domingo, 14 de outubro de 2018

Facada foi decisiva para Bolsonaro, diz marqueteiro do PSDB, FSP

Para Lula Guimarães, ataque atingiu mais Alckmin do que o deputado e interrompeu possibilidade de desconstrução

Rogério Gentile
SÃO PAULO
Responsável pelo marketing da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB), o jornalista Lula Guimarães, 51, afirma que o atentado à vida do deputado Jair Bolsonaro (PSL) foi o fator decisivo que o colocou no segundo turno.
“A facada atingiu mais o Alckmin do que o Bolsonaro”, diz. “Interrompeu a possibilidade de mostrar quem Bolsonaro é realmente.”
Segundo o jornalista, a forte presença nas redes sociais foram importantes para o candidato do PSL, mas a cobertura jornalística do atentado o ajudou muito mais. “Somente na Globo teve mais de três horas de exposição”, diz. “Nenhum candidato teve isso.”
Sobre os erros do PSDB, Guimarães diz que o partido não fez a autocrítica que cobrou do PT, citando as acusações envolvendo Aécio Neves e outros líderes tucanos.
Lula Guimarães, marqueteiro do ex-presidenciável e atual presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, durante entrevista à Folha
Lula Guimarães, marqueteiro do ex-presidenciável e atual presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, durante entrevista à Folha - Eduardo Anizelli - 11.out.2018/Folhapress

Bolsonaro obteve uma votação impressionante sem ter tempo no horário eleitoral e com uma campanha focada nas redes sociais. O marketing político como conhecemos morreu? Acho que não. Imagine se o Bolsonaro tivesse dois minutos de televisão no horário eleitoral. Provavelmente venceria no primeiro turno. Teria feito diferença. O Haddad teve a candidatura lançada pouquíssimas semanas antes da votação. Se não fosse a televisão, não teria crescido como cresceu. As redes sociais não bastariam.
O atentado foi decisivo? Foi decisivo para o resultado do Bolsonaro. O colocou no segundo turno. A facada atingiu mais o Geraldo Alckmin do que o Bolsonaro. Em pouquíssimos dias de campanha, a rejeição do Bolsonaro subiu bem. Ele também se expôs em dois debates, passando a imagem de completo despreparo. A facada interrompeu a desconstrução da sua imagem. Interrompeu essa possibilidade de mostrar quem ele é realmente. Numa campanha curtíssima, passou a ser poupado. Foram duas semanas perdidas.
E a cobertura do crime? Bolsonaro passou a ter um espaço enorme na televisão. Somente na Globo, por conta do atentado, teve mais de três horas de exposição. Nenhum candidato teve isso. Foi o maior tempo de TV disparado, o dobro dos outros. Uma mídia que tem muito mais credibilidade do que a propaganda. E mais, em um processo de vitimização. Era a luta de um homem pela vida. Então, não é verdade que Bolsonaro chegou ao segundo turno por conta da internet apenas, ainda que tenha conseguido uma exposição extraordinária nas redes sociais num trabalho que começou lá atrás. A TV, involuntariamente, o ajudou muito.
De qualquer modo, Alckmin teve um tempo enorme no horário eleitoral. A Folha se equivocou ao dizer que o Alckmin tinha um latifúndio de tempo na TV. Teve cinco minutos e meio. Dilma teve 11 minutos e meio em 2014. O tempo disponível para os candidatos na eleição passada era de 25 minutos, o dobro de agora. E a campanha era mais extensa, com 15 dias a mais.
Mesmo não sendo um latifúndio, Alckmin teve um tempo muito maior do que os outros. Você saiu de uma vitória em primeiro turno com João Doria dois anos atrás. E agora seu candidato teve um desempenho pífio. O que ocorreu? O marketing é apenas um dos fatores em uma campanha. Eleição é como um acidente aéreo, não há uma única causa. Alckmin é um moderado num momento em que o Brasil pede alguém com posição mais histriônica.
Além disso, há o fato de que o PSDB não fez a autocrítica que cobrou do PT. Aécio Neves e outros líderes estão envolvidos em escândalos, e o partido não se posicionou contra eles. O tamanho da derrota do PSDB no país é reflexo disso.
Houve ainda uma série de boatos disseminados na internet pelos adversários contra o Alckmin. Isso tudo se combina com um candidato e um partido sobre o qual recaem em São Paulo uma certa fadiga de material. Há sempre um assunto que comanda a eleição, mais do que as ferramentas. O momento social e econômico fala mais alto que a comunicação. Os marqueteiros influenciam, mas com limitação. E a pauta desta eleição é a mudança dos políticos.
Estava certo, então, FHC, do ponto de vista da comunicação, quando pensou no Luciano Huck, um nome novo? Luciano é um cara muito talentoso. É excelente comunicador e tem muitas qualidades, mas não conheço sua capacidade administrativa. É lamentável saber que as pessoas foram buscar o novo apenas pelo impacto da empatia que podia ter na comunicação. Sem se preocupar com o preparo administrativo, com o preparo técnico. Huck seria um ótimo produto eleitoral, mas estamos escolhendo o presidente da República e não um apresentador.
A eleição já acabou? Acho que não, há espaço para movimentação. A tendência é Bolsonaro vencer, mas a gente não sabe o que pode ocorrer até lá. Pode haver erros. Mudanças de posicionamento. Ou a sociedade pode simplesmente repensar. Mas impressiona a solidez dos votos dos dois, sobretudo do Bolsonaro.
Dá para comparar Bolsonaro com Trump? Relativamente, já que lá não ocorreu um atentado. Mas há comparação. As fake news são uma característica das duas campanhas. No caso da do Trump, identificadas depois. Aqui ainda não sabemos quem pagou ou quanto custou essa presença. Outra coisa que se assemelha é o fato de os dois serem muito autênticos. Quem tem essa presença autêntica se sobrepõe nas redes sociais.

Lula (Luiz Flavio) Guimarães
Jornalista formado pela PUC-SP com mais de 25 anos de experiência em eleições. Coordenou a propaganda da campanha presidencial de Eduardo Campos e Marina Silva, em 2014, e a da campanha do ex-prefeito João Doria, em 2016.
 

A utilidade do fator arrependimento, FSP

Numa eleição influenciada pelo voto contra, talvez seja melhor pensar no risco embutido nessa decisão

Hoje o eleitor poderá escolher entre 13 candidatos. Nos últimos 29 anos, os brasileiros elegeram quatro pessoas para a Presidência: Fernando Collor, FHC, Lula e Dilma. Pode-se dizer que uma boa parte dos eleitores de Collor e Dilma se arrependeram do voto. Muita gente que preferiu Aécio Neves também deve ter se arrependido, e essa história mostra o risco embutido em eleições que desembocam em votos contra.
Quem já votou para presidente terá mais facilidade em lidar com o fator arrependimento, quer pelos candidatos em quem votou, quer por aqueles em que se orgulha de não ter votado. 
Em todos os casos, pode-se ir à seção eleitoral movido pelo voto contra A ou B. No caminho, vale a pena pensar no fator arrependimento. No dia da eleição, o voto contra pode ser glorioso como uma vitória no futebol. Ao contrário das disputas esportivas, eleição elege e o candidato assumirá a Presidência em janeiro. Daí em diante o eleitor recebe a parte que lhe cabe desse latifúndio. 
Muitos eleitores de Dilma, Collor e, lá atrás, Jânio Quadros arrependeram-se ou arrumaram justificativas fúteis para suas escolhas. Muitos colloridos votaram contra Lula, sabendo quem era a turma do “Caçador de Marajás”. 
Os janistas votaram contra a turma de Juscelino Kubitschek, mas sabiam que Jânio era, no mínimo, “a UDN de porre” (palavras de Afonso Arinos, referindo-se à União Democrática Nacional, o partido que se ajoelhou para Jânio). 
Eleições embebidas em votos contra produzem vencedores, mas a experiência mostra que, em pelo menos dois casos, entregaram o Brasil a presidentes desastrosos.
Receita para um autogolpe
Numa digressão genérica, o general Hamilton Mourão, candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro, referiu-se ao mecanismo do “autogolpe”, a que um governo recorreria, numa situação de grave crise política. “Já houve em outros países. Aqui nunca houve.” 
Houve em 1965, 1968, 1969 e 1977, mas deixa pra lá, porque foram autogolpes dentro de um regime ditatorial. Vale a pena revisitar o autogolpe tentado, sem sucesso, por Jânio Quadros. 
Jânio assumiu a Presidência em janeiro de 1961, teve uma relação hostil com o Congresso e com as lideranças de sua própria base. Na manhã de 25 de agosto, sem ter falado com ninguém, renunciou ao cargo.
No dia seguinte, ele disse ao jornalista Carlos Castello Branco, seu assessor de imprensa: “Nada farei por voltar, entrementes considero minha volta inevitável. Dentro de três meses, se tanto, estará na rua, espontaneamente, o clamor pela reimplantação do nosso governo”. Muita gente achava boa a ideia e havia antecedentes na cena internacional. Um mês depois da posse de Jango, a CIA informava ao presidente John Kennedy que a ideia da volta de Jânio ganhava força. 
O autogolpe de Jânio fez água porque foi um lance solitário, amalucado. Além disso, o vice era João Goulart, mal visto nas Forças Armadas e seu adversário.
Num exercício de passadologia misturada com o presente, se o vice de Jânio fosse um parceiro fiel como o general Mourão e os dois renunciassem juntos, a Constituição de 1988 diz que “far-se-á eleição 90 dias depois”. Ambos poderiam se candidatar, pois se tivessem continuado no cargo estariam habilitados para disputar a reeleição.
Voto e cadeia
De um político que já viu de tudo:
“Logo depois da redemocratização, um candidato foi para o palanque e lembrou que durante a ditadura estivera na cadeia. Terminado o comício, um cabo eleitoral experimentado disse-lhe: ‘Doutor, aqui no nosso bairro evite falar que esteve na cadeia. O pessoal acha que cadeia é lugar de bandido.’”
Debate da Globo
debate da TV Globo teve três surpresas:
— Marina Silva foi a candidata mais valente nos seus golpes ao PT e a Jair Bolsonaro.
— O estilo teatral de Alvaro Dias deu estatura a Fernando Haddad quando ele lhe pediu que tivesse compostura.
— Em dois rápidos momentos, Geraldo Alckmin conseguiu mostrar que é capaz de ter senso de humor.
Disse tudo
A repórter Maria Cristina Fernandes disse tudo em relação à disputa de hoje: “O PT rejeitou a chapa [Ciro-Haddad] porque pretendia fazer da disputa eleitoral um plebiscito sobre a permanência de Lula na cadeia. E permitiu a formação daquele que hoje parece o maior partido do país, o antipetismo.”
Conta
A campanha de Jair Bolsonaro para a eleição de hoje custou-lhe R$ 487 mil, sem tocar no dinheiro do fundo partidário. Na internet ele arrecadou R$ 3,5 milhões. O capitão reformado não tem marqueteiro.
O golpe da Hydro
O salto triplo carpado do juiz Sergio Moro liberando um petisco da colaboração do ex-ministro Antonio Palocci foi coisa de principiante. Golpe mesmo quem deu foi a companhia norueguesa Norsk Hydro fechando sua refinaria de alumina no Pará, ameaçando o emprego de 4.000 pessoas.
A empresa estava discutindo questões ambientais com o governo, com o Ministério Público e com as agências reguladoras. A Norsk Hydro pode até estar com toda razão, mas jogou a bomba quatro dias antes da eleição.
O doutor John Thuestad, vice-presidente da empresa, não faria assim na Noruega.
Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota e acha que um Comitê da ONU pode impor uma candidatura presidencial a uma nação soberana. Por cretino, ele não sabe por que Israel não saiu dos territórios palestinos.
O único consolo do idiota é ver que Fernando Haddad pensa como ele.
Libélulas
Jair Bolsonaro já está sendo rondado pelas libélulas que farfalham em torno das luzes.
Em todos os casos, oferecem serviços gratuitos. Em alguns, isso acaba em CPI.
A força dos EUA
Quem namora uma suposta decadência dos Estados Unidos deve pensar melhor.
A primeira empresa americana a bater o valor de mercado de US$ 1 bilhão foi a U.S. Steel, em 1901. Ela resultou da fusão dos interesses de dois milionários, o banqueiro J. P. Morgan e o industrial Andrew Carnegie. Morgan nasceu rico, mas Carnegie veio do nada.
Hoje duas empresas americanas bateram a marca do trilhão de dólares, a Apple e a Amazon.
Steve Jobs e Jeff Bezos saíram do nada e tornaram-se bilionários pela força de suas ideias. Jobs não foi criado pelo pai. O de Bezos deixou a mulher e ela casou-se com um jovem cubano cuja família deixara a ilha de Fidel e chegara a Miami sem muita coisa além da ajuda da Igreja Católica.
A voz da OAS
Depois de se saber o nome do próximo presidente, será conhecida a colaboração de Léo Pinheiro, o poderoso presidente da empreiteira OAS.
Capitães
A história do Brasil teve dois outros capitães famosos: Luís Carlos Prestes e Carlos Lamarca. Nenhum dos dois trouxe sorte.
Elio Gaspari
Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".