quinta-feira, 7 de agosto de 2025

Mais de 3 milhões de pessoas moram em áreas precárias na região Metropolitana de São Paulo, FSP

 

Agência Fapesp

A população em áreas precárias na região Metropolitana de São Paulo é estimada em 3,28 milhões de pessoas em 1,12 milhão de domicílios, segundo pesquisa conduzida por Eduardo Marques, pesquisador e diretor do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) e professor da Universidade de São Paulo (USP).

O CEM é um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão da Fapesp com sedes na USP e no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

Os números estimados ultrapassam os registrados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como favelas e comunidades urbanas, que aponta 2,9 milhões de habitantes em pouco menos de 1 milhão de domicílios, mas a comparação com outros censos indica uma lenta convergência entre as estimativas. São considerados assentamentos precários as áreas caracterizadas como favelas e loteamentos clandestinos e irregulares, estimados a partir de métodos estatísticos.

A imagem mostra uma vista panorâmica de uma comunidade urbana, com uma densa concentração de casas de tijolos e telhados de metal. Ao fundo, há prédios altos e modernos, contrastando com a arquitetura simples das casas. O céu está parcialmente nublado, e a cena reflete uma mistura de áreas de habitação precária e desenvolvimento urbano.
Favela de Paraisópolis, na capital paulista - Bruno Santos - 17.jul.25/Folhapress

O estudo também destaca a persistência de fortes desigualdades, expressas, por exemplo, na diferença entre os rendimentos médios, que chegam a quase R$ 5 mil nas áreas não precárias, contra cerca de R$ 1.700 nas áreas precárias. São Paulo, Guarulhos, São Bernardo, Mauá, Osasco, Itaquaquecetuba, Santo André e Diadema são os municípios que concentram os maiores números absolutos em termos de população residente nessas áreas. Este e os demais resultados da pesquisa são apresentados e discutidos por Marques na 22ª Nota Técnica Políticas Públicas, Cidades e Desigualdades do CEM "Estimando e caracterizando a precariedade urbana e habitacional na São Paulo de 2022".

O estudo mostra uma continuidade do processo de favelização, porque nessas áreas há uma taxa de crescimento populacional mais elevada do que nas demais regiões da região Metropolitana de São Paulo. Porém, não há uma explosão do fenômeno, já que o aumento da população em regiões precárias foi de 0,86% ao ano entre os Censos Demográficos do IBGE de 2010 e 2022, contra 0,74% ao ano para o conjunto da população. Marques aponta ainda que a taxa de crescimento do número de domicílios é superior à da população nas áreas precárias, indicando desadensamento domiciliar, com uma redução do número de habitantes por residência, seguindo o mesmo padrão no conjunto da área metropolitana.

A metodologia utilizada no estudo foi desenvolvida pelo CEM em pesquisas anteriores, de 2008 e 2013, utilizando análises estatísticas e geoprocessamento sobre dados dos setores censitários e da pesquisa urbanística do entorno do Censo Demográfico 2022 do IBGE, assim como interpretação visual de imagens de satélite. Apesar de apresentar algum nível de detalhamento, a pesquisa não é capaz de estimar números e indicadores de assentamentos específicos, mas apenas para escalas agregadas.

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Quanto aos aspectos qualitativos das regiões precárias, que englobam a caracterização social e urbano-habitacional, nota-se a permanência de intensas desigualdades e piores condições de vida nessas áreas em relação ao restante do território metropolitano.

Graus de precariedade

"De forma geral, é possível dizer que as áreas de precariedade alojam uma população muito mais pobre, mais jovem, menos idosa, mais preta e parda e com mais chefias muito jovens, femininas e pretas e pardas, além de ter taxa de analfabetismo adulto mais alta", aponta o diretor do CEM.

Apesar dessa visão geral, as regiões de precariedade incluem diversidade significativa dentro de seus territórios. Há grande variabilidade em termos de densidade populacional e acesso a infraestruturas entre assentamentos, ou mesmo em seu interior. A pesquisa feita por Marques consegue quantificar e mapear essa diversidade a partir de análise de agrupamentos.

Segundo o pesquisador, as principais dimensões da heterogeneidade das áreas precárias estão especialmente associadas à estrutura física dos assentamentos e ao acesso a serviços e infraestruturas, e não às características sociais dos moradores, como renda, idade e escolaridade.

Para entender melhor e mapear tal heterogeneidade, Marques propôs uma divisão por níveis de precariedade, definindo quatro grupos de acordo com a densidade habitacional, a disponibilidade de serviços de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto, coleta de lixo, infraestrutura viária (pavimentação, bueiros, iluminação, calçadas) e a presença de árvores. Os indicadores gerados mostram que a precariedade mais intensa se concentra em cerca de um quinto dos assentamentos, assim como a densidade habitacional excessiva.

O Grupo 1 constitui as áreas que são fronteiras de expansão, com densidades mais baixas e serviços precariamente disponíveis. O Grupo 2 apresenta densidade populacional média-baixa, enquanto o 3 tem densidade média e o 4 corresponde a áreas superdensas e consolidadas. O acesso a alguns serviços aumenta gradativamente entre o segundo e o quarto grupo quanto a água, esgoto, pavimentação e acesso apenas de carro. O acesso ou disponibilidade piora gradualmente no caso de iluminação, bueiros, calçadas e arborização.

"No conjunto da metrópole, a incidência dos tipos de setores precários é relativamente equânime – 19% no primeiro tipo, 32% no segundo, 35% no terceiro e 14% no último", detalha. Os municípios maiores –São Paulo, Santo André, São Bernardo e Mauá– seguem aproximadamente essas mesmas distribuições, tendo, portanto, a maior parte de setores precários nos Grupos 2 e 3. Guarulhos, por outro lado, concentra mais assentamentos do primeiro tipo, de expansão urbana, Osasco do terceiro e Diadema do último tipo.

O mapeamento dos grupos revela a distribuição espacial desses tipos na região Metropolitana. As regiões sudoeste e sudeste, que englobam parte da zona sul de São Paulo, Osasco, Taboão da Serra e ABC, incluem as duas maiores favelas da capital paulista –Paraisópolis e Heliópolis, exemplos do quão heterogêneos, internamente, são os assentamentos precários. Ambas apresentam especial concentração dos Grupos 3, de densidade média, e 4, superdensa. Nota-se, ainda, maior incidência dos tipos intermediários ao sul do Jardim Ângela e no extremo sul de Cidade Dutra, entre as represas. As regiões Leste e Norte da região Metropolitana também apresentam heterogeneidade, mas maior presença relativa dos grupos de menor densidade.

A heterogeneidade, portanto, combina o caráter periférico com o município em que se localiza e região na macrometrópole. "É provável que essa heterogeneidade decorra dos processos de produção dos espaços das várias regiões da metrópole, incluindo os processos localizados de favelização e os programas municipais de urbanização de favelas", aponta Marques. "Apenas estudos de corte mais localizado poderão confirmar essa hipótese", conclui.

A pesquisa pode ser lida em nota técnica publicada pelo CEM.

Ruy Castro - Fardas em salas de aula, FSP

 O governador de um importante estado quer transformar 728 das 3.400 unidades de sua rede escolar em "escolas cívico-militares". Com seu salivante servilismo a certos poderosos, sugere plantar homens fardados em sala de aula para aplicar conceitos dúbios como "mediação de conflitos, desenvolvimento de atividades preventivas e promoção de valores como respeito, disciplina e responsabilidade".

É a volta da velha Educação Moral e Cívica, matéria de estimação da ditadura, imposta em 1969 por Costa e Silva e só revogada em 1993, por Itamar Franco. A EMC constava de "aperfeiçoamento do caráter e da moral do aluno", o "culto à pátria e aos seus símbolos, tradições e instituições" e a mesma "promoção de respeito, disciplina e responsabilidade". Se isso lhe soa como "Deus, pátria e família", acenda uma vela para Mussolini e outra para Bolsonaro.

Currículos cívico-militares se destinam a educar civis sobre heróis militares, como o duque de Caxias. É justo. Mas seria mais justo se os das escolas militares também educassem seus alunos sobre heróis civis, como Joaquim Nabuco. Afinal, se a diplomacia é a guerra por outros meios, por que Nabuco não seria tão importante para a história do Brasil quanto Caxias? Mas quantos aspirantes ouvem falar de Nabuco no Colégio Militar?

E quem garante que a visão militar da história seja tão objetiva quanto a dos paisanos? Não faltam textos nas nossas universidades sobre a identificação do ditador Getulio Vargas com os regimes totalitários da Europa na 2ª Guerra e sua aproximação com a Alemanha nazista, antes de se decidir pela adesão aos Aliados. Haverá textos equivalentes nas escolas militares quanto à convivência ainda mais íntima de figuras como os generais Eurico Gaspar Dutra, ministro da Guerra de Getulio, e Pedro Aurélio de Goes Monteiro, seu chefe de Estado Maior, com a mesma Alemanha nazista?

O dito governador deve ter sido dispensado do serviço militar por ter pé chato. Agora quer obrigar os garotos de seu estado a marchar.

Joaquim Nabuco, em 1885, quando foi eleito novamente deputado por Pernambuco. Crédito: Acervo Fundação Joaquim Nabuco
Joaquim Nabuco em 1885, eleito deputado por Pernambuco - Fundação Joaquim Nabuco

As referências paulistanas de Antônio Ermírio de Moraes, FSP

 Vicente Vilardaga

São Paulo

Sem segurança privada e circulando em carros usados, o engenheiro e empresário Antônio Ermírio de Moraes (1928-2014) percorria São Paulo como um cidadão comum sem preocupação em parecer o bilionário que era. Passou décadas dirigindo até o Centro, onde então ficava a sede de sua empresa, a Votorantim. Localizava-se num prédio histórico, do antigo hotel Esplanada, na praça Ramos de Azevedo.

Ermírio nasceu e cresceu em São Paulo, onde estudou no colégio Rio Branco, um dos mais tradicionais da cidade. Casou-se em 1953 com Maria Regina e teve nove filhos. Foi um gigante da indústria brasileira, mas jamais se deixou levar pela arrogância. Tratava as pessoas com cordialidade e levava uma vida relativamente simples. Nunca se colocou numa redoma. Amava a cidade e usufruía dela.

Retrato do empresário Antônio Ermírio: eficiência nos negócios e preocupações humanitárias - Paulo Giandalia/Folhapress

O empresário vestia-se de maneira despojada e gostava de caminhar despreocupadamente. Nas suas andanças entrava em igrejas vazias onde encontrava paz no isolamento. Era um homem profundamente religioso, que doou um terreno para o padre Marcelo Rossi erguer seu santuário em Santo Amaro, na região sul.

Quando questionado por andar com tranquilidade pelas ruas ou dispensar o trabalho de vigilantes na sua rotina diária, dizia que a "minha segurança é Deus".

Como conta o professor de Economia da USP José Pastore, autor da biografia "Antônio Ermírio de Moraes – Memórias de um Diário Confidencial" (ed. Planeta), o empresário guiou seu próprio carro a vida toda sem ostentação. Certa vez trocou uma Caravan por um Santana usado por considerá-lo mais simples e econômico.

A imagem mostra um edifício de estilo arquitetônico clássico em São Paulo, com uma fachada elaborada e janelas em destaque. À frente do edifício, há uma rua larga com várias pessoas caminhando. À esquerda, pode-se ver uma construção adjacente com detalhes arquitetônicos semelhantes. O céu está nublado e há algumas palmeiras e árvores ao redor, além de placas de sinalização visíveis.
Antigo Hotel Esplanada, hoje edifício Ermínio de Moraes: erguido em 1923, era sede da Votorantim - Inês Bonduki/Folhapress

Um dos lugares de referência do empresário, além do antigo hotel Esplanada, era o hospital Beneficência Portuguesa, que presidiu por quase 40 anos. Tinha uma rotina rígida e era dedicado às causas humanitárias.

Segundo Pastore, ele chegava pontualmente ao seu escritório às 7h, mas antes passava meia hora na Beneficência, para onde voltava depois de deixar o trabalho na Votorantim, às 19h. Ficava mais duas horas cuidando de assuntos da administração do hospital. A mesma determinação que tinha para expandir seus negócios, mostrava para cuidar dos necessitados.

Pastore diz que fazia parte da sua rotina diária passar 30 ou 40 minutos nas enfermarias da Beneficência para conversar com os doentes, transmitir seu carinho e frequentar a capela. Nos fins de semana fazia o mesmo. À tarde, costumava levar uma orquestra para animá-los. Também participava do conselho curador e da rede voluntária do Hospital A.C. Camargo e era um dos maiores doadores da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente).

Entrada da Beneficência Portuguesa: empresário dedicava várias horas do seu dia ao hospital - Luiz Carlos Murauskas/Folhapress

Sua forte atuação social o motivou, em 1986, a lançar-se candidato ao Governo do Estado de São Paulo pela União Liberal Trabalhista Social (PTB, PL e PSC). Foi, porém, derrotado por Orestes Quércia (PMDB),

Outro lugar que eventualmente frequentava era a Academia Paulista de Letras, no largo do Arouche, de onde se tornou membro em 1999, ocupando a cadeira 23. Escreveu três peças teatrais, tratando de problemas brasileiros: "Brasil S.A.", sobre o mundo empresarial, "SOS Brasil", sobre saúde pública, e "Acorda Brasil", sobre educação. Durante 17 anos, escreveu uma coluna dominical na Folha.

Mais um traço distintivo de Antônio Ermírio era ser corintiano. Foi conselheiro vitalício do Corinthians. Há um busto em sua homenagem no parque São Jorge, antigo estádio do clube.