segunda-feira, 29 de dezembro de 2025

Oficiais de Justiça procuram liquidante do Master no escritório do banco, FSP

 Adriana Fernandes

Brasília

Dois oficiais de Justiça estiveram no Banco Master, em São Paulo, à procura do liquidante da instituição, Eduardo Félix Bianchini, antes do feriado do Natal, alimentando a expectativa de que ele seja intimado para prestar esclarecimentos nos próximos dias.

Servidor aposentado do Banco Central e escolhido pelo regulador para cuidar da liquidação do banco de Daniel Vorcaro, Bianchini passou o Natal com a família fora de São Paulo e não estava no escritório durante a visita dos oficiais.

Bianchini se transformou em alvo da defesa de Vorcaro, que tenta, junto ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao TCU (Tribunal de Contas da União), buscar a anulação da liquidação.

Ministro do STF Dias Tofolli - EVARISTO SA/AFP

Com acesso aos dados do Master, o trabalho do liquidante vai mostrar, quando concluído, todos os contratos e pagamentos feitos pelo banco a prestadores de serviço, inclusive a advogados que trabalharam na defesa da instituição.

Master contratou o escritório de familiares do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), por R$ 3,6 milhões mensais para auxiliar na defesa dos interesses da instituição, de acordo com o jornal O Globo.

O risco de Bianchini ser chamado a dar esclarecimentos no imbróglio jurídico em torno da liquidação entrou no radar depois que a defesa do Master acusou o BC de ter usado o liquidante para obter informações do banco liquidado.

A informação consta em petição encaminhada ao ministro Jhonatan de Jesus, do TCU, como mostrou uma reportagem do portal Metrópoles.

O ministro Dias Toffoli, do STF, decidiu fazer uma acareação entre Vorcaro e Paulo Henrique Costa, ex-presidente do BRB (Banco de Brasília), com a presença do diretor de fiscalização do BC, Ailton de Aquino Santos. A acareação está marcada para 30 de dezembro.

Procurado, Toffoli negou por meio da sua assessoria que tenha partido dele o envio de oficiais de Justiça para intimar o liquidante do Master. O ministro informou que, neste momento, estão mantidos apenas os três nomes já divulgados pelo STF para a acareação.

O ministro Jhonatan de Jesus também tem colocado pressão em uma ação que tem restringido a atuação dos próprios técnicos da Audbancos (Auditoria Especializada em Bancos Públicos e Reguladores Financeiros), unidade do TCU responsável por fiscalizar bancos públicos e instituições financeiras no Brasil, segundo relatos de dois servidores do tribunal ouvidos pela reportagem.

Jesus determinou ao BC que se manifeste sobre supostos indícios de precipitação na liquidação do Master. A assessoria do TCU não foi encontrada neste domingo (28) e não retornou um pedido de comentários enviado por email. O tribunal colocou em sigilo o processo que analisa uma possível omissão do BC em operações do Master.

Folha ouviu um técnico da velha guarda do BC, já aposentado, com larga experiência em liquidação de bancos sobre o caso Master. Segundo ele, uma eventual interferência do STF e da corte de contas no trabalho do liquidante seria uma ação sem precedente. O ex-servidor, que trabalhou nos casos mais ruidosos de quebra de bancos, vê por trás dessas movimentações uma tentativa de intimidação do trabalho de liquidação do Master.

O ex-diretor do BC Luiz Fernando Figueiredo avalia que TCU e STF têm pouca noção do que estão fazendo nessa movimentação envolvendo o Master. "Eu nunca tinha visto. O que está sendo pedido são coisas que não têm sentido", disse. Segundo ele, o BC tem todo o poder legal para fazer a liquidação.

Para ele, a fraude do banco de Vorcaro foi tão grande que não há como ser contestada. "Foi uma fraude gigante. Não foi decisão de um diretor, mas de todo um colegiado a partir de um volume de documentação muito robusto."

Procurado pela Folha, o advogado Walfrido Warde, que atua na defesa de Vorcaro, respondeu que está fora do Brasil e que auxiliares entrariam em contato para responder aos questionamentos. Até a publicação desta reportagem não houve retorno dos advogados ao pedido de informações.

domingo, 28 de dezembro de 2025

A revolução copernicana da inteligência, Álvaro Machado Dias, FSP

 Chamamos de inteligência a propriedade das coisas que se parecem conosco. Durante séculos, esse critério funcionou bem. Reconhecíamos inteligência onde havia linguagem, intenção explícita e, conforme as neurociências avançavam, um sistema nervoso centralizado. Porém, esse começo de século se encarregou de escancarar o quanto estávamos errados.

Planárias aprendem por associação a se distanciar de locais não seguros e depois são decapitadas. Após alguns dias, um novo cérebro se forma e a resposta aprendida reapareceLagartas fazem o mesmo, evitando odores associados a ameaças. Em seguida entram em metamorfose. Seu sistema nervoso é dissolvido e um outro ressurge para a vida aérea. Como uma alegoria do karma, a borboleta passa a evitar os riscos que um dia a lagarta conheceu.

Lagarta sobre imagem de borboletas em Cuyabeno, na amazônia equatoriana - Daniel Munoz - 21.abr.24/AFP

Animais treinados têm RNA extraído de seus tecidos. Esse material é injetado em espécimes não treinados. O resultado muda de forma compatível com a experiência original.

Existe um mito persistente de que neurônios seriam a condição sine qua non do comportamento inteligente. O que Michel Levin mostrou é que outras redes celulares também filtram ruído e orientam condutas, apenas de maneira mais lenta e menos especializada. O princípio é o mesmo, o substrato é que varia.

Em organismos regenerativos, a remoção de suas partes leva sempre ao mesmo resultado, o que é uma tremenda adaptação. Mas basta alterar o estado fisiológico da criatura antes do corte para que o resultado mude. Dali em diante, o animal insistirá nesse novo padrão, revelando que a forma em si passou a funcionar como memória na reconstrução.

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Até fora dos limites da vida há rudimentos desse princípio. Em reações químicas oscilantes, como a de Belousov-Zhabotinsky, o sistema exibe memória: seu estado futuro depende de sua história. Funcionalmente, isso é processamento de informação, aqui ocorrendo sem um alguém.

A razão para essas coisas é clara. A inteligência está mais para uma coleção de gambiarras extraídas das propriedades do mundo do que para uma condição existencial de seres assim ou assado. A reação química tem um quê de aprendizado porque os recursos moleculares de que este emerge precedem a própria vida.

O perigo de ignorar essas sutilezas é ser sugado por um dogmatismo pré-copernicano, no qual a centralidade humana não é argumento, mas pressuposto. É o que ocorre no debate sobre inteligência artificial, quando se repete, como fazem Noam Chomsky e tantos outros, que a máquina "não pensa" (o que é verdade) e disso se deduz que não pode ser inteligente.

O erro aqui é confundir posição funcional com privilégio ontológico, assumindo que as coisas precisam seguir o roteiro que conhecemos —no caso, com neurônios biológicos produzindo imagens mentais e consciência— para caberem nas categorias com que tentamos ordenar o mundo. Só que a inteligência nunca prometeu seguir esse roteiro.

IAs aprendem, generalizam e corrigem erros. Acima de tudo, usam o passado para se orientar ao futuro, ainda que não tenham a menor ideia do que isso significa. O mal-estar que causam é o mesmo que assolava o intelectual europeu do século 16. Acontece que, tal como o universo nunca foi guiado pela Terra, a inteligência está longe de ser um constructo estável e menos ainda uma propriedade só humana.

Becky S. Korich - Desejos fúteis e úteis para o seu 2026, FSP

 Última coluna do ano. Estou aqui pensando em você, minha querida leitora, meu querido leitor, que esteve presente na minha vida o ano todo, e aproveito o espaço para dedicar esta coluna a você.

Meus desejos não param no fundamental —saúde, sustento, amigos, amores—, vão também para o que parece menor. Para os detalhes que podem salvar ou estragar o dia. Para as micro-escolhas. Para aqueles poucos minutos escondidos dentro dos 1.440 minutos das 24 horas —que podem definir os seus próximos 24 anos.

Que em 2026 você acorde e durma com o mesmo tamanho de barriga. Que o tempo avance no seu corpo com delicadeza. Que alguma música nova te arrepie. Que os exames venham positivos quando forem para ser, e negativos quando não. Que os rins saibam filtrar o que não serve. E os ouvidos também.

Quatro pessoas posam para foto em frente a um letreiro iluminado com os números '2026' em Times Square, Nova York, ao entardecer. Duas pessoas tiram a foto, e ao fundo há painéis digitais e edifícios altos.
Letreiro de 2026 na Times Square, em Nova York, nos Estados Unidos - Zhang Fengguo - 22.dez.25/Xinhua

Que o Wi-Fi funcione. Não te falte nada: tinta na impressora, bateria no celular, pilha no controle remoto, memória, argumentos. Que o sistema não caia na sua vez. O papel higiênico não acabe na sua vez. O elevador chegue rápido quando estiver apertado. O pagamento não atrase quando estiver no aperto.

Não chegue muito cedo nem muito tarde. Se estiver solteiro, que encontre o amor. Se comprometido, que não se desencontre do amor. Que saiba quando ficar e quando ir embora. Que o desejo apareça ao mesmo tempo e ninguém precise fingir que está dormindo.

Sem colisões —nem no trânsito—, sem multas e radares para te flagrar. Que você não flagre quem confia. Não dependa de likes. Que venham sempre as palavras certas. Que não deixe escapar provocações bobas, que podem deflagrar brigas que nunca se sabe onde vão parar.

Que consiga segurar o riso nas horas inadequadas e consiga rir quando for para rir. Esquecer quando for para esquecer e lembrar quando for para lembrar. Que não te dê branco do nome da pessoa que atravessa a rua para te abraçar. Que as senhas sobrevivam na sua memória.

Que a tampinha da lata de cerveja não se quebre no meio do caminho. A roda do carrinho do supermercado não esteja torta. O zíper não prenda. A sola do sapato não descole. O botão não estoure. Equilíbrio. Que tenha o peso ideal, com uma margem de 2% para mais ou para menos. Que pessoas pesadas fiquem longe, sem margem de erro.

Que o plástico-filme da cozinha não grude. A comida não queime, a pele não queime, o filme não queime. Nenhuma reforma no prédio, só boas mudanças. Que você não torça o pé. Ninguém torça o nariz pra você. Que o time que você torce vença de virada (e que seja o mesmo que o meu).

Que nenhum bicho te pique, mordida só das boas. Que a coceira nas costas não se instale onde a mão não alcança. Menos grupos de Whatsapp, menos mensagens de voz. Que o outro lado dos dois tracinhos azuis te responda prontamente.

Que nada se perca: hora, paciência, chave, piranha do cabelo. Que não se acumulem jornais por ler, e-mails por responder e DRs para resolver. Que o sabonete não escape da sua mão no chuveiro do clube. Um ano sem micos nem micoses. Sem refluxo nem assuntos que voltam queimando. Sem unha encravada nem gente travada.

Boas viagens —e viagens boas. Que os portões que importam se abram. Sem turbulências no ar e no solo. Só pequenos sustos. Que nenhuma conexão se perca.

Que você ria, pelo menos uma vez, em todos os 365 dias de 2026.

Desejo, enfim, que todas as coisas menos importantes deem certo, para que as mais importantes se sustentem.

Feliz Ano!