domingo, 20 de novembro de 2022

O business deve continuar, Ruy Castro FSP

 Em 1960, o telefone tocou na casa da estrelíssima Elizabeth Taylor, o maior nome de Hollywood. Ela estava no banho. Seu marido e valete, o cantor Eddie Fisher, foi atender. "Liz, é Spyros Skouras. Ele quer falar com você." Spyros Skouras era o odiado chefão da Fox. Liz rugiu de volta: "Mande-o se f.... Não falo com cretinos!". Fisher insistiu: "Ele quer te convidar para o papel-título em ‘Cleópatra’." E Liz, com sabão nos olhos e para encerrar o assunto: "Diga que só por 1 milhão de dólares!". Fisher deu o recado e voltou: "Ele disse que está fechado. Você começa amanhã."

Essa história marca o início dos supersalários no cinema. Ninguém até então ganhara US$ 1 milhão para fazer um filme. Aliás, nem perto disso, porque a maioria dos grandes astros ainda vivia sob contrato e salário dos estúdios. Mas Liz, depois de quase 20 anos na MGM, conquistara sua independência e podia pedir quanto quisesse. O que interessa, no entanto, é o seguinte: quanto representa US$ 1 milhão de 1960 em dólares de 2022?

Fui ao Google. Descobri que, nesses 62 anos os EUA tiveram uma inflação acumulada de 906,80%, donde aquele milhão valeria agora US$ 10.067.972, 97. É o que Liz Taylor receberia hoje por "Cleópatra".

Mas as coisas mudaram. Por US$ 10 milhões e quebrados em 2022, Jennifer Lawrence, Julia Roberts e Sandra Bullock nem desligariam a torneira do chuveiro. O piso de cada uma é US$ 25 milhões por filme — e nenhuma delas é, nem chorando, a Elizabeth Taylor de 1960. E os rapazes? Leonardo DiCaprio cobra US$ 30 milhões por filme; Will Smith e Denzel Washington, US$ 40 milhões cada; Dwayne Johnson, US$ 50 milhões; e Daniel Craig acaba de assinar um contrato de US$ 100 milhões. Com o streaming, esses valores dobram.

São números de 2021, conforme as revistas americanas de show business. Sim, o show deve continuar, mas foi o business que disparou.

Livro mostra como ocorrem as grandes transformações sociais, Hélio Schwartsman, FSP

 Você quer colocar uma nova ideia em circulação. Qual a melhor estratégia? Contratar um punhado de influenciadores que somem milhões de seguidores? Até pode ser, desde que sua ideia seja algo bem simples e que não envolva nenhuma espécie de mudança comportamental, tipo propagar uma notícia. Aí, as redes compostas por indivíduos densamente relacionados, capazes de alcançar multidões, provavelmente funcionarão. Mas, se sua ideia exige que as pessoas adotem outras atitudes, aí os influenciadores não serão tão úteis. Na verdade, podem até revelar-se um tiro pela culatra.

"Mudança", de Damon Centola, analisa essa e várias outras questões relativas a redes sociais. E o faz recorrendo à ciência, não a intuições arraigadas, e buscando exemplos em casos reais. O retumbante fracasso do Google Glass, por exemplo, se deve ao fato de que a empresa foi muito eficaz em espalhar notícias sobre o produto usando influenciadores e geeks, mas muito menos em criar um ambiente de validação social para seu uso. O apetrecho foi visto como algo esnobe, indesejável para pessoas comuns.

A ilustração de Annette Schwartsman, publicada na Folha de São Paulo no dia 20 de novembro de 2022, mostra uma sucessão de telas, uma atrás da outra, com a seguinte cena: muitos pneus pegando fogo no asfalto e três homens de costas; o primeiro, de cabelos castanhos, usa uma bandeira do Brasil como capa; o segundo, de cabelos pretos, arrasta um pneu com a mão direita e veste bermuda branca e camiseta da seleção brasileira; o terceiro, careca, usa calças beges, camiseta da seleção e carrega outra bandeira do Brasil.
Ilustração Annette Schwartsman - Annette Schwartsman

Uma das principais lições do livro é que inovações que envolvam mudanças comportamentais só ocorrem depois de terem sido validadas, isto é, normalizadas, por um número crítico de relacionamentos significativos do indivíduo em questão. É claro que já era assim antes da internet. O que as redes sociais fizeram, além de imprimir mais velocidade a esses processos, foi nos permitir investigá-los de perto.

O problema não é tanto a circulação de "fake news", mas de onde elas vêm. Não temos dificuldade em considerar malucos esses indivíduos que cantam o hino para pneus e pedem golpe. Mas, se você vive numa bolha em que todos os contatos em que você confia o inundam com mensagens afirmando que a vitória de Lula destruirá o país e o mundo, então, na sua visão, quem não pede a tal da intervenção federal é que é maluco.

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Se inflação não mirar a meta em 2023, BC vai reagir, diz Campos Neto, FSP


BRASÍLIA e SÃO PAULO

Presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto afirmou nesta sexta-feira (18) que os rumos das contas públicas a partir de 2023 serão essenciais para entender como se dará o trabalho da política monetária no ano que vem —ou seja, em que patamar vai ficar a taxa básica de juros, hoje de 13,75% ao ano..

"Precisamos entender como o fiscal vai se desenvolver", afirmou Campos Neto, durante evento em São Paulo. Ele disse que a incerteza sobre a condução das contas públicas nos próximos meses fez com que o mercado passasse a considerar uma alta de juros no curto prazo.

Até então, o mercado projetava o início da reversão do ciclo de aperto monetário, ou seja, cortes na taxa básica (Selic), entre fevereiro e junho de 2023.

Presidente do BC, Roberto Campos Neto, discursa durante evento do Lide em Nova York, nos Estados Unidos - Vanessa Carvalho - 15.nov.2022/Lide

"Ainda tem algum trabalho a ser feito, segundo as expectativas do mercado", afirmou Campos Neto.
Ele preferiu não ser assertivo sobre qual será a reação do BC no próximo ano, por considerar que ainda há um nível elevado de incerteza sobre qual será a política fiscal adotada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Não posso trabalhar com suposições. Precisamos esperar para ver o que de fato será aprovado", disse o presidente do BC. Mas, se a convergência com o qual a autoridade monetária trabalha para a inflação em direção à meta não ocorrer conforme o esperado, "vamos reagir", afirmou

As previsões de economistas compiladas pelo BC na pesquisa Focus indicavam nesta semana um IPCA de 4,94% em 2023, acima da meta para o ano que vem, que é de 3,25%, com variação aceitável entre 1,75% e 4,75%.

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O presidente do BC disse ainda que a figura da política fiscal no momento pode ser considerada positiva, mas ressaltou que a maior preocupação é que os programas adotados nos últimos meses venham a se tornar permanentes.

Ele afirmou que até aqui o mercado está tendo bastante dificuldade para entender qual será a nova política fiscal do governo nos próximos anos. E que, a depender da nova estrutura da política fiscal, ela poderá interferir na forma como o BC olha o cenário à frente. "É importante ter coordenação da política fiscal e monetária nesse estágio do ciclo."

Campos Neto comentou também sobre o fim do teto de gastos e a reformulação da âncora fiscal, tema debatido pelo governo eleito desde o período eleitoral. "O importante é ter credibilidade no arcabouço fiscal".

"Entendemos que isso deve ser construído de forma a dar credibilidade para investidores de que continuaremos no caminho de convergência da dívida, e isso é o mais importante", continuou.

O presidente do BC afirmou ainda que é preciso atenção com a questão social, à medida que muitas pessoas ainda sofrem os efeitos da pandemia e da alta de alimentos, mas que, por outro lado, também é preciso estar atento às reações do mercado.

A realidade, disse o presidente do BC, é que em cenários de condições econômicas adversas, com inflação elevada e incerteza para as empresas se planejarem, quem mais acaba sofrendo é a população de menor renda.

Ele também voltou a afirmar que alguma melhora da inflação brasileira pôde ser observada ao longo dos últimos meses, mas que ainda "não há razão para celebrar" e que parte da dinâmica recente dos preços veio na esteira de medidas pontuais adotadas pelo governo que seguem indefinidas à frente.

Ao olhar as expectativas de inflação para os próximos anos, o trabalho da política monetária começa a dar alguns resultados, mas "é preciso persistir na estratégia", afirmou Campos Neto, acrescentando que a recuperação recente do mercado de trabalho representou uma "grande surpresa" dentro dos prognósticos do BC.