Construir), R$ 25,7 milhões e R$ 62 milhões respectivamente. Com os TDCs, bens tombados ganham créditos em metros quadrados que podem ser vendidos para construtoras erguerem prédios em outros lugares. O dinheiro obtido nos dois casos teria como destino a preservação do patrimônio histórico.

O clube nega e diz que a verba do TDC é indenizatória e pode ser usada de várias maneiras. Segundo um porta-voz, apenas uma fatia de R$ 11 milhões estaria comprometida com gastos em preservação. Quanto ao dinheiro da Lei Rouanet, o Jockey afirma que está sendo integralmente aplicado em restauro, com exceção de 15% destinados para gastos administrativos. Seja como for, o hipódromo paulista é uma sombra do passado.

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