quarta-feira, 1 de maio de 2019

Golpe ou revolução?, FSP

SÃO PAULO
Enquanto a situação na Venezuela não se define, e torcendo para que o embate não degenere em guerra civil, podemos nos perguntar se o movimento deflagrado por Juan Guaidó deve ser classificado como tentativa de golpe ou como revolução para pôr fim a uma usurpação. A imprensa mundial se dividiu sobre a designação, e não apenas segundo as linhas ideológicas esperadas.
A definição menos polêmica de golpe, como ruptura institucional, em geral pela força, funciona bem até a página 1. Quando temos um governo legítimo que tem seu funcionamento suspenso de forma não prevista em lei, estamos inegavelmente diante de um golpe. É o caso da deposição de João Goulart em 1964.
É raro, porém, que o mundo nos presenteie com situações tão claras. Ora, nem todo governo é legítimo, mas todo governo impõe uma ordem jurídica passível de violação. Se nos centrarmos no critério formal, teríamos de considerar golpista, por exemplo, a resistência francesa ao nazismo, que, ao fim e ao cabo, agia contra a lei vigente com o objetivo de depor o regime.
O caso da Venezuela é suficientemente ambíguo, pois, embora os partidários de Guaidó tenham buscado uma ruptura, dá para afirmar que o governo de Nicolás Maduro tornara-se ilegítimo seja quando se utilizou de uma artimanha não prevista em lei para esvaziar os poderes da Assembleia Nacional em 2017 ou, de modo mais polêmico, quando fraudou o pleito que o reelegeu em 2018. Se aceitamos isso, faz sentido enquadrar Guaidó não como golpista, mas como resistente.
A moral da história é que não estamos diante de questões que possamos decidir por meio de formalismos jurídicos. Não há como escapar à tarefa bem mais difícil de fazer juízos morais sobre as posições dos contendores.
Minha avaliação pessoal é a de que, com Maduro, a Venezuela não tem futuro, daí que, na melhor tradição consequencialista, é melhor para o país livrar-se dele.
 


Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Startup utiliza luz contra a dor, Fapesp

Eduardo Geraque  |  Pesquisa para Inovação – Em 2007, Marcelo Sousa, ainda estudante do último ano de física da Universidade Federal do Ceará, peregrinou por alguns hospitais de Fortaleza por causa de uma doença na família. O câncer da avó do futuro físico fez com ele constatasse uma difícil realidade. A tecnologia oferecida ao paciente, segundo ele, era algo do século 19.
“Aquela situação, e mesmo depois do falecimento da minha avó, fez com que eu decidisse que precisava usar a física de uma forma mais aplicada. Naquela época ainda estudava apenas física teórica”, afirma Sousa.
O primeiro passo rumo ao mundo da inovação ocorreu de forma simultânea à decisão de fazer o mestrado. Ele leu como se fosse um romance o livro Física para Ciências Biológicas e Biomédicas, de Emiko Okuno e outros autores, e começou a entender que a fronteira entre a física e a biologia era muito pequena. “Eu escrevi para a autora pedindo para ela me orientar no mestrado. Ela disse que estava aposentada e me indicou um laboratório no Instituto de Física da USP. Lá decidi então que seguiria a área da fotomedicina, um campo praticamente desconhecido”, diz Sousa.
Do mestrado veio o doutorado e, por meio do programa Ciência sem Fronteiras, a possibilidade de estudar em Harvard. O doutorado do físico cearense culminou com a descoberta do fenômeno da fotoneuromodulação. Neste processo, o uso da luz faz com que os neurônios passem a conduzir menos a sensação de dor, o que gera um efeito analgésico na pessoa, sem efeitos colaterais.
O salto entre a pesquisa básica feita durante o doutorado e a inovação tecnológica desenvolvida pela Bright Photomedicine, fundada em novembro de 2014, foi um inocente jogo de futebol, nos Estados Unidos. “Lembro que depois de um racha, no MIT, contei para os amigos sobre a minha pesquisa. Todos foram unânimes em me dizer que eu tinha em mãos um projeto de startup”, lembra Sousa. “Lá, eles têm muito sangue nos olhos quando o tema é inovação tecnológica.”
Segundo ele, entre 2013 e 2014, a imersão no mundo da inovação foi total. “Percebi que era um ambiente que me daria muito mais retorno profissional do que simplesmente seguir a carreira acadêmica tradicional. Aprendi muito, porque as pessoas desse setor têm visões diferentes das dos cientistas. É muito interessante.”
Sobre a pesquisa mais básica feita no doutorado, Sousa e os colaboradores que foram entrando no projeto agregaram tecnologia, algoritmos e big data. Na prática, o que a empresa desenvolve, dentro da fotomedicina, é uma tecnologia em que o médico ou o fisioterapeuta controla a dose e o tipo de luz exata para cada paciente. Nos casos de dores crônicas e severas, essa aplicação de luz tem efeito análogo ao da aplicação de uma droga. “O equipamento em si é simples. Ele pode ser carregado em uma mochila. O nosso diferencial está todo na nuvem. O software que desenvolvemos calcula tudo e indica qual é a dose ideal, considerando tanto a doença quanto o paciente. É um remédio digital.” O algoritmo informa o tempo de aplicação de luz e todas as características físicas da aplicação.
A ideia científica que deu sustentação à startup, em 2015, foi apoiada pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. Em 2017, na fase 2 do programa, a empresa obteve mais recursos para o projeto “Desenvolvimento e validação tecnocientífica de equipamento vestível wearable para fototerapia”.
Além do apoio da FAPESP, a empresa também ganhou outros financiamentos públicos e privados nos últimos quatro anos. Em 2015, a startup foi a vencedora do programa de aceleração da Startup Farm. Em 2019, R$ 1,5 milhão foram captados via Kria, uma das maiores plataformas de investimento on-line do país. No total, 70 investidores privados aportaram um ticket médio de R$ 21 mil na iniciativa. O primeiro protótipo da empresa, segundo Sousa, em 2016, foi o grande divisor de águas na história da Bright.
Com o protocolo para o uso da fotobiomodulação sendo testado clinicamente em pacientes com osteoartrite no joelho no Hospital das Clínicas do Estado de São Paulo, Sousa e todo o time da Bright Photomedicine começam a olhar para outras áreas onde a tecnologia desenvolvida por eles pode ser aplicada.
“Além do efeito analgésico, também estamos pesquisando o uso da luz como anti-inflamatório ou também com ação neurológica, em casos de enxaquecas, depressão, Parkinson ou Alzheimer”, diz Sousa. Segundo ele, apresentações sobre estes próximos passos feitas em workshops internacionais foram bem recebidas pela comunidade científica.
Em tese, o efeito terapêutico da aplicação de luz ocorre devido a reações fotoquímicas no interior das células. Neste processo, os tecidos biológicos produzem remédios endógenos que permitem ao organismo voltar a ficar saudável. O que abre a possibilidade, também, de a tecnologia ser usada na cura de feridas ou em pós-operatórios em geral.
“É um mercado com muito potencial. Nossa tecnologia é única, criamos o remédio digital orgânico, no qual o próprio organismo é estimulado a produzir o remédio. Não temos concorrentes fazendo essa abordagem. Temos um horizonte com oceano azul”, diz Sousa. Atualmente, na expectativa da empresa, milhões de pessoas que sofrem com dores crônicas poderão ser beneficiados pela tecnologia. O fato de ela ser indolor, não invasiva e sem efeitos colaterais aumenta ainda mais o sucesso do negócio.
Com a chegada de outros sócios e executivos na empresa, o físico afirma ter conseguido um privilégio. Em 2019, por enquanto, ele conseguiu trabalhar durante 90% do tempo como cientista. “Isso nem sempre é fácil neste universo da inovação”, afirma. A empresa publicará a eficácia dos resultados quantitativos do ensaio clínico feito no Hospital das Clínicas.
Bright Photomedicine
www.brightmed.com.br
Endereço: Av. Prof. Lineu Prestes, 2242 - Butantã, São Paulo - CEP 05508-000
Telefone: (11) 3039-8373
Contato: www.brightmed.com.br/contato
Palavras-chave: Fotomedicina, fotobiomodulação, osteoartrite,Marcelo Sousa, Bright Photomedicine, dor, HC, osteoartrite

Concessão de fábrica dobrou custo de medicamentos para o Estado , OESP

01/05/2019 12h05
São Paulo - A matéria enviada anteriormente trazia uma incorreção no 1º parágrafo. A concessão dobrou o custo dos medicamentos genéricos adquiridos pelo Estado de São Paulo, e não como constava. Segue o texto corrigido.

A concessão de uma fábrica de remédios do governo paulista à iniciativa privada dobrou o custo dos medicamentos genéricos adquiridos pelo Estado, criou uma dívida milionária com o laboratório contratado e colocou em xeque o modelo de parceria público-privada (PPP) para gestão de indústrias farmacêuticas. Diante dos problemas, o governo João Doria (PSDB) não descarta rescindir o contrato, que é alvo de uma investigação do Ministério Público Estadual e de uma CPI recém-instalada na Assembleia Legislativa de São Paulo. 

A PPP foi assinada em agosto de 2013 pela Fundação para o Remédio Popular (Furp), órgão vinculado à Secretaria da Saúde, com a Concessionária Paulista de Medicamentos (CPM), controlada pelo laboratório EMS, para fazer a gestão, operação e manutenção da fábrica de Américo Brasiliense, no interior paulista. À época, o então governador Geraldo Alckmin (PSDB) destacou que a CPM investiria cerca de R$ 130 milhões na unidade nos cinco primeiros anos - são 15 anos de concessão - e produziria 96 tipos de medicamentos para serem distribuídos na rede pública de Saúde.



Até hoje, porém, a concessionária só fez metade dos investimentos previstos - após notificações sobre descumprimento do contrato - e produz apenas 13 dos 96 medicamentos, segundo a Secretaria da Saúde. A CPM, por sua vez, cobrava da Furp um ressarcimento de R$ 65 milhões até 2017. A dívida resulta de distorção entre o preço dos remédios previstos no contrato da PPP e o valor de mercado dos mesmos medicamentos. 

Isso porque, entre maio de 2015 e julho de 2016, a Furp pagou para a CPM o mesmo valor das atas de registro de preço das compras de remédios feitas pela secretaria com outros fabricantes do mercado. Mas, na média, o valor era 53% menor do que o previsto no contrato da fábrica privatizada para os mesmos itens. 

Após ser cobrada pela CPM, que alegava desequilíbrio no contrato, a secretaria passou a fazer, a partir de agosto de 2016, repasses fixos de R$ 7,5 milhões mensais para a Furp pagar a concessionária, independentemente do volume de entrega de remédios pela fábrica. O jornal O Estado de S. Pauloteve acesso ao inquérito aberto pelo MP estadual, com base em uma denúncia feita por um funcionário da fábrica - a investigação está sob sigilo. 

Documentos oficiais da Furp e da secretaria mostram que há casos em que os preços previstos na PPP chegam a ser sete vezes mais caros do que os de mercado. É o caso do sildenafila, remédio usado por quem sofre de disfunção erétil, e fluoxetina, indicado para depressão e transtorno alimentar. No início de 2018, cada comprimido produzido na fábrica tinha custo de R$ 3,85 e R$ 0,30, respectivamente, enquanto o preço de referência no mercado era de R$ 0,49 e R$ 0,04.

Em ofício enviado à secretaria em maio de 2017, a Furp destaca que a CPM não recolhe ICMS sobre medicamentos vendidos, não tem gastos com logística de distribuição, e o contrato não prevê ganhos de escala na produção, ou seja, redução do preço unitário para a compra de um volume maior. 

Ainda em 2017, a Furp listou todos os "pontos críticos" da PPP à secretaria, que pediu um parecer à Procuradoria-Geral do Estado (PGE) para saber se poderia pagar mais caro pelos medicamentos na PPP. A PGE deu parecer favorável à manutenção do contrato, dizendo que ele incluía outros custos da concessionária, como a manutenção da fábrica. Apesar disso, a comissão do governo que acompanha as PPPs estaduais não descarta a possibilidade de extinção do contrato com a CPM. "Esse contrato de gestão da Furp será investigado porque existem indícios de algo que não deveria acontecer, que é interesse privado sobrestar o poder público", disse o deputado Edmir Chedid (DEM), presidente da CPI da Furp.

Contestação

A Secretaria Estadual da Saúde, a Furp e a CPM afirmam que não é possível comparar os preços dos remédios da fábrica concedida com os dos medicamentos comprados diretamente no mercado porque o contrato de concessão inclui outros serviços, como manutenção da indústria. Segundo a secretaria, foram realizados no ano passado "diversos investimentos na fábrica". Segundo a pasta, os preços das atas de registro "são exclusivamente para fornecimento de medicamentos" para o Estado, "mantendo assim diferença fundamental da natureza jurídica das complexas atividades realizadas pela CPM".

A CPM afirmou que os investimentos na infraestrutura da fábrica estão "100% de acordo com o cronograma acordado" com a Furp e que "todos os procedimentos adotados para a obtenção de registros de medicamentos foram feitos conjuntamente". A empresa afirmou ainda que "tem interesse na célere realização do processo de revisão contratual".

Secretário da Saúde no governo Geraldo Alckmin, David Uip afirmou que o impasse na PPP era "conceitual" e "superava a função da secretaria". Segundo ele, o aumento da concorrência reduziu o preço dos genéricos no mercado e a crise econômica do País diminuiu o poder de compra do Estado. "Não é problema simples, tanto é que até hoje não foi resolvido." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fabio Leite e Tulio Kruse