segunda-feira, 19 de maio de 2025

França ocultou escândalo de água da Nestlé, diz relatório parlamentar, FSP

 O governo francês encobriu, "no mais alto nível", um escândalo sobre o tratamento da água mineral por parte da gigante de alimentos Nestlé, incluindo a icônica marca Perrier, lançada em 1898, conforme apontou uma investigação do Senado divulgada nesta segunda-feira (19).

Nos últimos anos, o conglomerado suíço esteve sob pressão em relação à Perrier e outras marcas, visto que as regras da União Europeia limitam estritamente os tratamentos permitidos em produtos comercializados como água mineral natural.

"Além da falta de transparência da Nestlé Waters, é importante destacar a falta de transparência do Estado, tanto em relação às autoridades locais e europeias, quanto em relação ao povo francês", afirma o relatório do Senado.

A imagem mostra várias garrafas verdes de água mineral dispostas em um fundo de madeira. No centro, há uma lata de água mineral com a marca Perrier, cercada por latas brancas. As garrafas estão em pé, enquanto as latas estão dispostas em um padrão circular ao redor da lata central.
Latas e garrafas de água da marca francesa Perrier, criada em 1898. - LOIC VENANCE/AFP

O documento, resultado de uma investigação de seis meses feita pela Câmara Alta, aponta para uma "estratégia deliberada" de ocultação abordada durante uma "primeira reunião interministerial", em 14 de outubro de 2021.

A Nestlé adquiriu a Perrier no início da década de 1990. Mas sua nova administração alegou, no final de 2020, ter descoberto o uso de tratamentos proibidos para água mineral em suas marcas Perrier, Hépar e Contrex.

A empresa entrou em contato com o governo para obter assistência e apresentou um plano para resolver o problema até meados de 2021.

Um ano e meio depois, as autoridades aprovaram um plano de transformação de suas instalações para substituir os tratamentos proibidos –ultra-violeta, carvão ativado– por microfiltração fina.

Mas este método pode privar a água mineral de suas características, contrariando o que a legislação europeia estipula para a água mineral natural.

"Apesar da fraude ao consumidor que a desinfecção da água representa", as autoridades não tomaram medidas legais em resposta às revelações de 2021, enfatiza o relatório.

Segundo a comissão parlamentar, o gabinete do presidente Emmanuel Macron "sabia, pelo menos desde 2022, que a Nestlé estava trapaceando há anos."

Alexis Kohler, então secretário-geral da presidência, se reuniu com executivos da Nestlé.

Em 2024, a Nestlé Waters admitiu ter usado filtros proibidos e tratamento ultravioleta em águas minerais. A empresa pagou uma multa de 2 milhões de euros (R$ 12,7 milhões, na cotação atual) para evitar ações legais.

Para Zuckerberg, amizade é mistura de utilidade e prazer, como ir ao self-service, João Pereira Coutinho - FSP

 A tecnologia serve para resolver problemas práticos. Não serve para resolver problemas existenciais. E, no entanto...

E, no entanto, basta escutar os mandarins da tecnologia, com suas togas imaginárias, dissertando sobre o assunto com verdadeiro fervor religioso. Eles não querem apenas melhorar as condições materiais da espécie. Querem melhorar a própria espécie e, se possível, encaminhar a humanidade para a terra de leite e mel que era coutada exclusiva das religiões do passado.

O exemplo mais recente, e mais deprimente, é Mark Zuckerberg. A solidão é um problema feio, disse ele, como se tivesse descoberto uma praga única nunca vista na história da humanidade. Os norte-americanos, acrescenta Mark, têm em média três amigos apenas. É um ultraje.

Mas existe uma cura para isso: a inteligência artificial, claro. Em breve, será possível ter um amigo virtual que nos conhece e nos aceita, preenchendo o buraco que existe em nossas vidas.

Tem piada: Zuckerberg contribuiu para o buraco com a rede social que criou. Um mundo de mil amigos onde não existe um só de verdade.

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Acreditar que será ele agora a tapar o buraco com uma nova utopia tecnológica é uma forma de fé que ainda não está descrita nos manuais de teologia.

Mas o problema nem é esse. O problema é a ignorância do homem sobre a natureza da amizade. É a forma artificial e autocentrada como ele entende o conceito, revelando ao mundo a sua inadequação para lidar com o problema.

Para Zuckerberg, a amizade é uma mistura de utilidade e prazer, que vamos usando consoante as nossas necessidades. Um amigo, real ou virtual, existe para nos beneficiar ou divertir, consoante as circunstâncias. É como ir ao self-service: cada um pega o que quer.

Haverá forma mais pobre de olhar para o assunto?

Não há, diria Aristóteles, o mais importante pensador sobre estas matérias. Na sua "Ética", o filósofo apresenta três tipos de amizade que não devem ser confundidos.

O primeiro tipo apresenta o amigo como alguém que é útil para nós. Mantemos a amizade porque o seu fim seria um prejuízo, muitas vezes no sentido mais básico do termo.

No mundo profissional, é um tipo de amizade comum: os amigos do trabalho são, na realidade, elementos que nos convêm para cumprir tarefas ou obter ganhos pessoais.

A instabilidade dessa relação é óbvia: finda a utilidade da relação, a amizade desaparece tão rapidamente como apareceu.

O segundo tipo de amizade, segundo Aristóteles, acredita que o amigo é uma fonte de prazer, como acontece com certas drogas ou certos líquidos. Como escreve o filósofo, os jovens são especialmente propensos a esse hedonismo calculado.

A imagem apresenta uma série de figuras humanas estilizadas, todas na cor preta, organizadas em linhas. No meio dessas figuras, uma delas se destaca, sendo representada na cor laranja. Essa figura laranja está posicionada na linha do meio, entre as figuras pretas, criando um contraste visual.
Angelo Abu

Mas também aqui a precariedade é notória: quando o amigo deixa de ter valor lúdico, é hora de encontrar um novo "entertainer". Essa é uma das razões pelas quais as amizades de juventude são tão intensas e, paradoxalmente, tão facilmente descartáveis e substituídas.

Qual é, então, o conceito mais elevado de amizade?

É a amizade por virtude: dois seres humanos reconhecem-se como humanos, valorizam mutuamente a excelência do outro e, pormenor fundamental, desejam o bem do outro sem pensar em benefício próprio.

É uma forma de amor, feita de admiração e confiança, onde as sujidades do ego ocupam um plano secundário.

Eis o teste da verdadeira amizade: olharmos para o amigo como um fim, não como um meio. Desejarmos o seu bem, não para o nosso bem —mas porque ele é quem é e nós somos quem somos, na belíssima definição de Montaigne sobre o amigo Étienne de La Boétie.

Sem surpresas, amigos desses são raros. Raríssimos. Exigem tempo, dedicação, às vezes sacrifício. De mim falo: conto pelos dedos de uma mão os amigos que correspondem à descrição do filósofo. Não sei se é um amor correspondido, mas acredito que sim.

A amizade virtual falha o teste aristotélico. Para começar, só por piada um algoritmo deseja o nosso bem. Ele pode ter sido programado para isso, mas a autenticidade que procuramos no amigo não existe. Existe apenas um simulacro de autenticidade que só amplifica a nossa solidão primordial.

Por outro lado, seria absurdo desejar o bem de uma máquina. A reciprocidade nem sequer existe nesse contexto, porque uma máquina não tem virtudes ou necessidades. Uma vez mais, existimos apenas nós com uma ilusão de amizade.

Hoje, o inefável Zuckerberg lamenta que os americanos tenham apenas três amigos em suas vidas. Pobre Mark. Soubesse ele o que é a amizade e esses três amigos, se fossem verdadeiros, já seriam um tesouro e uma multidão.

Desaceleração da China faz Vale diminuir teor de minério de ferro, na contramão de aço mais limpo, FSP

 Pedro Lovisi

São Paulo

Vale vai lançar nos próximos meses um novo produto de minério de ferro com teor menor do que o geralmente vendido pela empresa. O lançamento visa atender a demanda das siderúrgicas chinesas, que têm operado com lucros menores do que o habitual devido à desaceleração da economia da China.

O país asiático absorve 62% das vendas da Vale e, por isso, tende a direcionar as estratégias da mineradora. No final de abril, o vice-presidente executivo comercial e desenvolvimento da empresa, Rogerio Nogueira, afirmou a investidores que a empresa criará um produto de médio teor feito com o minério de Carajás, de alta qualidade.

A imagem mostra um posto de controle em uma área de mineração. O posto é coberto por uma tenda marrom e possui uma porta azul. Ao redor, há cercas de segurança com postes vermelhos e brancos, além de sinalizações visíveis. O terreno é árido e rochoso, com uma grande parede de rocha ao fundo.
Complexo minerário S11D, em Canaã dos Carajás - Felipe Borges/Folhapress

Segundo uma pessoa ligada à Vale, a mineradora vai usar parte do estéril (material sem valor econômico), antes descartado na extração, para combiná-lo com o minério de altíssimo teor de Carajás e, assim, criar um produto com teor entre 60% e 63%, com características metalúrgicas diferentes dos feitos com o minério de Minas Gerais.

Hoje, o minério de ferro extraído em Carajás tem teor de 66% e o produto principal da mineradora (feito a partir de uma mistura com o minério de MG) tem teor de 62%.

"Nossos clientes estão operando com margens muito baixas, porque os preços do carvão de coque estão muito baixos, então o que vemos hoje é uma menor necessidade de produtividade. E, assim, os prêmios de qualidade estão em seu nível mais baixo, e o que os clientes realmente estão buscando são minérios de ferro de grau médio", disse Nogueira na ocasião.

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De forma geral, o movimento chama atenção, porque o minério de ferro de Carajás é frequentemente chamado de ovo de ouro da Vale, visto seu teor altíssimo, o que aumenta a produtividade de siderúrgicas. Além disso, em um mundo que corre em direção à descarbonização, esse tipo de minério é essencial para a fabricação de um aço mais limpo, sem o uso de carvão, material poluente.

Mas a atual preferência dos chineses pelo minério de menor teor escancara a dificuldade da economia internacional de privilegiar a descarbnonização em detrimento de ganhos de curto prazo. O portal MySteel, especializado em siderúrgicas chinesas, publicou na semana passada que a maior demanda dos chineses por minério de ferro com menor teor fez a diferença de preço entre minérios de grau médio e baixo diminuir.

Como exemplo, o portal aponta que a diferença entre a tonelada do minério de 56,5% da australiana Fortescue e a do de 61,5% da também australiana Rio Tinto caiu US$ 1,63 na última semana, saindo de US$ 19,63 para US$ 18. Isso devido ao aumento de US$ 3,55 na tonelada do minério de baixo teor da Fortescue e de apenas US$ 1,9 no de médio teor da Rio Tinto. Junto com a BHP, as duas empresas são as principais concorrentes da Vale.

A Rio Tinto anunciou recentemente que reduzirá o teor de seu principal produto de 61,6% para 60,8%. O operador comercial de uma trading internacional que atua no Brasil disse à Folha que outras mineradoras brasileiras também têm intensificado a venda de produtos com menor teor.

"É um recorte do momento que está bastante ligado com a situação da China, o maior produtor de aço. Hoje há um movimento muito grande de exportação de aço pela China, o que significa que eles não estão consumindo tudo o que produzem, então naturalmente essa oferta em excesso pressiona o preço e consequentemente as margens diminuem", afirma Artur Bontempo, analista de aço e minério de ferro da consultoria Wood Mackenzie.

O minério de ferro de alto teor pode ser usado tanto na rota de redução direta quanto nos altos-fornos, que necessitam de carvão. A primeira rota, apesar de ser a mais limpa e essencial para a descarbonização do aço, ainda é minoria em todo o mundo e não chega nem a 5% da produção chinesa. Assim, o minério de ferro de alto teor na China é usado para intensificar a produção de ferro-gusa (um material intermediário na produção de aço), o que reduz a quantidade de carvão queimado e, consequentemente, de CO2 emitido na atmosfera.

Mas com a queda da procura por minerais de alto teor, as mineradoras com produtos de teor elevado, como a Vale, têm diversificado seus portfólios.

Em evento na semana passada com investidores, por exemplo, a gerente de estratégias corporativas da Vale, Debora Doblas, destacou que a intenção da mineradora é atender o momento de seus clientes. "A Vale hoje tem minério de alta qualidade, mas também tem uma ampla gama de produtos, inclusive de especificações únicas que permitem que a gente tenha mais flexibilidade no portfólio", afirmou.

"E, por a gente acreditar que a descarbonização vai acontecer de forma gradual, no curto prazo a gente está olhando mais para o que o cliente precisa. Então hoje a siderurgia com margem apertada e o preço do carvão mais deprimido acabam não incentivando a aceleração da agenda de descarbonização", acrescentou.