segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

ESTADÃO / POLÍTICA Modelo de venda da Sabesp deve seguir ‘lógica da Eletrobras’, diz secretária de Infraestrutura de SP, oesp

 


No topo da lista de desestatizações prometidas pelo governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, a Sabesp deve passar por um processo de venda de ativos similar ao modelo ocorrido com a Eletrobras, em que o Estado perde o controle acionário da empresa. Segundo a secretária de Infraestrutura, Meio Ambiente e Logística de São Paulo, Natália Resende, uma proposta estudada pela nova administração é manter menor participação na companhia em um desenho que daria ao governo a palavra final sobre investimentos prioritários da empresa.

A modelagem, segundo ela, permite que municípios que não possuem abastecimento de água e esgoto não sejam preteridos no futuro. Natália também defende que a desestatização não acarreta no aumento da tarifa. “O que atrai o privado é o projeto como um todo. O que a gente está pensando aqui é como melhorar o serviço, com uma tarifa mais módica e atingindo esses locais”, disse ao Estadão.

Natália minimizou críticas de que a agenda ambiental paulista estaria suprimida ao ser inclusa sob o mesmo guarda-chuva de áreas relacionadas a obras públicas, por exemplo. A nova “supersecretaria” englobou a maior companhia de São Paulo, a Sabesp, que distribui água e esgoto, bem como a Emae, de energia, a Cetesb, que fiscaliza e emite licenças ambientais, o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) e o Departamento de Estradas e Rodagem (DER).

Luiz Felipe Pondé - Por outros mares, fsp

 

Grande parte das casas editoriais no Brasil são aparelhos ideológicos. Existem as chiques de esquerda que só publicam os golden boys e as golden girls. Existem aquelas que só publicam mulheres ou outras identidades militantes.

Existem as que recusam figuras dúbias do ponto de vista da pureza conservadora. Existem as business-oriented que buscam apenas publicar quem vende, mesmo que a figura seja totalmente inconsistente —basta que ela tenha um bom engajamento nas redes. Existem, claro, exceções.

Esse mapa impede que autores importantes sejam publicados aqui. Há um verdadeiro ponto cego editorial.

A ilustração figurativa de Ricardo Cammarota foi executada em técnica manual com caneta nanquim, de ponta bem fina, em traços com rachura que definem as formas com sombras, sobre papel branco.  A ilustração, na horizontal (proporção 17,5cm x 9,5cm) apresenta vários elementos dispostos, formando uma composição sem uma narrativa aparente ou sequência lógica. Da esquerda para à direita, os elementos são: Duas grandes mãos segurando um aparelho celular como se estivesse clicando uma foto. Na imagem do celular há um corte reto, interferido, ao centro, por uma imagem de um corpo com saia fantasia, peitos femininos nus, braços cortados e no lugar da cabeça há tentáculos de polvo. Acima, a imagem de um grande peixe que se assemelha a um dragão, sobre ondas de água. Ao lado, uma garrafa de vidro com rolha e um papel enrolado dentro. Abaixo, a imagem de um personagem, deitado como se estivesse flutuando com a cabeça pra trás e braços abertos caídos. Pequenas nuvens, ao fundo. À direita no canto superior da ilustração, há um livro aberto de folhas voltadas para baixo onde aparece umas purpurinas que caem sobre um personagem com 6 peitos nus e parte do corpo formado por cabeças de animais.
Ilustração - Ricardo Cammarota

Um dos autores mais lidos na França hoje é o visconde Olivier de Kersauson de Pennendreff, marinheiro e velejador. Politicamente, ele é inclassificável, o que já atrapalha diante da miopia que a hiperpolitização do mundo nos causa. Apesar de muito lido, Kersauson não tem nada a ver com literatura motivacional, autoajuda, coaching ou qualquer picaretagem do tipo "foguete não anda de ré".

O autor carrega em si a tradição francesa que reúne figuras como Pascal, Montaigne, Bossuet, La Bruyère, La Rochefoucauld —todos do século 16 ou 17— e mesmo Cioran, do século 20.

Trata-se da tradição moralista francesa, caracterizada pela análise fina da natureza humana, essa mesma que dizem que não existe, apesar de ela se espraiar pela psicologia, política, sociologia, para quem não tem o hábito de mentir. Nosso cotidiano de trabalho, familiar, amoroso, é afogado em natureza humana.

PUBLICIDADE

Por ser um autor contemporâneo –Kersauson tem hoje 78 anos– sua escrita traz elementos absolutamente atuais. O senso histórico nele é agudo.

Não se trata de um nostálgico, apesar de reconhecer que escolheu uma profissão arcaica —marinheiro– e ter vivido mais tempo entre as estrelas e o mar. Reconhece que aos 78 anos já se trata de uma pessoa irrelevante para o mundo, que, segundo ele, deve ser tocado por pessoas de 20 anos, as únicas que transitam pelo circo das aparências eletrônicas às quais a vida foi reduzida –termos dele.

Como todo moralista, escreve textos curtos e de fácil entendimento. O que importa, o que ele chama de "potência da verdade", está no detalhe. Aliás, o título do seu último livro, lançado agora em janeiro, é "Veritas tantam potentiam habet ut non subverti possit" –em latim mesmo– que significa "a verdade tem uma tal potência que ela não pode ser aniquilada". O autor é conhecido por títulos peculiares.

Kersauson percebe como o mundo se tornou mediocremente igual –palavra, que aliás, ele detesta. Viajar, um dos seus temas predileto, afinal, ele sempre foi um marinheiro, virou algo banal.

Em Palermo, pede-se hamburguer, em Paris, pizza. Nada mais é diferente, apesar de toda a masturbação mental sobre "a diferença". Traço este que é fruto do sucesso da estupidez capitalista.

Aliás, a mania das identidades é fruto do fato de que as pessoas são um nada. Nada fazem de significativo. A militância pelas identidades não é signo de "progresso", mas de miséria psicológica e social.

O paladar das crianças foi destruído porque não existe mais cozinha materna. Apesar de todo o blábláblá sobre maternidade, a função está em extinção porque é considerada menor.

Desde 1968, ninguém mais quer educar criança nenhuma. Educar uma criança, ao contrário do que as diatribes modernas pregam, é ensiná-los a comer à mesa, respeitar os mais velhos, não interromper quando outras pessoas estão falando, tomar banho, arrumar suas coisas. Desde 1968 impera uma total irresponsabilidade, preguiça e modismos no terreno da educação escolar e familiar.

Kersauson crítica a mística que seus contemporâneos atribuíram a revolução de 1789, que, para ele, revelou sua verdadeira natureza nos massacres perpetrados em nome dela. Quer conhecer a natureza de um revolucionário? Veja como ele se apraz em matar. Com isso, ele derruba toda a mística política dos últimos dois séculos.

Ao final, é a impotência que nos arrasa desde sempre. A verdade fundamental da natureza humana é o terror. E, contra a verdade, não se pode nada.


Meus heróis morreram de overposting, Manuela Cantuária, FSP

 

Quando digo heróis, não me refiro ao arquétipo do semideus com uma espada em punho, e sim aos seres humanos que admiro. Quando digo overposting, é meio que isso mesmo, não tem mistério. Literalmente.

Uma das minhas pessoas favoritas não tem nenhum perfil nas redes sociais. Talvez por isso seja uma das minhas pessoas favoritas: porque não tenho acesso à sua versão virtual desesperada por atenção em uma saga para transformar sua vida em entretenimento barato.

Quando dizem que as redes sociais são tóxicas, sempre lembro daquele slogan da Kodak: "Você aperta o botão, nós fazemos o resto". Sim, as redes sociais são todas pensadinhas para viciar como crack, mas quem aperta o botão somos nós.

Ilustração de uma mão segurando um celular e deste saindo várias fotinhos como se fossem posts de Instagram, por cima de uma nuvem com as cores do logo Instagram: rosa, amarelo, laranja
Ilustração de Silvis para a coluna de Manuela Cantuária de 23.jan.2023 - Silvis

É uma curtição em que ninguém parece estar curtindo de verdade: a pessoa infeliz edita e publica um conteúdo para provar para outra pessoa que está feliz, daí essa outra pessoa se pergunta por que não está tão feliz quanto a pessoa que parece estar feliz mas não está e, se sentindo infeliz, agora também quer mostrar que está feliz mesmo que não esteja e assim por diante.

Recentemente, fiz um detox de posts de amigos e alguns chegaram a me perguntar: "por que você não me curte mais?". Respondi que não era nada pessoal, o que foi a forma mais educada que encontrei de dizer que não vou permitir que a versão virtual dele se coloque no meio da nossa amizade.

Pois quando minha pessoa favorita, sem arroba, chique até dizer chega, pediu meu celular para stalkear nossos amigos em comum, eu já sabia o que ia acontecer.

PUBLICIDADE

Vi o brilho dos seus olhos se esvair quando descobriu que um deles tinha um feed conceito (lê-se: polui o planeta fotografando em 35mm o que há de mais desinteressante com a pretensão de parecer uma pessoa interessante); outro reproduzia trends do Tik Tok (lê-se: sem qualquer pretensão de parecer uma pessoa interessante e/ou com excesso de tempo livre), outro era um lacrador compulsivo que não conseguia postar uma foto de pet sem cunho político; outro, uma metralhadora giratória de selfies que pesava a mão no filtro ao ponto se tornar irreconhecível.

Todos, na verdade, eram irreconhecíveis em relação às suas versões humanas. Talvez porque quando a gente se esforça demais para parecer uma versão melhor de nós mesmos, essa acaba sendo a nossa pior versão.