domingo, 30 de setembro de 2018

Difícil convencer o inteligente, impossível convencer o burro, FSP

Enquanto o ingênuo acredita em tudo, o estúpido desconfia de qualquer coisa o que dá mais ou menos no mesmo

“Os políticos que ajudaram a levar Mussolini, Hitler, Perón, Chávez e Erdogan ao poder tinham uma coisa em comum”, diz Steven Levitsky, em artigo pra Folha. “Acreditavam, incorretamente, que seriam capazes de controlá-los.” 
Rico adora brincar de fantoche. Paulo Guedes descreve seu candidato à Piauí como um “sujeito completamente tosco” —por isso, talvez, ideal. Precisavam de um candidato ao mesmo tempo burro, pra implantar um plano econômico impopular, e autoritário, pra caso o plano não desse certo. 
Parece a premissa de uma comédia da Sessão da Tarde, em que ricos escolhem um bobo pra ser laranja —e se arrependem. “Deu a louca na Presidência! Neste verão, Adam Sandler é Bolsonaro, o candidato idiota.”
 
O filme obviamente, é uma bosta. Como diz o personagem de Robert Downey Jr em “Trovão Tropical”: “Never go full retard”. Vale pros atores, também vale pras eleições. 
Nada mais perigoso que a estupidez. O estúpido não ouve. “É difícil convencer uma pessoa inteligente”, diz a máxima. “Mas impossível mesmo é convencer uma pessoa burra.”
Folha descobre que a ex-mulher de Bolsonaro afirmou que ele a ameaçava de morte. A Folha é petista! A Veja apura que ele ocultou patrimônio. A Veja é comunista! 
O estúpido —de direita e de esquerda— é imune à realidade. Há quem confunda a estupidez com ingenuidade, mas enquanto o ingênuo acredita em tudo, o estúpido desconfia de qualquer coisa —o que dá mais ou menos no mesmo.
A realidade se distingue da ficção porque ela não deixa de existir se você não acreditar nela. Não acreditar na facada não impede Bolsonaro de ter feito uma colostomia. Não acreditar que ele fará um governo autoritário não impede ele de já estar sendo autoritário antes mesmo de eleito. 
E lembre-se: ninguém vai ser poupado. Também Carlos Lacerda, um dos líderes civis do golpe de 64, teve seus direitos políticos cassados no AI-5.
Gregorio Duvivier
É ator e escritor. Também é um dos criadores do portal de humor Porta dos Fundos.

Escudeiros de Collor preveem apertos de Bolsonaro para governar, FSP

Não é fácil a vida de um presidente eleito por um partido nanico, que faz fama com ataques à elite política e tem pouca habilidade para costurar alianças. Dois escudeiros de Fernando Collor, que vivenciaram os apertos do poder, anteveem obstáculos que um candidato como Jair Bolsonaro (PSL) pode enfrentar para governar caso seja eleito.
“O Bolsonaro não conhece coalizão. Conhece colisão”, diz Roberto Jefferson (PTB), integrante da tropa de choque de Collor no processo de impeachment de 1992. “Ele vai ter que aprender a construir relacionamentos. Democracia é diferente.”
Jefferson é aliado de Geraldo Alckmin, mas seu partido tende a estar com Bolsonaro num segundo turno contra o PT —com quem rompeu após o mensalão. Ele diz não ver semelhança entre o ex-presidente e o deputado do PSL, e compara: “Collor acabou jogando o jogo. Cedeu ao Congresso até certo ponto. Não sei se será assim com o Bolsonaro”.
​Renan Calheiros, que apoia Fernando Haddad (PT), desconfia. “É difícil que o Bolsonaro construa uma convergência, a não ser que ele faça uma autocrítica sobre o que já defendeu. Considero isso dificílimo.” 
Então deputado, ele foi um dos principais artífices da eleição de Collor e virou líder do governo, até que se sentiu traído e abandonou o barco oito meses depois da posse.
Renan lembra que Collor recebeu apoio do Congresso, mas a lua de mel durou pouco. “No início, aprovou-se tudo porque os partidos queriam ajudar. Depois, começaram as contradições, os desgastes, a rejeição. Ficou todo mundo contra.”
Para Jefferson, o problema de Collor foi a divisão provocada pela eleição de 1989. Renan acredita que o presidente errou ao não propor uma agenda de consenso para compensar a fraqueza de sua sigla, o PRN.
Derrotado no impeachment de Collor, Roberto Jefferson duvida que o Congresso tenha coragem de derrubar o futuro presidente. “O pessoal vai lembrar que o vice não será o Itamar. É Manuela ou general Mourão. Todo mundo vai pensar duas vezes.”
 


    Bruno Boghossian
    Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).

    Besteirol eleitoral, Editorial FSP

    O debate eleitoral ganhou temperatura, e pouco além disso, com uma declaração infeliz do candidato a vice de Jair Bolsonaro (PSL), o general Hamilton Mourão, acerca do pagamento do 13º salário.
    Tão logo veio à tona que Mourão havia criticado a norma trabalhista, durante palestra na quarta-feira (26), o próprio Bolsonaro se encarregou de repreendê-lo publicamente. Seus rivais na reta final do primeiro turno correram, claro, a explorar a trapalhada.
    O 13º não constitui um pesado encargo para as empresas, como parece crer o general, nem uma fabulosa conquista dos assalariados, cuja preservação foi assegurada pelos presidenciáveis adversários. Trata-se simplesmente de definir em quantas parcelas anuais ocorrerá a remuneração.
    [ x ]
    Com o alarido em torno do tema, prestou-se menos atenção à declaração mais tola —ou alarmante— do candidato a vice. Para reduzir as despesas do governo, ele disse, será preciso buscar formas de renegociar os juros da dívida pública.
    Mesmo na hipótese benigna de que Mourão estivesse apenas a oferecer palpites pessoais, desanima observar como persiste a desinformação a respeito dos motivos da ruína orçamentária nacional.
    Decerto que os encargos federais com juros, de R$ 333 bilhões nos últimos 12 meses, estão entre os mais elevados do mundo, se ponderados pelas dimensões da economia do país. O fenômeno, entretanto, é mais consequência do que causa do desequilíbrio das contas do Tesouro Nacional.
    A dívida do governo cresce de forma galopante porque seus gastos essenciais —com pessoal, custeio, programas sociais e investimentos— superam as receitas. Impor taxas menores aos credores, além de não solucionar o déficit, minará a confiança futura no devedor.
    Houve tempo de sobra para aprender com os fiascos do Plano Collor, que em 1990 bloqueou o dinheiro de depósitos bancários lastreados em títulos públicos, e, mais recentemente, da ofensiva de Dilma Rousseff (PT) pela redução forçada dos juros.
    O temor de enfrentar questões áridas, como a expansão acelerada dos gastos com aposentadorias e o custo excessivo do funcionalismo, provavelmente explica por que as candidaturas preferem falar de planos mirabolantes para problemas há muito conhecidos.
    A promessa mais vistosa do petista Fernando Haddad, por exemplo, é isentar do Imposto de Renda ganhos até cinco salários mínimos (R$ 4.777 mensais) —uma invencionice que perverte a ideia correta de que a carga do tributo deve ser maior para os mais abonados.
    Contempla-se na proposta uma faixa muito superior ao rendimento médio do trabalho no país, de R$ 2.225 em agosto. É o que se chama de benefício social mal focalizado, um conceito exaustivamente examinado no início da década passada, em estudos que levaram à virtuosa criação do Bolsa Família.
    Infelizmente, demora-se a aprender também com os acertos.