segunda-feira, 1 de agosto de 2022

João Pereira Coutinho - Modalidades de traição vão da infidelidade física até a puramente fantasiosa, FSP

Para ter sucesso na vida não basta ser estúpido; é preciso também ter boas maneiras. Assim falava Voltaire.

Falava bem. Estúpidos com boas maneiras sempre chegam longe. E, quando aplicam o seu talento a certas áreas —política, economia, livros de autoajuda—, está encontrado o caminho para a fortuna.

Deixemos ficar a política e a economia para outro dia. Como resistir à autoajuda, sobretudo em matéria amorosa?

Eu não resisto. Leio no jornal The Independent que os ditos "especialistas" em relações sentimentais (risadas?) encontraram cinco formas de infidelidade. Todas elas partilham a mesma gramática —secretismo, engano e volatilidade emocional.

Várias silhuetas de casais abraçados se espalham pela composição. Dentro de seus corpos, há apenas labirintos
Ilustração de Angelo Abu para a coluna de João Pereira Coutinho publicada em 1º de agosto de 2022 - Angelo Abu/Folhapress

Mas nem todas apresentam as mesmas manifestações. A infidelidade física é a mais comum. Você conhece: dois corpos que se encontram, se beijam, se unem —e alguém está enganando alguém.
Ou ambos estão enganando os respectivos parceiros.

Não é a única infidelidade que importa. Em segundo lugar, é preciso ter atenção à infidelidade mental. Repito: mental. Dizem os "especialistas" que fantasiar faz parte da natureza humana (a sério?); mas a infidelidade só acontece quando essas fantasias dominam a sua vida e, no limite, destroem a relação.

Sou o exemplo vivo disso: durante alguns anos, tive um namoro intenso com Deborah Secco. O fato de nunca nos termos conhecido não passava de um detalhe para as minhas namoradas. "Pode ficar com ela!", gritavam na minha cara, antes de baterem a porta.

Em terceiro lugar vem a infidelidade sentimental: é quando você começa a sentir algo pela mulher do vizinho, do amigo, do chefe, sem jamais consumar essa atração.

Em quarto, vem a infidelidade virtual. As redes sociais potenciaram esses dramas: dois usuários encontram-se no ciberespaço e começam a trocar "likes" e emojis com uma paixão insana. Nove meses
depois, pode nascer um blog.

Finalmente, vem a infidelidade monetária. Como? Eu explico como: veja seu cartão de crédito e verá que ela, ou ele, já tem outro, ou outra. Os nomes mais comuns do rival costumam oscilar entre Hugo (Boss) e Carolina (Herrera).

Por mais exaustiva que seja essa lista, sinto que ainda faltam algumas modalidades de traição. Com o devido respeito aos "especialistas", sugiro mais essas cinco:

"Infidelidade Frankenstein": atração por um outro corpo, mas não pela totalidade dele. Só por uma das partes —a clavícula, a tíbia, eventualmente as falangetas das mãos ou dos pés.

"Infidelidade Dolly": existe atração, eventualmente consumação, mas com um exemplar ruminante bovídeo da sub-família caprina, ou seja, com uma ovelha. Foi Woody Allen quem diagnosticou o fenômeno em 1972 com "Tudo o que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo Mas Tinha Medo de Perguntar".

"Infidelidade paranormal": a relação é estabelecida com outra pessoa, já morta, mas presente em espírito.

"Infidelidade gastronômica": fique tranquila, ele ama você, mas ama mais a geladeira.

"Infidelidade neurológica": "Querido, isso não é o que você está pensando".

E por falar em traição: o governo espanhol lançou uma campanha para afirmar que "todos os corpos são corpos de praia". Na imagem, vemos cinco mulheres, de todas as formas e feitios, curtindo o sol estival.

A mensagem do governo é clara: preconceitos sobre o corpo feminino não são aceitáveis. A praia é de todo mundo —gordos e magros, novos e velhos.

Infelizmente, esta sábia recomendação não foi observada pela própria campanha do governo, que usou as imagens das mulheres sem pedir autorização a elas.

Pior: usou as imagens e, em certos casos, editou-as. A modelo Sian Green-Lord, que tem uma prótese na perna esquerda, ficou com uma perna nova e funcional; e a atriz Juliet FitzPatrick, que fez uma dupla mastectomia, aparece num outro corpo (e com um seio intacto).

O que espanta nessa história não é apenas a gritante contradição entre a teoria e a prática. É verificar, uma vez mais, que nada disso teria acontecido se o governo progressista de Pedro Sánchez não tivesse criado um problema onde ele não existia. Todos os corpos são corpos de praia? Basta frequentar uma para saber que sempre foi assim.

Eis um caso em que a estupidez não veio acompanhada pelas boas maneiras. Deu no que deu.

| Recuperação energética de resíduos é aliada para que o Brasil avance em questões ambientais importantes, Canal Energia

 Por Yuri Schmitke*


Rio de Janeiro - A gestão dos resíduos sólidos urbanos (RSU) tem sido, há anos, um grande desafio nacional na busca pela destinação adequada do lixo gerado diariamente pela população brasileira. Quarto colocado no ranking dos países que mais geram lixo no mundo e com um índice baixo de reciclagem, de aproximadamente 4%, o Brasil tem buscado alternativas regulatórias e estruturais para solucionar esse desafio.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída em 2010 pela Lei nº 12.305, categorizou o tratamento e a recuperação energética como formas de destinação ambientalmente adequada de resíduos sólidos.

Em abril deste ano, o Governo Federal lançou o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PLANARES) e o Programa Recicla+, por meio dos Decretos nº 11.043/22 e nº 11.044/22, respectivamente. Na mesma data, o Projeto de Lei (PL) nº 924/2022, que institui o Programa Nacional de Recuperação Energética de Resíduos (PNRE), foi apresentado à Câmara dos Deputados.

O documento, que contou com apoio técnico da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (ABREN), propõe medidas para estimular os municípios brasileiros a licitarem usinas que utilizam o lixo urbano para gerar energia elétrica. O texto do PNRE complementa as diretrizes nacionais e promove o incentivo à recuperação energética da fração não reciclável dos resíduos sólidos, além de incentivar, financiar e promover a estruturação de processos licitatórios para concessões municipais de manejo de resíduos.

O menor impacto ambiental previsto no Programa não considera o envio de resíduos para aterros sanitários quando há viabilidade técnica e econômica para o tratamento e a recuperação de energia por incineração. A proposta é que se priorize os aterros sanitários como soluções transitórias para o encerramento de lixões.

Especialistas em todo o mundo alertam para a necessidade de se formular políticas públicas com o objetivo de erradicar lixões e tratar as emissões de metano no setor de gerenciamento de resíduos, bem como reforçam a necessidade de os aterros sanitários serem equipados com equipamentos de controle e valorização de biogás e sujeitos, cada vez mais, a um monitoramento mais abrangente.

O 5º Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) aponta que as usinas de recuperação energética reduzem em muito as emissões de gases de efeito estufa (GEE) quando comparadas aos lixões.

A implantação de usinas de recuperação energética, somente nas 28 regiões metropolitanas brasileiras com mais de 1 milhão de habitantes, teria potencial de evitar a emissão de cerca de 51 milhões de toneladas de CO2 equivalente anuais, ou 1,53 bilhão de CO2 equivalente durante 30 anos de operação, o que corresponderia a plantar quase 7 bilhões de árvores neste período.

Esse cenário serve de alerta para o Brasil. O País firmou compromisso na COP 26 de reduzir 30% das emissões de metano até 2030, o que reforça a necessidade de se erradicar definitivamente os lixões e agregar mais tecnologia à gestão de resíduos em todo o nosso território.

As UREs fornecem uma solução local para o gerenciamento sustentável de resíduos sólidos, que geralmente são transportados a apenas alguns quilômetros de distância antes de serem convertidos em energia limpa e renovável, permitindo uma economia somente em transporte de RSU e de uso do sistema de transmissão de energia equivalente a cerca de 340 R$/MWh.

Outra forma relevante de recuperação energética ocorre com a utilização do Combustível Derivado de Resíduos (CDR) para o coprocessamento em fábricas de cimento. Utiliza-se esse combustível alternativo de modo a reduzir a utilização de combustível fóssil, neste caso, o coque de petróleo, derivado do petróleo e que gera muito mais gases de efeito estufa do que o CDR. O Brasil conta com 36 fábricas de cimento com licenciamento ambiental para o coprocessamento e substitui 31% do combustível fóssil por CDR para a fabricação de cimento.

A cargo de exemplo, os 13 países com uma taxa de tratamento térmico de RSU superior a 25% do total gerado estão também entre os 16 primeiros países no Índice de Saúde e Bem-Estar do Fórum Econômico Mundial. A instalação de usinas de recuperação energética permite incomensuráveis benefícios à saúde da população. Segundo estudos da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA), o custo do atendimento médico à população afetada pela má gestão dos RSU é calculado entre 10 e 20 $/t de RSU, equivalente a uma média de 75 R$/t, o que representa um gasto desnecessário de R$ 5,25 bilhões/ano no Brasil, isso sem contar os óbitos relacionados a isso.

Outra forma relevante de capturar o metano é por meio de sistemas instalados em aterros sanitários, para geração de energia elétrica pela queima do biogás ou separação do biometano para ser usado em veículos ou injetado na rede local de gasodutos. O Brasil deposita 40% de seu lixo urbano em lixões e aterros controlados, sendo que, nestes casos, torna-se especialmente relevante que sejam construídos aterros sanitários com esses sistemas de geração de energia elétrica, de modo a reduzir as emissões de gases de efeito estufa com a captura de aproximadamente 50% do metano emitido.

O mercado de recuperação energética começa a ser criado nacionalmente, atraindo grandes investidores internacionais para atuarem no mercado brasileiro. Trata-se de um movimento positivo para o Brasil, que trará recursos importantes nos setores de saneamento básico e saúde pública, além de gerar energia limpa e renovável, criar empregos e contribuir para a redução de gases de efeito estufa, potencializando o papel do Brasil em relação à economia circular e à agenda ESG.

O Brasil é um país de enormes proporções, sendo que para cada região, deve-se avaliar a melhor opção disponível e possível, sob o ponto de vista tecnológico e financeiro. Ou seja, não existe uma solução única para todas as regiões do país, sendo que cada região deverá realizar estudos específicos para identificar as melhores sinergias.

* Yuri Schmitke é Presidente da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (ABREN), Presidente do Waste-to-Energy Research and Technology Council (WtERT Brasil), Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) e Professor da FGV no MBA em Administração: Recuperação Energética e Tratamento de Resíduos.

domingo, 31 de julho de 2022

Derrubando os muros no dia seguinte, Samuel Pessoa -FSP

 Nesta segunda-feira (1º), haverá o lançamento do ebook "Uma Agenda Inadiável", produzida pelo Derrubando Muros.

Derrubando Muros (DM) é um grupo apartidário e diverso de 103 pessoas, entre ativistas, cientistas, comunicadores, acadêmicos, empresários e políticos, dedicado a discutir soluções possíveis para o futuro do Brasil. Acredita que, apesar dos enormes desafios sociais e econômicos, é possível implementar ações impulsionando o que existe de positivo no país em economia verde, inovação, energia, saúde, educação.

O DM parte do princípio de que o Brasil tem jeito e que a sociedade civil há muito assumiu o protagonismo na elaboração dos melhores diagnósticos setoriais e proposições de políticas públicas para nossos problemas crônicos.

Trabalhador ao lado de painéis solares flutuantes na fazenda hidro-solar Sirindhorn Dam, administrada pela Autoridade Geradora de Eletricidade da Tailândia, em fevereiro de 2022 - Jack Taylor/AFP

Todos os integrantes do DM atuam de forma voluntária e aberta a novas contribuições. O coletivo se posiciona como "articuladores da última milha", recolhendo contribuições existentes e as organizando para chegarem até os formuladores das políticas públicas.

No ebook o leitor encontrará diagnósticos e propostas de políticas públicas para: educação, saúde, segurança pública, economia verde, indústria, empreendedorismo, inovação, energia, mundo "figital" e geopolítica. Esses capítulos foram escritos pelos melhores pesquisadores e profissionais das respectivas áreas.

Como aperitivo, vão aqui os primeiros três parágrafos do capítulo "Figital", de Silvio Meira:

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"É estranho, sabemos! Parece que o título deste texto está errado: experimente, leitora e leitor, pronunciar em voz alta esse termo [Figital]. Pois é, soa estranho mesmo. Entretanto novos arranjos demandam novos termos.

Assim como até o século 16 não existia o termo ‘descobrimento’, até o começo desta década, anos de 2020, não havia razão clara para chamar algo de ‘figital’. Estávamos todos habituados a pensar em dois termos apenas: analógico ou digital.

Este texto que está agora diante de você, leitora e leitor, serve tanto para apresentar esta nova ideia como para justificar por que devemos, no Brasil, afeiçoar-nos a ela: o mundo que chegará em 2023 será crescentemente figital".

Para mim, coube a parte menos interessante e que, infelizmente, ainda está conosco: a construção de um equilíbrio macroeconômico e a adoção de reformas microeconômicas que gerem ganhos de produtividade e queda da desigualdade.

Equilíbrio macroeconômico deveria ser o mesmo que um bom juiz de futebol: tão discreto, silencioso, ponderado e comedido que as pessoas esquecem que ele lá está. Transpondo a figura futebolística, deveria representar acordos tão consolidados de nossa sociedade que não saberíamos que o tema existe. Sobrariam tempo e energia para que a sociedade se concentrasse no fundamental: saúde, educação, segurança, entre tantos temas de importância primeira.

Procurei firmar alguns acordos mínimos. O primeiro e mais importante, pois trata-se de pré-requisito, não fim, é a estabilidade fiscal. O Estado tem que ser solvente, isto é, tem que ser capaz de pagar sua dívida pública sem ter que recorrer ao imposto inflacionário.

O DM não se pronunciou sobre o desenho específico da construção de uma posição fiscal estruturalmente solvente: se por meio de aumento de impostos ou via reformas que reduzam o gasto público; se mais concentrado no início do próximo mandato ou mais diluído ao longo do tempo. Essas são escolhas políticas que o Congresso e a nova liderança para próximo quadriênio farão.

​O lançamento pode ser acompanhado nesta segunda, às 15h, neste link. O ebook pode ser baixado em www.derrubandomuros.org/.