quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Morre o maestro Diogo Pacheco aos 96 anos, em São Paulo, oesp

 João Marcos Coelho, Especial para o Estadão

17 de agosto de 2022 | 10h41

O maestro Diogo Pacheco morreu na madrugada desta quarta-feira, 17, no Hospital Sírio-Libanês, em consequência de uma hemorragia, segundo informações da família, onde estava internado para tratamento de problemas pulmonares. Iria completar 97 anos  em 5 de novembro próximo. Mantinha Grande Concerto, um programa semanal na Rádio Cultura FM de São Paulo.

Foi sua mais recente atuação na mídia, característica que cultivou com determinação e muito talento. Diogo, como os que o conheceram o tratavam carinhosamente, foi assistente do maestro Eleazar de Carvalho na Osesp nos anos 1980/90. 

Sua atuação extrapolou o fechado mundinho clássico. Fez da democratização do acesso de toda a população à música clássica  seu mantra. Com um detalhe fundamental: Diogo tinha um humor fino. E uma coragem artística extraordinária.

Maestro Diogo Pacheco
Diogo Pacheco em 1996, com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo em Campos do Jordão Foto: JF Diorio/Estadão

Uma trajetória que se iniciou na música coral. Ele regeu muitos corais, fortaleceu o movimento coral no Estado de São Paulo. Décadas mais tarde, nos anos 1990, foi o responsável pelo programa Concertos Internacionais na Rede Globo. Antes disso, criou e manteve um programa semanal na Rádio Eldorado de muito sucesso e repercussão, inclusive fora dos limites da música clássica. 

O acontecimento de maior repercussão em sua carreira foi, sem dúvida, quando, em 1964, Diogo colocou Elizeth Cardoso, a divina Elizeth, no palco dos teatros municipais de São Paulo e Rio. E para entoar a cantilena das Bachianas Brasileiras n.º 5, de Villa-Lobos.

A imprensa deu conta da polêmica que o gesto provocou. Como? Uma cantora popular nestes ilustres palcos eruditos?  O gesto abalou preconceitos arraigados, abriu as comportas para os “atores” da vida musical erudita  enxergarem seus entornos populares. Afinal, música não pode ter adjetivo.

Diogo Pacheco
Em outubro de 1964, a cantora Elizeth Cardoso interpretou "As Bacchianas", de Villa-Lobos, sob a regência do maestro Diogo Pacheco, no Municipal de São Paulo  Foto: Acervo Estadão

Selecionei apenas a mais emblemática  aventura libertária de Diogo Pacheco, um espírito inquieto e sempre de bom humor, disposto a quebrar preconceitos. Fez isso com clareza no artigo “Como o brasileiro vai gostar de música clássica  se não há meios de chegar até ela?”, para a revista Viva Música. Assim como levou Elizeth para o Municipal, Diogo batalhou muito no sentido de fazer com que os grandes compositores - Bach, Beethoven, Mozart,  Chopin, os populares e os contemporâneos - chegassem a toda a população.  “Não é preciso ser entendido  nem ser de uma classe especial para ‘entender’  o famoso ‘tchan tchan tchan’ de Beethoven (...) O dia em que houver maior possibilidade de se entrar em contato com  a música clássica, não tenho dúvidas  de que seu consumo  aumentará, sem necessidade de teorias ou análises  que provem algo a favor ou contra. Precisamos é acabar com os entendidos  que dão palpite sem saber onde é o dó.” Santas e agudas palavras.

Diogo Pacheco merece ser lembrar por gestos simbólicos como o de levar Elizeth ao Municipal e batalhar pela popularização da música clássica.

Unindo erudito e popular

É deliciosa e informativa a leitura do livro Diogo Pacheco, um maestro para todos, de Alfredo Sternheim, editado pela Imesp na coleção Aplauso em 2010.  Um episódio, acontecido num concerto ao ar livre num estádio de futebol em Presidente Prudente, dá a medida de quem era Diogo Pacheco. Sternhein escreve: “Mais de dez mil pessoas pela primeira vez assistiam a uma apresentação de orquestra sinfônica. Quando entrou em cena, Diogo ouviu gargalhadas, achou até que a calça estivesse rasgada. Os risos prosseguiam, misturados a vaias. Ele resolveu agir: 'Peguei o microfone e dei um berro. ‘Vocês estão acostumados à música popular, que permite mexer com seu corpo, seus gritos. Mas agora vou tocar uma música que mexe com a sensibilidade de vocês e tem que ser ouvida com respeito. Se ficarem quietinhos, vocês vão dar espaço para que essa música entre em vocês. Portanto, silêncio’. Nunca, nem no Municipal, ouvi um silêncio tão sepulcral como aquele'.”

O sepultamento de Diogo Pacheco será nesta quarta, às 16h, no Cemitério da Consolação, em São Paulo. 

Marcelo Viana - O paradoxo de Polanyi impede a inteligência artificial?, FSP

 Em Djursholm, subúrbio elegante da cidade de Estocolmo, fica a sede do Instituto Mittag-Leffler. O palacete foi construído na década de 1890 pelo matemático sueco Gösta Mittag-Leffler (1846–1927), cujo casamento com a rica herdeira Signe af Lindfors dotara com os meios necessários para se permitir e a sua família uma residência refinada.

Em 1916, o casal doou a propriedade, incluindo sua excelente biblioteca, à Academia de Ciências da Suécia, para que nela fosse constituído um instituto de matemática. A doação incluía uma boa quantia em dinheiro, mas essa se desvalorizou durante a 1ª Guerra Mundial, o que inviabilizou o projeto. O instituto só viria a ser criado em 1969, tornando-se um polo de atração para matemáticos do mundo todo.

No térreo do instituto, há uma sólida lareira em granito cinza-chumbo. Gravada na pedra, uma inscrição em escrita antiga que um amigo sueco decifrou para mim com alguma dificuldade: "A mente não alcança além da palavra". Uma forma elegante de afirmar que aquilo que não conseguimos explicar aos demais não sabemos realmente.

Prédio em meio a árvores
Instituto Mittag-Leffler - Wikipedia

É uma ideia importante para alguém que, como eu, treina estudantes para descobrir, compreender e comunicar ideias matemáticas. Por isso, repito a frase de Mittag-Leffler com frequência a meus alunos. Maneira de dizer que, se a sua tese não está bem escrita, é porque você ainda não entendeu o assunto direito.

Mas nem todo mundo concorda. No livro "Dimensão Tácita", publicado em 1966, o filósofo britânico de origem húngara Michael Polanyi (1891–1976) apontou que o conhecimento humano do mundo e de nós mesmos está, em grande medida, além da nossa capacidade de expressão. "Sabemos mais do que conseguimos dizer", afirmou.

Saber dirigir é muito mais do que seguir as instruções básicas (soltar freio de mão etc) que recebemos do instrutor de autoescola: se não fosse assim, bastaria escutar. Mas esse muito mais, que adquirimos fazendo, não somos capazes de descrever. Reconhecer um rosto, jogar xadrez ou falar uma língua estrangeira são outros exemplos de coisas que sabemos fazer, mas somos incapazes de expressar como fazemos.

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Na época, o "paradoxo de Polanyi" foi visto como um golpe profundo na ideia de inteligência artificial: se não sabemos explicar como executamos tais tarefas, como podemos fazer com que máquinas as realizem? Continuarei na próxima semana.

Elio Gaspari - Minas mandou seu sinal, FSP

 Começou nesta terça-feira (16) a campanha eleitoral. Serão dias de tensão, sobretudo porque a pesquisa do Ipec (ex-Ibope) trouxe más notícias para Bolsonaro. A pior delas veio de Minas Gerais. O governador Romeu Zema, ostensivamente descolado do presidente, tem 40% da preferência, contra 22% de Alexandre Kalil, que é apoiado por Lula.

O prefixo "Bolso", que já foi alavanca, parece ter se tornado um fardo. Isso foi percebido por candidatos que, mesmo tendo o apoio do capitão, evitam ser confundidos com ele.

No Rio, o governador Claudio Castro (21%) está tecnicamente empatado com Marcelo Freixo (17%). O mesmo acontece no estado no confronto de Lula (35%) com Bolsonaro (33%). Lá, há quatro anos o capitão fez cabelo, barba e bigode. Elegeu um juiz de pouca fama e nenhum futuro. Conseguiu 4,4 milhões de votos para seu filho Flávio.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) cumprimenta o governador de Minas Gerais Romeu Zema (Novo) - Marcos Corrêa - 26.ago.20/Divulgação Presidência da República

Eleição, como a Copa do Mundo, só começa quando a bola começa a rolar. Se a última pesquisa do Datafolha deu alento a Bolsonaro, a do Ipec foi um copo de água fria no clima de otimismo que corria no Planalto na semana passada.

A onda bolsonarista de 2018 parece coisa passada. O presidente perdeu seu maior aliado: o sentimento anti-PT. Ele persiste, enfraquecido. Hoje vem acompanhado pela rejeição ao próprio Bolsonaro. Ela está em 46%, enquanto a de Lula ficou em 33%. A conjunção desses dois fatores leva Lula, com 44% a entrar como favorito sobre Bolsonaro (32%).

Os palacianos da semana passada garantiam que Bolsonaro cresceria e o ministro Paulo Guedes informava ao andar de cima que há um arsenal de bombas contra Lula.

Resta ao presidente confiar na sua capacidade demolidora. O maior demolidor da política brasileira foi Carlos Lacerda. No século passado ele destruiu dois presidentes, Getúlio Vargas em 1954 e João Goulart em 1964. Nos dois casos jogava com o uniforme da oposição.

Em 1965, quando seu governo foi para a frigideira, os eleitores fritaram seu candidato. Registre-se que Lacerda foi um governador estelar. Demolição é uma arma que favorece a turma do contra. Vinda da situação, confunde-se com baixaria. Além disso, em décadas de atividade parlamentar, Bolsonaro foi mais um provocador do que um demolidor.

A oposição a Bolsonaro tem sido criativa e eficaz pregando aos convertidos. A carta pela Democracia lida no cenário da Faculdade de Direito da USP foi comovente, mas é sempre bom lembrar que as Arcadas que tiveram Joaquim Nabuco e Castro Alves como alunos, tiveram também, como diretores, os professores Luis Antonio da Gama e Silva e Alfredo Buzaid. Um redigiu o Ato Institucional nº 5. O outro sucedeu-o no ministério da Justiça, com idêntico ardor.

Duas coisa são certas: se Bolsonaro continuar montado no discurso contra as urnas eletrônicas, congelará a fotografia das pesquisas de hoje. Do outro lado do balcão, seus adversários festejam que o Auxílio Brasil não fez efeito. Pudera, pois o dinheiro ainda não entrou no bolso dos cidadãos que viram o governo chamar a Covid de "gripezinha". Algum efeito terá, a dúvida fica na avaliação do tamanho.

Nesta quinta-feira (18) tem Datafolha, com resultados que permitem a visualização das curvas dos candidatos.