domingo, 21 de outubro de 2012

Um sucesso para ninguém botar defeito - ELIO GASPARI

A notícia pareceu uma simples estatística: entre 1997 e 2011, quintuplicou a percentagem de negros e pardos que cursam ou concluíram o curso superior, indo de 4% para 19,8%. Em números brutos, foram 12,8 milhões de jovens de 18 a 24 anos.
Isso aconteceu pela conjunção de duas iniciativas: restabelecimento do valor da moeda, ocorrido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e as políticas de ação afirmativa desencadeadas por Lula.
Poucos países do mundo conseguiram resultado semelhante em tão pouco tempo. Para ter uma ideia do tamanho dessa conquista, em 2011 a percentagem de afrodescendentes matriculados em universidades americanas chegou a 13,8%, 3 milhões em números brutos. Isso depois de meio século de lutas e leis.
Em 1957, estudantes negros entraram na escola de Little Rock escoltados pela 101ª Divisão de Paraquedistas.
Pindorama ainda tem muito chão pela frente, pois seus negros e pardos formam 50,6% da sua população e nos Estados Unidos são 13%.
O percentual de 1997 retratava um Brasil que precisava mudar. O de 2011, uma sociedade que está mudando, para melhor. Por trás desse êxito estão políticas de cotas ou estímulos nas universidades públicas e no ProUni.
Em seis anos, o ProUni matriculou mais de 1 milhão jovens do andar de baixo, brancos, pardos, negros ou índios. Deles, 265 mil já se formaram. Novamente, convém ver o que esse número significa: em 1944, quando a sociedade americana não sabia o que fazer com milhões de soldados que combatiam na Europa e no Pacífico, o presidente Franklin Roosevelt criou a GI-Bill.
Ela dava a todos os soldados uma bolsa integral nas universidades que viessem a aceitá-los. Em cinco anos, a GI-Bill matriculou 2 milhões de jovens. Hoje entende-se que a iniciativa foi a base da nova classe média americana e há estudiosos que veem nela o programa de maior alcance social das reformas de Roosevelt.

MANGUINHOS, JOIA DA COROA OU GUARDANAPO
A desapropriação dos 500 mil metros quadrados da refinaria de Manguinhos pode se tornar uma das joias da coroa da administração do governador Sérgio Cabral. Tudo bem se a indenização tiver que cobrir os impostos que a empresa deve (só de ICMS são R$ 675 milhões, bem como seu passivo trabalhista).
Se os donos de uma refinaria obsoleta que contamina o ambiente e envenena o solo embolsarem algo como R$ 200 milhões, será um caso de guardanapo na cabeça. Essa decisão, contudo, caberá ao Poder Judiciário.
Manguinhos fica dentro da cidade e degradou a região de tal forma que está cercada por comunidades miseráveis.
A ideia de usar seu terreno para recuperar a região poderá resultar na pacificação urbanística do que hoje é a favela de Ramos. Seria uma intervenção do tamanho da revitalização da zona portuária, mesmo sem o seu charme.
Não se deve subestimar os poderes da turma de Manguinhos, estabelecida quando o presidente Getúlio Vargas alavancou seu primeiro dono, o empresário Peixoto de Castro. Recentemente, os novos controladores tiveram novos anjos da guarda, os comissários Marcelo Sereno e José Dirceu, mais a bancada dos precatórios do PMDB.
Nos anos 50, a turma do refino privado foi incomodada no Conselho Nacional do Petróleo por um economista e um coronel. Deram um trato ao economista (Jesus Soares Pereira) cassando-o em 1964. Ao coronel, ofereceram a presidência da Petrobras no governo JK, desde que ficasse quieto. Como ele não ficou, derrubaram-no.
Faltou-lhes a sorte. O coronel Ernesto Geisel tornou-se presidente da Petrobras e da República. Ele gostava de contar como foi atrás deles.

ARQUIVO
José Roberto Arruda, ex-governador de Brasília e ícone do mensalão do DEM, voltou a falar:
"Só digo uma coisa: não apareceu nem metade da missa".
Como diria Camila Pitanga: "Fala, Arruda".

O CONTRADITÓRIO
A revista "Retrato", dirigida pelo repórter Raimundo Rodrigues Pereira, chegará às bancas nesta semana com uma capa intitulada "A vertigem do Supremo". Ela afirma que os ministros do STF deliraram ao aceitar a tese segundo a qual houve um desvio de R$ 76,8 milhões do Banco do Brasil para a turma do mensalão. A reportagem sustenta que não há trabalho contábil de fé que ampare essa acusação e coloca no site da revista 108 documentos (cada um com cerca de 200 páginas) da auditoria feita pelo banco.
Com mais de 40 anos de carreira e obsessões investigativas, Raimundo já contrariou a sabedoria convencional em duas ocasiões. Há dois anos, provou que o banqueiro Daniel Dantas foi satanizado pelo delegado Protógenes Queiroz na Operação Satiagraha. Nenhum dos fatos que mencionou foi desmentido.
Em 1996, ele investigou as denúncias de má conduta profissional feitas contra a cientista brasileira Teresa Imanishi. Tinha do outro lado um Prêmio Nobel e o governo americano. Prevaleceu e depois de dez anos a cientista foi inocentada, com pedidos de desculpas do "New York Times" e do "Washington Post".

AVISO AMIGO
Quando o ministro Joaquim Barbosa assumir a presidência do Supremo deverá ter uma preocupação. Ele sabe que não é estimado pelos colegas. O que talvez não saiba é que muitos deles não pretendem levar desaforo para casa.

PESADELO AMERICANO
Sempre que a eleição americana marcha para um final apertado ressurge o fantasma do empate no colégio eleitoral.
Desta vez existe a remota possibilidade de Barack Obama e Mitt Romney empatarem, cada um com 269 votos, no colégio eleitoral.
Nesse caso, a escolha irá para uma assembleia de 50 eleitores (um para cada Estado) e tudo indica que Romney saia vitorioso, pois os republicanos tendem a manter a maioria na Câmara dos Representantes.
Se esse cenário improvável ocorrer, a crise de 2000, quando George Bush 2º prevaleceu sobre Al Gore, será vista como uma mixaria, sobretudo se o companheiro Obama conseguir mais votos populares.
A democracia americana sairá mal da foto. Olhando-se para seus últimos oito presidentes, três passaram por processos anômalos. Bush 2º ganhou a Casa Branca na Corte Suprema, Richard Nixon foi obrigado a renunciar, e John Kennedy foi assassinado.
(A possibilidade do empate e a discussão do processo eleitoral estão descritos no site "Sabato's Crystal Ball". Apesar de ter escolhido nome bobo, o professor Larry Sabato, da Universidade da Virgínia, é um respeitado estudioso das eleições americanas.)

EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e muda de opinião a cada dia.
Às segundas, quartas e sextas é favorável ao "kit anti-homofobia". Às terças, quintas e sábados é contra.
Em todos os casos, por idiota, acredita que essa discussão criará mais escolas, creches e hospitais na cidade de São Paulo . Por quê? Eremildo não sabe, mas está procurando quem saiba.

É a inflação, não os juros - HENRIQUE MEIRELLES


FOLHA DE SP - 21/10

Fala-se muito de juros no Brasil, particularmente da Selic, a taxa básica da economia estabelecida pelo Banco Central. Ela tem estado acima dos padrões internacio-nais desde a estabilização de 1994, apesar de já ter caído bastante. E sua queda é um desejo da sociedade.

Assim, por que o Banco Central sobe os juros ao invés de só baixá-los até atingir níveis internacionais?

A experiência internacional mostra que o manejo da taxa base de juros é o instrumento de controle da inflação mais eficaz e o que gera menores distorções na economia. Quando a inflação sobe, o BC, subindo os juros, influencia a demanda, a atividade econômica e a inflação por diversos mecanismos, chamados canais de transmissão, como o crédito, o câmbio e as expectativas de inflação, entre outros.

Vamos tomar como exemplo a expectativa de inflação na sociedade. Quanto mais baixa for, menor precisa ser o juro para combatê-la. Quando a sociedade se convence de que a inflação estará na meta, os agentes econômicos tendem a reajustar seus preços em linha com a meta, e não acima dela, o que demandaria juros mais altos, com maior custo à população.

O Brasil tem história de hiperinflação e periódicas crises fiscais e cambiais. Essas são as principais razões que levaram as taxas a ficarem tão elevadas por tanto tempo. Depois de anos de hiperinflação, comerciantes, empresários e trabalhadores demandavam aumentos de salários e preços muito mais altos, mesmo com a economia já estabilizada. Para quebrar essa mecânica de inércia inflacionária, o BC teve que fixar taxas mais elevadas que em outros países.

A boa notícia é que, no momento em que o país começou a ganhar a luta contra a inflação, as expectativas de inflação começaram a cair e, por consequência, as taxas de juros também.

Por que tivemos êxito? Por vários fatores: 1) a inflação ficou na meta por muitos anos, diminuindo o risco de descontrole; 2) a situação fiscal melhorou muito, principalmente pela queda dos juros e dos custos de financiamento do Tesouro; 3) a melhora nas contas públicas reduziu a dívida pública; 4) as reservas internacionais aumentaram de forma exponencial; 5) a capacidade de exportar cresceu.

A melhor maneira de derrubar a taxa de juros de forma sustentável, sem gerar inflação à frente ou outros riscos, é assegurar à sociedade que não só o governo seguirá atuando para controlar a dívida pública, mas, principalmente, que o BC tomará as medidas necessárias para manter a inflação na meta.

Ironicamente, portanto, a melhor maneira de derrubar as taxas de juros é não se preocupar tanto com as taxas de juros, e sim com a inflação.

O STF dará o tom - DENISE ROTHENBURG




CORREIO BRAZILIENSE - 21/10


O Supremo Tribunal Federal (STF) está a poucos dias do fim do julgamento da Ação penal 470, vulgo mensalão, mas ainda ficará muito tempo dedicado a temas políticos. Se brincar, deflagrará em breve até a reforma política, tão propalada aos quatro ventos — e que nunca sai do papel. Há alguns anos tramita ali a Arguição de Preceito Fundamental 161, feita pelo PR, para tentar barrar o parágrafo segundo do artigo 109 da Lei Eleitoral. Esse artigo hoje define parte da distribuição das vagas de deputados federal e estadual, e vereadores entre os partidos.

Apenas para lembrar àqueles menos acostumados aos meandros da política, o quociente eleitoral é obtido quando se divide o número de votos válidos pela quantidade de vagas. Obviamente, “sobram” algumas dessas vagas. Essas sobras, em vez de serem distribuídas entre todos os partidos que participaram do pleito, terminam nas mãos dos maiores, que atingiram o quociente eleitoral. Isso porque a Lei Eleitoral em seu artigo 109 parágrafo segundo diz o seguinte: “Os lugares não preenchidos com a aplicação dos quocientes partidários serão distribuídos mediante observância das seguintes regras: (…) § 2º — Só poderão concorrer à distribuição dos lugares os partidos e coligações que tiverem obtido quociente eleitoral”.

Em São Paulo, por exemplo, o quociente foi de 103.843 votos. Se um partido fizer 208 mil votos, tem direito a duas vagas na Câmara municipal. Se alcançar 210 mil, fica com as duas e ainda tem direito a ver se pega mais uma nas “sobras” da conta. O PDT, por exemplo, obteve perto de 97 mil votos, somando os de legenda e os recebidos por seus candidatos. Ainda que essa votação seja maior do que a sobra de votos de alguns partidos depois de distribuídas as vagas pelo quociente, o PDT não terá direito a uma vaga na Câmara de vereadores, ainda que tenha mais votos do que a “sobra” daqueles que já conquistaram vagas pelo quociente.

Essas “sobras”, mal ou bem, têm ampla repercussão no Congresso e nas câmaras municipais. Vejamos, por exemplo, o caso do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP). Ele voltou ao Congresso guindado por Tiririca. Já outros que obtiveram mais votos do que Valdemar terminaram fora. Nas câmaras de vereadores pelo país afora, essa situação se repetiu este ano.
Dentro do Congresso, há quem veja na simples revogação do parágrafo 2º, o embrião da reforma política. Pelo menos, depois de feita a distribuição das vagas pelo quociente eleitoral, as que restassem estariam acessíveis a todos os partidos e quem obteve mais votos estaria eleito. Haveria assim, na avaliação de políticos, e até de alguns ministros do STF, mais respeito à vontade do eleitor.

O relator da ADPF 161, ministro Celso de Mello, um dos decanos da Casa, dificilmente terá tempo de colocar o tema em pauta antes de se aposentar. É pena. Mas, no Congresso, onde a reforma política permanece encantada, muitos acreditam que será o Supremo, ao analisar esse dispositivo da Lei Eleitoral, o motor propulsor. E deve ser logo, enquanto 2014 ainda está longe no calendário, mas não nas articulações políticas.

Enquanto isso, nos palanques…

Nesses sete dias que restam até o segundo turno das eleições, o humor do eleitorado apresenta um equilíbrio. Nas capitais, o mesmo PT que desponta com maiores chances em São Paulo contra o PSDB de José Serra, passa aperto em Salvador contra o DEM de ACM Neto. Não por acaso, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se reuniu com o senador Aécio Neves (PSDB-MG) na última semana, levantando o Nordeste como terra promissora.

Está cada vez mais claro para os tucanos que São Paulo será terra em litígio em 2014, sem que tucanos ou petistas saiam com uma ampla vantagem. Logo, quem quiser enfrentar a disputa presidencial com alguma chance, tem que fincar bandeiras em outras praças, em especial no Nordeste. Lá, seis das nove capitais têm segundo turno no próximo domingo. Não é à toa que os petistas concentram esforços em Salvador e prometem levar Lula a João Pessoa e a Fortaleza, onde o adversário é o PSB dos irmãos Cid e Ciro Gomes. Sinal de que a batalha pela região no mercado futuro já começou, assim como o horário de verão. Não esqueça de ajustar seu relógio.