O Nepal é conhecido pelo Everest, pelo Himalaia e por ser uma potência espiritual. No entanto, recentemente virou o epicentro dos chamados "protestos da geração Z". Em poucos dias de setembro, movimentos online derrubaram o governo do país. Além disso, incendiaram prédios públicos e provocaram caos — 72 pessoas morreram e mais de mil ficaram feridas. Após dias de violência, uma nova primeira-ministra foi escolhida online pelo Discord. Sua missão agora é conduzir o governo de transição até eleições em março de 2026.
O que aconteceu no Nepal pode ser visto como um conto de advertência. A geração Z vinha fazendo vídeos sobre os "Nepo Kids": filhos e parentes de autoridades beneficiados por nepotismo. Vários desses vídeos viralizaram no TikTok ao denunciar o "círculo fechado de famílias que entregam cargos e privilégios umas às outras", como descreveu o Financial Times.
Essa viralização incomodou. No dia 17 de agosto de 2025, a Suprema Corte do Nepal decidiu que "mídias sociais domésticas e estrangeiras deveriam se registrar obrigatoriamente com o governo". A finalidade do registro era "monitorar conteúdo indesejado: notícias falsas que possam prejudicar o direito à informação correta, obstruir processos judiciais e afetar a credibilidade dos tribunais". Até então, a internet era livre no país, que conta com uma das maiores taxas de usuários jovens no sul da Ásia.
Entre 18 e 31 de agosto o Ministério das Comunicações tentou impor o registro obrigatório, sem sucesso. No dia 4 de setembro o governo anunciou o bloqueio de 26 plataformas, dentre elas o TikTok, por descumprimento da ordem da Corte Suprema. A justificativa foi: "a necessidade de conter crimes cibernéticos e discurso de ódio".
No dia 6 manifestantes tomaram as ruas, organizando-se pelo Discord em servidor chamado "Youths Against Corruption". As três pautas adotadas foram: o fim do nepotismo, o desbloqueio das redes e a renúncia do primeiro-ministro. O símbolo dos protestos foi a bandeira-pirata do desenho animado japonês One Piece.
No dia 8 de setembro a polícia abriu fogo contra os manifestantes em Kathmandu, matando 20 pessoas. Vídeos da violência foram compartilhados nas redes usando VPNs. Isso aumentou o número de manifestantes e o caos. Prédios públicos foram incendiados, incluindo a sede do governo, o parlamento e o prédio da Suprema Corte.
No dia 9 pela manhã o primeiro-ministro renunciou. No Discord foi organizada uma enquete para escolher quem o sucederia. Dentre os candidatos: um rapper-engenheiro, um youtuber-advogado e uma ex-chefe da Suprema Corte, que já havia votado a favor das causas defendidas e se juntou aos manifestantes no dia 7. Ela foi escolhida.
Tudo isso dá a impressão de que, em qualquer lugar do mundo, vivemos a um vídeo de distância de uma comoção social. Tivemos uma amostra disso no Brasil com o vídeo do influenciador Felca, que provocou uma mudança legislativa imediata para proteger crianças e adolescentes online (causa essencial, diga-se).
Depois do Nepal, protestos similares da geração Z, com a mesma dinâmica digital, começaram a ocorrer em Madagascar, Marrocos, Paraguai (com muitos feridos e 30 pessoas detidas), Peru, Timor-Leste e Togo. Em todos, o combate ao nepotismo é uma bandeira comum. Ainda bem que não temos isso no Brasil.
READER
Já era – Ignorar politicamente a geração Z
Já é – Média de idade dos governantes globais de 62 anos
Já vem – Geração Z chegando ao poder, mais cedo ou mais tarde

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