terça-feira, 30 de outubro de 2018

Explorando as ambiguidades, FSP

Jair Bolsonaro conseguiu a façanha de ser eleito presidente sem ter dito o que pretende fazer depois de 1º de janeiro. Ou melhor, sua campanha soltou tantas e tão contraditórias declarações que qualquer proposta que o governo venha a apresentar será compatível com alguma das sinalizações emitidas.
Podemos tanto esperar uma reforma da Previdência vigorosa, quanto uma versão ultra-aguada daquela que foi proposta na gestão Temer. Para os que gostam de marcar “nenhuma das anteriores”, outra possibilidade é a mudança do regime de repartição para um de capitalização, que a maioria dos técnicos considera pouco viável.
Também não sabemos se veremos um programa de privatizações tão ousado que inclua praias e parques nacionais —seria a única forma de chegar ao R$ 1 trilhão desejado por Paulo Guedes—, ou um tão tímido que deixe de fora estatais “estratégicas” como Petrobras, BB, CEF e Eletrobras, que são as que valem dinheiro grosso. Em algum momento, tudo isso foi vocalizado ou ao menos insinuado por algum membro do núcleo duro bolsonariano.
Tal ambiguidade não chega a ser uma surpresa; ao contrário, é uma característica da retórica populista, que evita definições que possam alijar eleitores ou converter-se em cobranças no futuro. O próprio discurso da vitória de Bolsonaro teve uma versão mais institucional para o grande público, que não foi ruim, e outra, com mais provocações, para a turma das redes sociais.
É interessante notar que mesmo as falas mais veementes e ultrajantes do clã Bolsonaro costumam depois, caso provoquem comoção, ser relativizadas como se não passassem de brincadeira ou tivessem sido descontextualizadas. É uma forma de tentar normalizar a intimidação.
O problema com a ambiguidade é que ela funciona melhor na campanha do que no governo. Para fazer as coisas acontecerem, Bolsonaro precisará tomar decisões, isto é, arbitrar perdedores.

Em carta, Guardia defenderá teto e reforma da Previdência de Temer, FSP

BRASÍLIA


O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, divulgará nos próximos dias uma carta aberta em defesa da preservação do que considera o principal legado da atual equipe econômica: o teto de gastos, que limita o crescimento das despesas do governo à inflação.

A avaliação dentro do Ministério da Fazenda é que a ideia de um ajuste fiscal rápido, como defende o coordenador econômico do próximo governo, Paulo Guedes, só é viável através de aumento de impostos.
Aprovado em 2016, o teto foi pensado em um contexto de ajuste de longo prazo das contas públicas, com validade de 10 anos.
0
Eduardo Guardia é Ministro da Fazenda do governo de Michel Temer - Pedro Ladeira/Folhapress
[ x ]
Ou seja, um caminho diferente do proposto por Guedes, que já manifestou ambição de zerar o deficit primário já em 2019 através de privatizações de empresas estatais.

Segundo pessoas próximas às conversas, o economista já ouviu do próprio Guardia que isso não será possível, entre outros motivos pela burocracia envolvida no processo de desestatização de estatais.

O texto a ser tornado público nos próximos dias, segundo interlocutores do ministro, está pronto desde antes do segundo turno, e defende que o teto, duramente criticado durante a campanha presidencial, tornou o Orçamento real, desenhando um limite financeiro para as despesas.

O documento lista medidas essenciais que o próximo governo deve adotar para garantir o cumprimento do teto.

A primeira delas é a reforma da Previdência. O texto lembra que as mudanças propostas pelo projeto de lei atual, desenhado pela atual equipe, permitiriam economizar mais de R$ 500 bilhões em uma década, e que os gastos com as aposentadorias crescem entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões por ano.

Guedes já indicou que não votará a reforma da Previdência da equipe atual. O futuro ministro da Casa Civil do novo governo, Onyx Lorenzoni, chegou a classificar o projeto como "ruim, uma porcaria".

Além da necessidade da reforma das aposentadorias como forma de cumprir o teto, a carta apontará também que um dos caminhos para garantir a responsabilidade fiscal nos próximos anos é realizar mudanças na política de concessão de subsídios tributários. Em 2019, o governo deixará de arrecadar R$ 306,9 bilhões em tributos por causa dessas concessões, segundo cálculos da equipe econômica.

Este ano será o quinto consecutivo de deficit primário nas contas públicas, com um saldo negativo entre R$ 140 bilhões e R$ 150 bilhões. Para o ano que vem, a expectativa é de um novo deficit, limitado a uma meta de R$ 139 bilhões.

O Ministério da Fazenda já enviou à Casa Civil, que é a responsável pela coordenação da transição entre os dois governos, um extenso documento em que informa quais são as agendas e prioridades da pasta a serem observadas nos primeiros 100 dias de governo.