terça-feira, 21 de novembro de 2023

Conheça o supertatuzão que vai perfurar extensão da linha 2-verde do metrô de SP, FSP

 Fábio Pescarini

SÃO PAULO

O tatuzão responsável pela extensão da linha 2-verde do metrô foi ligado nesta terça-feira (21). Levado em partes para São Paulo, o equipamento começou a ser montado em agosto e fará escavações a profundidades entre 30 metros e 50 metros, partirá da região da Vila Formosa em direção à Vila Prudente.

Fabricada na China e batizada como Cora Coralina, em homenagem à poetisa goiana —é tradição colocar nome de mulheres históricas em tuneladoras—, a máquina custou 40 milhões de euros (quase R$ 210 milhões) ao consórcio responsável pela obra, segundo o Metrô.

Tatuzão que vai escavar a extensão da linha 2-verde do metrô com as bandeiras do São Paulo e do Brasil na roda de corte
Tatuzão que vai escavar a extensão da linha 2-verde do metrô, na zona leste, ainda na China, antes de ser desmontado e enviado ao Brasil - Divulgação

Com 2.700 toneladas de peso e 98 metros de comprimento, o supertatuzão chegou desmontado ao porto de Santos no início de maio e começou a ser transportado para São Paulo em junho. Ao todo, a previsão era de 76 viagens até agosto, com 63 peças soltas e 13 contêineres.

Uma carreta com 50 metros de comprimento, e puxada por dois cavalos mecânicos, foi responsável por levar uma única peça, a parte central da roda de corte da tuneladora, até o canteiro de obras na Vila Carrão, na zona leste paulistana.

Chamada de MainDrive e com cerca de 190 toneladas de peso, a peça foi para o complexo Rapadura, na Vila Carrão —o enorme veículo saiu do porto na Baixada Santista no dia 6 de junho fez duas paradas, uma no rodoanel e outra em Mauá, de onde partiu para a zona leste.

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A roda de corte, a maior já utilizada no Brasil para escavações, de acordo com o Metrô, tem 11,6 metros de diâmetro. Como comparação, as usadas pela companhia estatal nas perfurações das linhas 4-amarela e 5-lilás mediam 9,41 metros e 10,58 metros de diâmetro, respectivamente.

O tatuzão da linha 2-verde é menor em tamanho que a tuneladora que está escavando a linha 6-laranja do metrô, desde dezembro de 2021 —soma 109 metros de comprimento—, mas tem no total 700 toneladas a mais e um metro a mais de diâmetro na roda de corte.

O equipamento vai escavar e construir cerca de 7,5 km de túneis para ampliação da linha 2-verde, entre a Vila Prudente e a Penha, na zona leste de São Paulo.

Ele ainda será responsável pela instalação dos anéis de concreto para revestimento dos túneis, que ficam praticamente prontos conforme o deslocamento da máquina.

O supertatuzão também faz a remoção de terra escavada —segundo o Metrô, com operação 24 horas por dia, o equipamento consegue movimentar 154 m³ de terra por hora.

A tuneladora aumenta gradualmente a velocidade de escavação, variando de acordo com a rigidez do maciço em cada trecho. A expectativa é que escave, em média, de 10 metros a 15 metros por dia.

Ao todo, 50 pessoas deverão trabalhar na operação em cada um dos três turnos diários.

A máquina vai perfurar de acordo com definição de equipamentos topográficos e sensores que ficam na frente da tuneladora.

O tatuzão foi montado no canteiro de obras da Vila Carrão, onde funcionará uma base de manutenção, estacionamento de trens e um poço de ventilação e saída de emergência.

A primeira etapa da montagem da máquina ocorre na superfície, a partir da chegada das peças.

No fim da construção da linha, o Metrô diz que a máquina poderá ser realocada para novas obras de expansão, o que é raro, ou desmontada para uso das peças metálicas em outros fins, como ocorreu com a máquina utilizada nas linhas 4-amarela e 5-lilás.

O tatuzão seguirá da região da Vila Formosa no sentido Vila Prudente. A máquina passará pelas estações Vila Formosa, Anália Franco, Santa Clara e Orfanato.

Com cerca de cerca de 8,5 km, a extensão terá oito estações, com previsão de inauguração em 2026 —segundo o governo estadual, 40% das obras estão prontas.

A estimativa é que 300 mil pessoas sejam beneficiadas por dia com a ampliação da linha. O Metrô estima que deve melhorar a distribuição de passageiros nas linhas 1-azul e 3-vermelha após a inauguração da extensão.

Com 22 estações, a linha será a maior do metrô paulistano.

Na cidade de São Paulo há atualmente duas tuneladoras em operação, para construção da linha 6-laranja, que vai ligar a Brasilândia, na zona norte, à região central da capital.

STF conversou com cúpula militar antes de dobrar aposta em tensão com Bolsonaro, mostra livro, FSP

 Uirá Machado

SÃO PAULO

Existe um Judiciário que se une e outro que se fragmenta; um que se destaca em uma história heroica de resistência, outro que protagoniza uma trama infame de regalias; um que defende a democracia e combate a pandemia, outro que abusa das leis e fragiliza o Estado de Direito.

O primeiro está retratado no recém-lançado "O Tribunal – Como o Supremo se uniu ante a ameaça autoritária" (Companhia das Letras), de Felipe Recondo e Luiz Weber.

O segundo aparece no recém-publicado "O Discreto Charme da Magistocracia – Vícios e disfarces do Judiciário brasileiro" (Todavia), de Conrado Hübner Mendes.

Volume da Constituição Federal queimado na parte de cima
Entre os objetos do acervo do STF que foram destruídos ou danificados durante os atos golpistas de 8 de janeiro, uma cópia da Constituição Federal - Gabriela Biló/Folhapress - 1º.fev.2023

Não que inexistam críticas num caso e elogios no outro. Recondo e Weber, com foco no STF (Supremo Tribunal Federal), apontam problemas tanto nas decisões como nas atitudes dos ministros, enquanto Conrado lembra que o sistema de Justiça não se faz apenas de defeitos.

Mas, no recorte de "O Tribunal", o que se procura é narrar a trajetória de uma corte que abandonou muitas de suas divergências internas para enfrentar a ameaça externa representada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).

Os jornalistas Recondo e Weber baseiam-se em centenas de entrevistas feitas ao longo dos últimos cinco anos para revelar bastidores de eventos decisivos no período, como os julgamentos na pandemia da Covid, a instauração do inquérito das fake news e a reação aos ataques de 8 de janeiro.

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"Quando Bolsonaro foi eleito, nós percebemos que havia algo a ser acompanhado: como o tribunal lidaria com aquele presidente que prometia uma relação [com o STF] muito diferente da que os outros estabeleceram?", diz Recondo.

A resposta demorou a ganhar contornos uniformes. A princípio, prevalecia no Supremo a percepção de que Bolsonaro seria neutralizado pela ação das instituições, ou então que ele não levaria adiante suas promessas de interferir no Judiciário.

Quem parece ter levado essa posição ao paroxismo foi Luiz Fux, presidente do STF de 2020 a 2022. Em "O Tribunal", fica-se sabendo que ele via um problema somente no entorno de Bolsonaro, que "ouve as pessoas erradas e acaba chutando o balde".

Mas nem todos acreditavam nisso. Segundo os autores apuraram com pessoas do convívio de Alexandre de Moraes, o atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) fez a seguinte avaliação em conversas privadas: "Os ministros achavam Bolsonaro burro, e eu também, mas nunca o subestimei".

Em junho de 2020, a situação tinha mudado. À exceção de Fux, os demais ministros já consideravam Bolsonaro uma ameaça concreta, e vários deles liam com atenção livros sobre o enfraquecimento da democracia mundo afora e a nova configuração dos golpes de Estado, que dispensam o recurso a tanques nas ruas.

Naquele mês, o STF deu uma clara demonstração de unidade ao aprovar, por 10 a 1 (voto vencido de Marco Aurélio), o polêmico inquérito 4.781, voltado à investigação de fake news e ameaças à corte e seus integrantes.

Daí em diante, sobretudo nas ações sobre políticas de combate ao coronavírus, o Supremo se apresentou como um bloco coeso, com decisões que contrariavam Bolsonaro.

Em paralelo, ministros do STF mantiveram contatos frequentes com a cúpula militar –em particular, com o Alto Comando do Exército— para sondar o ânimo da caserna diante de um golpe.

"O Tribunal" indica que foi essa aproximação que deu aos ministros a força necessária para dobrar a aposta diante das situações mais tensas, pois os ministros sabiam que os generais não apoiariam uma aventura tresloucada.

Edson Fachin, por exemplo, após assumir a presidência do TSE, em dezembro de 2021, enviou emissários para saber a disposição dos comandantes das regiões e descobriu que nenhum deles partilhava dos planos contra as urnas eletrônicas.

Percebendo que pisava em terreno seguro, Fachin decidiu, em maio de 2022, deixar de lado a diplomacia com o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, parou de responder perguntas impertinentes sobre as urnas e afirmou que a eleição era assunto das forças desarmadas.

Mais tarde, Moraes, já na presidência do TSE, tampouco mediu palavras em conversa privada com o ministro da Defesa. Diante de questionamentos de Nogueira sobre possibilidade de ser instalado programa espião em todas as urnas, Moraes rebateu: "Ô, Paulo Sérgio, pode ser que caia um meteoro e destrua a Terra. Tenha a santa paciência", conta o livro.

Essas gestões, contudo, não levaram o STF a antever o duro ataque de 8 de janeiro, e "O Tribunal" mostra como a então presidente Rosa Weber fez questão de garantir uma reação institucional unitária de uma corte que, poucos anos antes, atuava quase sempre como 11 ilhas independentes.

E é justamente "Onze ilhas" o título de um artigo que Conrado Hübner Mendes publicou em 2010 e que agora abre seu novo livro, uma coletânea de 88 textos veiculados na imprensa, sobretudo na revista Época e na Folhajornal do qual é colunista desde 2019.

"O conjunto oferece um repertório descritivo e analítico bastante didático para problematizar o Poder Judiciário, os juízes, os ministros. Para pensar quais são os problemas e os fatores que precisamos debater com mais profundidade para um aperfeiçoamento", diz Conrado.

O livro destaca temas como falta de harmonia no STF e ausência de argumentos nas decisões, mas, principalmente, o mundaréu de regalias a que os juízes têm direito.

Daí o neologismo "magistocracia", que mistura "magistrado" e "aristocracia", evocando a ideia de uma casta da toga que, segundo o autor, "erra, protege o erro e resiste à autocorreção", contribuindo para "sérias comorbidades da democracia brasileira".

Conrado deixa claro que não se refere somente a juízes; ele emprega o termo em sentido amplo, incluindo procuradores, promotores e advogados públicos.

Para o autor, que é professor de direito constitucional da USP, o momento é oportuno para a publicação do volume, não só porque ele sentiu maturidade dos argumentos que foram refinados ao longo dos anos mas também porque o país voltou a respirar normalidade política.

"Esse debate não pode sair da pauta", diz.

O TRIBUNAL - COMO O SUPREMO SE UNIU ANTE A AMEAÇA AUTORITÁRIA

O DISCRETO CHARME DA MAGISTOCRACIA - VÍCIOS E DISFARCES DO JUDICIÁRIO BRASILEIRO