terça-feira, 30 de dezembro de 2025

Faça a América doente de novo, Hélio Schwartsman, FSP

 A tática de Robert Kennedy Jr., o secretário de Saúde de Trump, para reduzir a lista de vacinas recomendadas pelo governo federal até que tem seu apelo. Ele diz que está apenas usando de bom senso e espelhando as recomendações da Dinamarca —uma nação rica da Europa que apresenta indicadores de saúde bem melhores que os dos EUA.

Um incauto até poderia se sentir tentado a abraçar o argumento. Não só a Dinamarca, mas vários países europeus têm listas de vacinas da infância bem mais curtas que a dos EUA. É que no velho continente existem bons sistemas de saúde pública e as doenças infecciosas estão mais contidas do que no novo mundo. Ali, sai mais barato diagnosticar e tratar precocemente os poucos casos que surgirão do que vacinar todas as crianças contra moléstias que elas nunca pegarão.

E as autoridades sanitárias europeias não padecem de antivacinismo ideológico. Se a situação epidemiológica mudar, as vacinas serão rapidamente incluídas no calendário de imunizações.

Homem de cabelos grisalhos veste terno azul escuro com camisa branca e gravata preta, sentado em cadeira de couro marrom, em ambiente interno com cortinas bege ao fundo.
O secretário de Saúde dos EUA, Robert F. Kennedy Jr., em reunião de Gabinete na Casa Branca, em Washington (EUA) - Andrew Caballero-Reynolds - 2.dez.25/AFP

Às vezes eu sinto inveja de tempos de epistemologia mais simples, nos quais, exagerando só um pouco, bastava ver para crer, como epitomizou são Tomé. Mesmo Galileu Galilei, na versão algo fantasiosa de Brecht, não pedia aos inquisidores mais do que olhar no telescópio e visualizar as luas de Júpiter. Não olharam.

A ciência hoje se ampara fortemente na estatística e não raro recorre a entidades meio abstratas como os contrafactuais. Isso não a torna pior, mas, como nem todo mundo consegue acompanhar os cálculos, abre-se um flanco para teorias da conspiração e ideologias predatórias.

E o que as estatísticas dizem sobre vacinas? Um amplo estudo publicado por The Lancet em 2024 mostrou que os esforços globais de imunização salvaram, nos 50 anos anteriores ao trabalho, 154 milhões de vidas, o que representa uma vida poupada a cada seis minutos ao longo de meio século.

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É difícil até imaginar tecnologia mais exitosa. É ela que Kennedy e sua turma estão, por falta de visão, empenhados em destruir.

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