quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Estreia do Brasil será teste para relação entre torcida e camisa da seleção, Tayguara Ribeiro, FSP

 Muito já se falou que esta é uma Copa do Mundo cheia de situações novas. A primeira em um país do Oriente Médio. Mudou do meio do ano para novembro. Torneio disputado nos arredores de uma única cidade. Mas as mudanças não estão só na competição. O futebol brasileiro também tem um desafio novo.

E não é dentro de campo. Política e futebol nunca estiveram distantes, a despeito de crenças e ditados. Mas o último ciclo pós Mundial da Rússia em 2018 (e eleições para presidente no mesmo ano) propiciou uma simbiose pouco vista antes entre as duas áreas. Ao menos na mistura entre torcida e militância política.

Nos últimos anos, a camisa da seleção brasileira de futebol passou a ser utilizada em manifestações de apoio ao atual presidente do país, Jair Bolsonaro (PL). E esse será o primeiro grande torneio disputado depois desse período.

Não é como se a camisa amarela nunca tivesse sido usada em protestos antes. Não é como se o futebol nunca tivesse sido usado para fins políticos. Mas desta vez, o uso intenso e contínuo por um grupo político específico gerou um certo simbolismo.

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Manifestação antidemocrática de bolsonaristas em frente ao Quartel do Comando Militar do Sudeste, no bairro do Ibirapuera, zona sul da capital paulista - Mathilde Missioneiro -03.nov.22/Folhapress

Tanto que, ao longo dos últimos meses, ao se deparar com uma pessoa usando a camisa canarinho, acontece uma associação quase automática com a preferência política (e não com o futebol). Existe um constrangimento no ar de uma parcela dos brasileiros em utilizar a roupa amarela. O medo de ser confundido.

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Em tempos outros, semanas antes da Copa seria impossível assistir a qualquer anúncio comercial, na TV ou na internet, sem que os atores estivessem uniformizados. Neste ano, muitas empresas adotaram o distanciamento controlado. Preferem camisas verdes ou azuis. Não à toa, CBF tem investido em campanha para desvincular essa imagem.

Sim, a camisa amarela da seleção brasileira não pertence a nenhum grupo político. Ela tem um peso no futebol como nenhuma outra. Pentacampeã. Vestida por grandes craques. Mas não parece fácil evitar o pensamento de que a imagem do uniforme acabou se identificando ou sendo identificada com uma das partes de um país rachado.

Não é incomum torcedores de outras vertentes ideológicas passarem a usar uniformes do Brasil de outras cores. Há o azul. Há o branco. Há o preto. Nem preciso dizer (e no fim estou dizendo) que são camisas menos emblemáticas, na comparação com a amarela. Algumas são de treino.

Há ainda quem coloque adereços na camisa amarela, como um lenço de outra cor amarrado no braço, tentando se desvincular de qualquer associação apressada.

Desde o final da eleição na qual o chefe do Executivo foi derrotado pelo ex-presidente Lula (PT), centenas de pessoas aglomeram-se diariamente em atos antidemocráticos. De amarelo, pedem intervenção militar. De amarelo, estão em frente a quartéis. Isso tem aumentado o mal-estar.

É nesse cenário que o Brasil estreia na Copa do Mundo contra a Sérvia. Será que vitórias podem ajudar a reverter a imagem e unificar a relação com a camisa da seleção? Começaremos a descobrir nesta quinta.

As declarações de apoio na campanha eleitoral de alguns jogadores não ajudaram muito. Especialmente quando o craque do time, Neymar, promete oferecer gol a Bolsonaro. Claro que a preferência política é um direito, mas no momento atual acabou associando o camisa 10 do time ao presidente.

Talvez a caturrice com a amarelinha não resista aos gols, e com o hexa o simbolismo volte a ser outro depois de 18 de dezembro.


Ruy Castro - Com Erasmo Carlos para Playboy, FSP

 "Já tive a minha fase de ídolo, de ser rasgado pelas fãs, de não poder sair à rua. Um dos motivos da minha calvície foram os chumaços de cabelo que as meninas arrancavam. Até três juntas dá pra encarar, só querem beijar. Mas, no que passou de dez, ficam selvagens, te pisoteiam, podem até te matar."

"Eu não vim da elite. Vim do proletariado urbano, nasci na Zona Norte do Rio. Cantei em circo, cantei em propaganda de candidato a vereador na Baixada Fluminense, cantei em caminhão, já fui em avião de carga para cantar no Piauí. Já cantei em cinema sem microfone. Onde pintava uma grana eu ia buscar."

"Era chique convidar o pessoal da Jovem Guarda para as festas. Uma grã-fina dizia pra outra: ‘Sabe quem vem? O Erasmo!’. A outra dizia: ‘Oh!’. E lá ia eu. Era só chegar, dizer boa-noite e já me punham um violão na mão. Depois de cantar, eu me interessava por uma ou por outra. Mas aí já não servia mais. As mães delas diziam: ‘Ponha-se no seu lugar. Quem é você para querer a minha filha?’."

"Quando a Jovem Guarda faliu, ninguém mais quis saber de mim. Aí pintou o tropicalismo e eu descobri que havia cabeludos mais cabeludos do que eu, gente que usava roupas mais extravagantes que as minhas, rebeldes mais ousados do que eu —porque eu era rebelde, mas não era ousado. Pirei. Ninguém mais me recebia nem com cafezinho. Tive de recomeçar do zero."

"Foi num show da Elis Regina no Canecão. Ninguém entendeu por que eu chorei quando ela cantou ‘As curvas da estrada de Santos’. Para mim, era a volta por cima. Hoje está todo mundo integrado, as pessoas gravam umas com as outras, é uma bacanal de ritmos, ninguém cobrando raízes. Música é universal e não tem de estabelecer fronteiras. Se há duas pessoas que eu não me canso de ouvir, e não vou me cansar nunca, são Elvis Presley e João Gilberto."

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Playboy, 1980. Trechos de minha entrevista com o suave Erasmo.

Erasmo Carlos e Ruy Castro na casa do artista, no Rio, em 1980
Erasmo Carlos e Ruy Castro na casa do artista, no Rio, em 1980 - Reprodução

Guerra na Ucrânia: Como a Alemanha superou sua dependência do gás russo para este inverno, OESP

 BERLIM - Depois de previsões pessimistas para este inverno do Hemisfério Norte na Alemanha, frente ao corte pela Rússia de fornecimento de gás natural para o país altamente dependente, os próximos meses dão sinais de que não serão, no final das contas, tão difíceis assim. O país conseguiu encher seus reservatórios de gás antes que a torneira secasse e nesta quarta-feira, 23, chegou o primeiro de vários navios que servirão como terminais flutuantes para receber importações de gás natural liquefeito.

O navio, batizado de Netuno, chegou ao porto de Mukran, no Mar Báltico, e deve começar a operar nas proximidades de Lubmin em 1º de dezembro. Unidades semelhantes de armazenamento flutuante estão programadas para chegar aos portos de Wilhelmshaven e Brunsbuettel no Mar do Norte ainda este ano.

O gás natural liquefeito (GNL) será uma das principais apostas para garantir a sua segurança energética neste inverno, que ficou prejudicada depois da invasão russa à Ucrânia. Altamente dependente do gás natural importado da Rússia, o país viu sua principal fonte de energia sendo utilizada como arma na guerra e buscou outras formas de diversificar sua matriz.

O navio 'Netuno' se aproxima do porto de Mukran, Alemanha
O navio 'Netuno' se aproxima do porto de Mukran, Alemanha Foto: Stefan Sauer/dpa via AP

Juntamente com outras medidas tomadas pelo governo - como reviver carvão desativado e usinas a óleo e estender a vida útil de seus três reatores nucleares restantes - “neste inverno a segurança energética da Alemanha parece garantida”, disse o chanceler Olaf Scholz aos legisladores nesta quarta-feira.

O GNL é basicamente o mesmo gás natural, porém resfriado até atingir a forma líquida, a fim de reduzir seu volume e facilitar o transporte. Em seguida, ele é convertido novamente à forma gasosa. A estratégia, porém, levanta outras preocupações, como tornar a Europa dependente da matriz que não é renovável e porque será suficiente para este inverno apenas, o próximo ainda é uma preocupação.

Inicialmente o governo alemão tinha previsto que o projeto de terminais flutuantes custariam menos de 3 bilhões de euros, mas uma reportagem da Der Spiegel revelou que os custos poderiam ser o dobro, o que foi posteriormente confirmado pelo Ministério da Economia. O país, conhecido pela burocracia pesada, também aprovou uma lei para acelerar o desenvolvimento dos terminais, suspendendo a exigência de avaliações ambientais.

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Outra preocupação é com o mercado para alimentar estes terminais, já que o GNL não é tão disponível no mundo e pode prejudicar nações que são dependentes, mas com poder de compra menor que o da Alemanha.

“A Alemanha precisa utilizar cerca de 3% da produção anual mundial de GNL para abastecer seus novos terminais. Uma maneira é através do capitalismo selvagem. A maioria dos contratos de GNL são de longo prazo, mas os fornecedores podem não cumprir os termos, pagar uma multa por quebra de contrato e vender o GNL ao maior lance. A indústria alemã pode fazer lances altos”, explicou Rui Soares, da empresa de investimentos independente FAM Frankfurt Asset Management ao Financial Times.

Um barco da polícia passa pelo canteiro de obras do terminal 'Uniper' de GNL (Gás Natural Liquefeito) em Wilhelmshaven, Alemanha
Um barco da polícia passa pelo canteiro de obras do terminal 'Uniper' de GNL (Gás Natural Liquefeito) em Wilhelmshaven, Alemanha Foto: Michael Sohn/AP

Aos terminais, se somam os estoques de gás natural que já estão 100% cheios, muito antes do que o previsto, o uso de carvão e a manutenção das usinas nucleares que estavam inicialmente previstas para serem desligadas até o fim deste ano. Com este plano, e a esperança de um inverno mais quente que o normal, a Alemanha espera precisar economizar apenas 20% de energia neste inverno, algo que pode ser feito com atitudes menores da população.

“A indústria alemã já reduziu o consumo em mais de 20% por meio de medidas de eficiência, paradas de produção e troca de combustível. As famílias poderiam fazer a mesma economia diminuindo seus termostatos em aproximadamente 3 ºC, ou talvez menos, uma vez que fogões a óleo, aquecedores elétricos e até lareiras são levados em consideração. Isso significaria que as famílias alemãs viveriam com uma temperatura ambiente entre 17 ºC e 19 ºC. Não é um sacrifício insuportável”, completa Soares ao FT. Com todos os terminais prontos, a expectativa é ainda mais animadora.

O inverno futuro

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Mas se por um lado a Alemanha e demais países da Europa conseguiram se preparar para o inverno que se aproxima, o seguinte ainda é um mistério e pode levar à escassez de gás, segundo Agência Internacional de Energia (AIE), que insta os governos a atuar imediatamente para reduzir a demanda.

A região pode enfrentar um déficit de 30 bilhões de metros cúbicos de gás no ano que vem, o que pode se concretizar se a Rússia interromper por completo o fornecimento e a China começar a consumir grande parte do gás natural liquefeito, calcula a agência com sede em Paris.

As reservas europeias podem estar em apenas 65% no início do inverno de 2023-2024, em comparação com 95% atualmente, disse seu diretor, Fatih Birol, durante uma entrevista coletiva no início de novembro.

“Os atuais níveis de reservas, além da recente queda nos preços do gás e temperaturas excepcionalmente amenas, não devem levar a conclusões excessivamente otimistas para o futuro”, adverte a AIE, que disse que para o verão de 2023 as condições geopolíticas e econômicas mundiais para o abastecimento estarão certamente diferentes das de 2022. Neste verão, o abastecimento das reservas contou com “fatores-chave que podem não se repetir em 2023″.

Começando pela posição da Rússia, cujos gasodutos entregaram este ano quantidades quase normais no primeiro semestre, antes da redução do fornecimento pela guerra na Ucrânia. No total, o país já forneceu cerca de 60 bilhões de metros cúbicos à União Europeia este ano, mas a AIE indicou que é altamente improvável que a Rússia entregue a mesma quantidade em 2023 e pode até encerrar por completo.

Além disso, a China necessitou de menos GNL este ano, facilitando as compras europeias. A produção mundial de GNL deve aumentar, mas somente em 20 bilhões de metro cúbicos. Se as importações chinesas voltarem em 2023 ao nível de 2021, absorverão grande parte do aumento, considera o estudo intitulado “Nunca é cedo demais para se preparar para o inverno 2023-24″.