quarta-feira, 11 de março de 2020

Ruy Castro - Receita de impeachment, FSP

Se for preciso uma crise econômica para afastar um presidente, há uma a caminho

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Em sua guerra contra o Brasil e a favor de si mesmo, Jair Bolsonaro conta com o apoio de seus familiciares, meia dúzia de generais bovinos, uma rede digital clandestina de propaganda e auxiliares robotizados como Abraham Weintraub ou oportunistas como Sergio Moro. É material humano de encomenda para quem quer se sustentar no poder, mas não para administrar um país. Aliás, o desprezo de Bolsonaro pela administração se revela na maneira airosa e piadista com que trata os problemas.
Escorado numa massa de seguidores narcotizados pela ideologia, Bolsonaro sente-se forte para ignorar, ofender ou humilhar congressistas, juízes, investidores, jornalistas, chefes de Estado, economistas, diplomatas, servidores públicos, intelectuais, artistas, professores, estudantes, mulheres, minorias sexuais, indígenas, ambientalistas, portadores de HIV, nordestinos —a lista cresce todos os dias. É muita gente para se ter contra si, e cada membro desses grupos sociais ou categorias representa um voto —ou Bolsonaro não está exatamente preocupado com eleições?
Em contrapartida, há os grupos sociais ou categorias que ele favorece e que tem como aliados: policiais expulsos e participantes de milícias, PMs amotinados, bandidos condenados por assassinato e em liberdade, vendedores de proteção, bicheiros, fabricantes de armas, evangélicos profissionais, grileiros de terras e motoristas infratores, sem falar em ministros envolvidos em esquemas de laranjas, rachadinhas e favorecimento dos próprios negócios com dinheiro público.
Nunca um presidente se cercou de tantos elementos desse nível. Espanta que seus eleitores, tão puros de intenção, aceitem conviver com tal escória.
Nada disso, no entanto, parece bastar para um impeachment. O qual, dizem os entendidos, precisa de uma grave crise econômica para deslanchar. Bem, há uma a caminho.

Hélio Schwartsman R=DOTS, FSP

É preciso instruir a população para que evite contatos não essenciais

O número mágico da epidemiologia é R, definido como a quantidade de pessoas para as quais um paciente típico transmite a doença. Quando as infecções se dão em ambiente, digamos, selvagem, isto é, sem medidas de prevenção, nós temos R0, também chamado de taxa básica de reprodução. O R0 da covid-19 foi inicialmente estimado em algo entre 2,2 e 3,9.
Só que ambientes selvagens não duram muito. Assim que se percebe que há uma epidemia, autoridades e os próprios cidadãos tomam providências. O R0, que pode ser descrito como uma propriedade do agente etiológico, dá lugar ao R, que é a taxa efetiva de reprodução numa população de verdade.
E, utilizando a terminologia de Adam Kucharski em "The Rules of Contagion", podemos dizer que R=DOTS, isto é, depende da Duração da fase em que o paciente permanece infectado; do número médio de Oportunidades que ele tem de transmitir a moléstia; da probabilidade de cada oportunidade converter-se em Transmissão; e da Suscetibilidade média da população à doença.
No caso da covid-19, para a qual não há remédios nem vacina, não temos como agir sobre D e S, mas podemos trabalhar sobre O e T. Autoridades brasileiras vêm corretamente insistindo na necessidade de lavar as mãos, que é a melhor forma de reduzir T, mas elas me parecem ainda tímidas demais em relação a O.
Talvez seja cedo para suspender aulas e impor quarentenas, mas já passa da hora de instruir a população, em especial os mais vulneráveis, a evitar contatos não essenciais. Seria o caso, também, de cancelar atividades desnecessárias ou contraproducentes, como as manifestações políticas dos próximos dias.
E por que é importante agir sobre O e T? Epidemias, em sua fase inicial, seguem um padrão exponencial de transmissão. Isso significa que, se conseguirmos reduzir o R mesmo que só um tiquinho, obteremos uma diminuição dramática no número de doentes nas semanas seguintes.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".