Há uma ideia equivocada, mas muito disseminada, de que a educação pública brasileira está estagnada. O Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) permite vários recortes de análise —e um dos piores é a média nacional. Numa comparação de 2023 (ano da realização da última avaliação) com 2019 (último levantamento pré-pandemia), o resultado Brasil, rede pública, numa escala de 0 a 10, foi de queda de 0,11 no ensino fundamental 1; 0,12 no ensino fundamental 2; e 0,09 no ensino médio. A verdade é que os estados estão remando em diferentes direções: enquanto alguns avançam, outros retrocedem.
Comparando cada estado consigo mesmo no ensino médio, as maiores quedas na rede pública são do Distrito Federal (-0,35), Rio de Janeiro (-0,34), Mato Grosso do Sul (-0,32), Minas Gerais (-0,20) e São Paulo empatado com Espírito Santo (-0,19). O Sudeste todo caiu, região mais rica e populosa do país. De modo inverso, estados mais pobres apontam o vetor para cima, notadamente Pará (+0,38), Amapá (+0,20), Amazonas (+0,17) e Piauí (+0,14).
Na comparação entre estados, os maiores patamares de aprendizado são Goiás, Paraná e Espírito Santo, e os menores são Bahia, Maranhão e Rio de Janeiro.
Ao analisarmos o mesmo período nas redes públicas municipais, ensino fundamental 1, verificamos 2.893 municípios com retrocesso na aprendizagem e 2.158 com avanço. Entre as capitais, as maiores quedas no ensino fundamental 1 são de Teresina (-0,95), Belém (-0,58) e São Paulo (-0,52), e os maiores avanços de Goiânia (+0,53), Vitória (+0,47) e Macapá (+0,19).
Os leitores que chegaram até aqui depois desse derramamento de dados já devem ter percebido que a estagnação geral é uma ilusão. Ao colocarmos os holofotes nos avanços e nos retrocessos incentivamos a adoção de melhores políticas públicas e provocamos algum constrangimento e mudança de rumo.
O que tem em comum os que avançaram? De forma geral: 1 - prioridade política, com governadores e prefeitos engajados no dia a dia da Secretaria de Educação e das escolas; 2 - foco nas políticas com robusta evidência de retorno de resultados, em especial avaliação constante da aprendizagem dos alunos com consequência na formação de professores, na gestão das escolas e órgãos administrativos, expansão da educação integral, supressão de políticas e programas que distraem ou são diversionistas; 3 - excelência na implementação, pois alocar os recursos nas políticas certas, mas sem fazê-los chegar a cada uma das salas de aula, é perder o jogo no segundo tempo; 4 - efeitos da pandemia não foram jogados para debaixo do tapete, e a gestão educacional foi direcionada para recompor o aprendizado, tornando a política de recuperação ao longo do ano mais efetiva.
Nenhum dos fatores acima deveria ser uma surpresa (pela obviedade que expressam) e só ampliam o estarrecimento diante dos retrocessos.
Deixo aqui uma proposta para os Legislativos dos entes da Federação que apresentaram piora dos resultados. Uma das atribuições constitucionais das Câmaras Municipais, Assembleias Estaduais e do Congresso Nacional é, ao lado de legislar, fiscalizar o Poder Executivo. As lideranças políticas eleitas dos estados e municípios deveriam ser chamadas às Casas legislativas para explicarem o retrocesso ocorrido.
No mínimo, devem explicações à população que os elegeu; afinal, depois de anos de gestão e recursos, não deveria haver retrocesso. Mesmo que a explicação seja plausível e aceitável, a transparência e o dever de prestação de contas deveriam ser uma prática, ainda mais em uma área como a educação.
O governo federal tem muita responsabilidade também. Apesar de não ser o responsável direto pela gestão das escolas de educação básica, é dever da União assegurar a progressividade e redução na desigualdade dos resultados educacionais.
Ainda espero que o retrocesso provoque muito mais indignação e que os brasileiros entendam que a má qualidade da educação pública é uma cruel forma de segregação e de atraso para a nação.