segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Etanol de milho se torna mais rentável que o de cana, mas ainda tem desafios pela frente, Nova Cana

 O etanol de milho tem ganhado cada vez mais espaço no Brasil – e a tendência é de um crescimento vertiginoso. De acordo com dados da União Nacional do Etanol de Milho (Unem), a produção do biocombustível a partir do grão foi de 30 milhões de litros na safra 2013/14, um volume que deve chegar a 9,6 bilhões de litros em 2030/31.

Se confirmada, esta quantia representaria um aumento de 179,8% ante os 3,43 bilhões produzidos na safra 2021/22.

Na quinta edição da Conferência NovaCana, o analista de equity do BTG Pactual, Thiago Duarte, explicou que o crescimento do grão foi notável nas últimas três décadas. Enquanto isso, a principal matéria-prima para fabricação de etanol no Brasil, a cana-de-açúcar, manteve-se praticamente estagnada. “O milho quase triplicou a produtividade e a cana está quase no mesmo lugar”, aponta.

A Companhia Nacional do Abastecimento (Conab), em seu primeiro levantamento da safra de grão 2022/23, projetou que o milho terá uma produção recorde de 126,94 milhões de toneladas, com a segunda safra podendo chegar a 96,28 milhões de toneladas. A Unem acredita que este aumento reforça as perspectivas de crescimento do etanol de milho, especialmente porque a principal fonte das usinas é o grão da segunda safra.

Quem corrobora com a importância do uso desta matéria-prima para a fabricação do biocombustível é o analista de inteligência de mercado da StoneX, Filipe Cardoso: “Safra a safra, o etanol de milho vem fazendo uma participação cada vez mais relevante no setor”.

Segundo ele, o biocombustível a partir do grão representou 14,4% do total produzido em 2021/22 e deve ser responsável por 20,9% em 2023/24, ou 5,5 bilhões de litros.

Mesmo que o milho tenha se mostrado mais eficiente em termos de produção, o diretor de processamento de grãos para América Latina da IFF, Mario Cacho, alega que o etanol a base do grão “não estaria aqui se não fosse a cana”.

Com isso, Cacho ressalta que o setor de milho está seguindo um caminho já trilhado pelo sucroenergético. Ele conta que viu o nascimento da primeira usina flex do país, no estado de Mato Grosso, há dez anos. “Dá orgulho ver como cresceu essa indústria”, declara.

Mas, além de oportunidades, o setor de etanol de milho também conta com alguns desafios econômicos e ambientais.

No texto completo, exclusivo para assinantes, você encontra mais detalhes sobre a rentabilidade do etanol de milho, assim como as principais oportunidades e desafios do setor, listadas por especialistas que passaram pela quinta edição da Conferência NovaCana.

Brasil Paralelo distorce obras de Lewis, Tolkien e Chesterton em série, Reinaldo José Lopes, FSP

 Reinaldo José Lopes

SÃO CARLOS (SP)

"Guerra do Imaginário", série documental com três epispidios lançada pela plataforma de streaming Brasil Paralelo, apresenta resumos competentes da trajetória de três gigantes do mundo literário britânico dos séculos 19 e 20: G.K. Chesterton, C.S. Lewis e J.R.R. Tolkien.

Sem o trio, a literatura de fantasia moderna provavelmente não existiria, e os episódios desenham um bom quadro geral de sua vida e obra. O diabo, porém, mora nos detalhes. Na série, os contornos e a moldura desse quadro estão distorcidos.

Os escritores G.K. Chesterton, C.S. Lewis e J.R.R. Tolkien em material de divulgação da série 'Guerra do Imaginário', da Brasil Paralelo
Os escritores G.K. Chesterton, C.S. Lewis e J.R.R. Tolkien em material de divulgação da série 'Guerra do Imaginário', da Brasil Paralelo - Divulgação

Ideologicamente afinada com o bolsonarismo e o olavismo, a produtora se notabilizou pela produção de documentários como "Brasil: A Última Cruzada", nos quais se propõe a combater uma suposta doutrinação da esquerda no ensino de história no país. A ideia seria revalorizar os aspectos heroicos da trajetória brasileira.

Naquela série, erros factuais graves e o pesado viés ideológico eram disfarçados pelo capricho da produção. A intensidade desses problemas diminui bastante em "Guerra do Imaginário", mas ainda assim o espectador atento é capaz de perceber distorções históricas importantes e uma tentativa de retratar os biografados de forma unidimensional.

Isso começa, é claro, com a moldura trazida pelo título da série dirigida por Guilherme Freire. Ocorre que Chesterton, Lewis e Tolkien se tornaram ícones do conservadorismo cristão no mundo de língua inglesa —e, bem mais recentemente, entre bolsolavistas no Brasil—, embora a influência dos autores vá muito além desse meio. O engajamento de tais grupos numa guerra cultural contra a esquerda os leva a alistar o trio nos batalhões desse combate —o que nem sempre funciona.

A patente de guerreiro do imaginário talvez seja mais apropriada no caso de Chesterton, que se notabilizou como polemista e satirizava com habilidade singular figuras antirreligiosas como o dramaturgo George Bernard Shaw e o escritor de ficção científica H.G. Wells.

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A verve de Chesterton foi crucial para retratar a fé cristã como uma opção intelectualmente justificável num mundo cada vez mais secularizado, um caminho que seria, em parte, adotado por C.S. Lewis em obras como "Cristianismo Puro e Simples".

Lewis, porém, é muito mais teólogo popular do que polemista, sem falar no seu interesse em transfigurar os elementos da fé cristã em forma narrativa por meio da ficção científica, com sua "Trilogia Cósmica". e da fantasia, com "As Crônicas de Nárnia". Quanto a Tolkien, autor de "O Senhor dos Anéis", é difícil imaginar alguém menos afeito ao debate público e às polêmicas.

De qualquer modo, o relativo anacronismo de retratá-los como guerreiros culturais é um problema menor diante das omissões e distorções sobre a vida e obra dos autores, em especial no caso de Lewis e Tolkien.

No episódio sobre Tolkien, a narrativa cita de passagem a paixão do autor pelas árvores, mas evita mencionar a condenação irada do desmatamento que ele faz em uma de suas cartas. "O som selvagem da motosserra nunca silencia onde quer que árvores ainda sejam encontradas crescendo", escreve o autor, que também costumava chamar os motores que usam combustíveis fósseis de "motores de combustão infernal" e criou os seres conhecidos como Ents como uma espécie de vingadores das florestas acuadas em sua Terra-média.

A maneira como o episódio sobre Lewis descreve as implicações de sua "Trilogia Cósmica" também não prima pela precisão —ou, talvez, pela honestidade intelectual. Ao discutir o último livro da série, um dos entrevistados diz que a trama da obra gira em torno de "um instituto de ciência que toma o poder no mundo, para dizer o que deve ser a sociedade, destruindo a religião". É difícil não ouvir os ecos dos protestos anticiência durante a atual pandemia.

A afirmação, porém, deixa de lado o fato de que os vilões "científicos" do livro na verdade são satanistas que tentam dar um verniz científico a uma ideologia desumana, e que um dos heróis que se opõem a eles é um agnóstico e cético radical, uma espécie de Carl Sagan dos anos 1940, inspirado num antigo professor de Lewis.

Por fim, é difícil não engasgar quando o narrador da série diz, com toda a pachorra do mundo: "As visões utópicas e os valores materialistas denunciados por Lewis na 'Trilogia Cósmica' foram responsáveis por eclodir mais uma Grande Guerra", em referência a Segunda Guerra Mundial.

Como diria Luke Skywalker, cada uma das palavras desta frase está errada. O antissemitismo de Hitler — uma bricolagem insana de preconceito milenar contra os judeus, alimentado e aceito por muitos cristãos, com misticismo pagão— aparentemente não teve nada a ver com a gênese da Segunda Guerra Mundial. O mesmo parece valer para o estado deplorável da economia alemã após a Grande Depressão. Então tá.

GUERRA DO IMAGINÁRIO - A JORNADA DE CHESTERTON, LEWIS E TOLKIEN

ESTADÃO / BRASIL Operações da Polícia Federal miram armas de CACs em ao menos sete Estados, OESP

 Operações da Polícia Federal (PF) e de polícias locais têm se voltado contra irregularidades no registro de armas por colecionadores, caçadores e atiradores esportivos (CACs), o que tem facilitado o acesso a armamento por parte de criminosos. Diferentes investigações já atuaram em ao menos sete Estados nos últimos meses.

Nesta sexta-feira, 21, a PF prendeu quatro integrantes de uma quadrilha que fraudava o registro de CAC para obter armas e vendê-las ilegalmente. Os criminosos usavam as redes sociais para captar clientes. Na semana passada, outra operação apreendeu um arsenal, incluindo quatro fuzis, com um suspeito que teria obtido as armas por meio de CACs laranjas. Em julho, foi preso um falso CAC que repassava armas para o Primeiro Comando da Capital (PCC).

As ações ocorrem em um contexto no qual o número de armas registradas nas mãos de caçadores, atiradores e colecionadores já passa da casa de 1 milhão, segundo levantamento dos Institutos Igarapé e Sou da Paz. Desde o início do governo Jair Bolsonaro, a quantidade de armas para esse grupo aumentou 287%.

Armas apreendidas pela Polícia Federal em operação contra quadrilha que falsificava registros de CACs.
Armas apreendidas pela Polícia Federal em operação contra quadrilha que falsificava registros de CACs. 

O número de CACs subiu 474%, passando de 117.467 em 2018 para 673.818 até 1.º de julho deste ano. A categoria pode adquirir de revólveres a fuzil, com direito a 60 armas, sendo 30 de uso restrito. Para colecionadores não há limite. O País tem hoje mais de 2 mil clubes de tiro.

Nesta sexta-feira, a Operação Zona Cinza cumpriu 37 mandados de busca e apreensão e 11 ordens de suspensão de atividades econômicas, atingindo clubes de tiros e lojas de armas em três Estados: Pernambuco, Alagoas e São Paulo.

Os mandados foram expedidos pela Justiça Federal de Caruaru (PE), onde as investigações tiveram início, em 2021. Na ocasião, apurou-se que um clube de tiro e uma loja de armas de um mesmo grupo davam cursos, serviços de conserto, manutenção e customização de armas de fogo sem licença da PF para atuar como armeiros.

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Conforme a PF, durante a investigação foi identificada uma grande organização criminosa que falsificava documentos de CACs, dando aparência legal tanto para o comércio, quanto para o porte ilegal de armas de fogo.

“O grupo utilizava pessoas jurídicas como instrumentos para produzir entrevistas, vídeos e outros conteúdos para difundir o nome da empresa, sobretudo por meio da internet, com publicidades ilegais para a venda. Com isso, estimulava o uso indiscriminado de armas de fogo e incitava a prática de crimes”, disse, em nota. Ainda segundo a PF, a operação vai prosseguir para identificar outros envolvidos e apurar a execução de fraudes contra os sistemas dos órgãos públicos de fiscalização e controle.

Fuzis

Na Operação Oplá (arma, em grego), em Mato Grosso do Sul, um homem com registro de CAC foi preso no dia 5 de outubro, em Campo Grande, com quatro fuzis calibre 7.62, três pistolas 9 mm de fabricação americana com kit rajada, coletes balísticos e identificações falsas da Polícia Civil.

As armas, achadas no porta-malas do carro, eram roubadas e seriam entregues a uma quadrilha suspeita de assaltos a bancos. Após a prisão, a Justiça Estadual expediu sete mandados de prisão na capital e em Maracaju, no interior, contra integrantes da quadrilha, incluindo outro CAC supostamente laranja.

Em julho, a PF prendeu em Uberlândia (MG) um homem que conseguiu, com documentos falsos de CAC, comprar sete armas, entre elas um fuzil e duas carabinas, para entregar à facção criminosa PCC. O acusado comprou o arsenal mesmo sendo réu ou investigado em 16 processos e inquéritos criminais. Entre as ações, ele respondia por homicídio qualificado, roubo, tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo.

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No mês passado, a Operação Registro Armado cumpriu mandados de apreensão contra despachantes do Exército brasileiro que fraudavam o sistema para conseguir registro para atiradores e caçadores de forma ilegal, em Goiânia (GO). Conforme o Exército, que colaborou com a operação, os despachantes foram suspensos e os CACs perderam os registros.

Já a Operação Confessio, realizada em fevereiro deste ano, no Rio de Janeiro, desarticulou um esquema de fraude documental para burlar a fiscalização e o controle na comercialização de armas de fogo. A quadrilha falsificava, inclusive, documentos usados no processo de compra de armas de fogo e munição pelos CACs em estabelecimentos comerciais.

Facilidade de acesso criou canal de fornecimento

Para a especialista Carolina Ricardo, diretora do Instituto Sou da Paz, a maior facilidade dada pelo governo para a aquisição de armas pelos CACs criou um canal de fornecimento de armas que pode ser usado para abastecer o crime organizado. “Temos visto uma certa recorrência de casos de operações em que são identificados desvios de armas feitos a partir da possibilidade de se registrar como CAC. Não estamos criminalizando a categoria”, aponta.

Ela reforça que o número de armas liberado para a categoria atrai interesses de criminosos. “A quantidade de armas que um atirador desportivo pode comprar, incluindo fuzil semiautomático, e a quantidade que os colecionadores podem comprar, tudo isso passou a ser visto como uma facilidade por alguns grupos criminais.”

Segundo a especialista, os fraudadores só conseguem fazer o registro como CAC porque o Exército, a quem compete fiscalizar, não tem estrutura para fazer uma fiscalização eficaz. “O banco de dados é muito frágil, tanto que a gente solicitou esses dados e não conseguiu saber quantas pistolas 9 mm estão cadastradas, por exemplo, por município. Essa inteligência, sobre os dados que o Exército poderia gerar e não gera por falta de estrutura, é necessária.”

O Ministério da Justiça e o Exército não comentaram o tema ontem. Em outras oportunidades, o Exército destacou o esforço de fiscalização e a colaboração com autoridades investigativas em casos de transgressão das normas.