sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

Como explicar crença nos Bolsonaro, vistos como burros?, Bernardo Carvalho- FSP

 Leio no site da revista The New Yorker que já não é possível explicar o bolsonarismo (ou qualquer outra aberração lógica) pela teoria da dissonância cognitiva, conceito-chave da psicologia social dos anos 1950 e que desde então tem servido para explicar quase tudo o que parece incompreensível no comportamento humano.

O conceito foi afinado com base na pesquisa sobre uma seita de lunáticos que acreditavam em discos voadores. A recente divulgação do arquivo pessoal de um dos três autores do estudo de 1956, Leon Festinger, revelou entretanto que suas conclusões estavam contaminadas por uma série de falhas e inconsistências do trabalho de campo.

A imagem mostra um homem parcialmente visível, com a parte superior do corpo e o rosto aparecendo através de uma grade. Ele está usando uma camisa azul e tem cabelo escuro. O fundo é escuro, e a luz incide sobre seu rosto, destacando suas características. A grade cria um efeito de sombras sobre ele.
Jair Bolsonaro em sua casa, em Brasília - Gabriela Biló - 27.ago.25/Folhapress

Pena. Como explicar que ainda haja quem acredite que Trump nada tem a ver com as maquinações sexuais de Jeffrey Epstein ou que Bolsonaro e seus comparsas são vítimas inocentes da justiça? Ou que Silas Malafaia e Sóstenes Cavalcante representam os interesses de Deus na Terra? Ou que os Bolsonaro vieram para salvar o Brasil da corrupção e da bandidagem?

A seita em questão havia recebido mensagens de alienígenas sobre a iminência de uma enchente que submergiria a América do Norte nas águas do Apocalipse. Houve quem largasse o emprego e limpasse a conta no banco para segui-los. Quando a profecia falhou, passaram à evangelização.

Uma das principais e mais surpreendentes hipóteses da teoria da dissonância cognitiva diz que, contrariados pelos fatos, os indivíduos dobram a aposta na crença, num esforço de redução de danos psicológicos, compensando pelo trabalho de evangelização e pela difusão do autoengano a frustração provocada pela realidade. Como se bastasse convencer e arrebanhar o maior número de seguidores para dobrar o real à sua loucura.

A dissonância cognitiva explica a burrice como um mecanismo compensatório. Os que mais perdem com o engodo são também os que têm mais dificuldade de reconhecer a própria cegueira. Quanto mais descarado o logro, quanto maior o engano, mais insuportável para a vítima o encontro com a luz e a visão. Parece um tanto tautológico, mas tudo bem.

Agora, como fica o pessoal da dosimetria e do esforço pela redução das penas do 8 de Janeiro, ao basear a argumentação de sua defesa na dissonância cognitiva dos condenados que avançaram com sanha destruidora contra as instituições democráticas, mas estariam inconscientes de que participavam de uma tentativa de golpe de Estado maquinada por seu líder?

Se, cientificamente falando, já não é possível atribuir à dissonância cognitiva o ímpeto suicida dos congressistas que advogam pela inocência de quem os atacou em sua própria casa e em sua própria razão de ser, só nos resta reconhecer-lhes a má-fé e a cumplicidade com a bandidagem contra a qual os Bolsonaro sempre brandiram seu patriotismo, enquanto conspiravam para pilhar o país.

O problema da explicação da dissonância cognitiva é, como se percebe, a circularidade. E uma certa tendência a servir de pau para toda obra. Bastaria aos criadores do conceito uma breve visita ao Congresso Nacional para, confrontados com a realidade, serem obrigados a dar o braço a torcer ao problema pouco circular do oportunismo político e da ganância.

Dizem que os Bolsonaro são burros. Como explicar, então, que ainda haja quem dobre a aposta neles, e que de burro não tem aparentemente nada, senão por um cálculo que o desautoriza moralmente como político e ser humano, mas que também lhe garante que não haverá consequências, graças à dissonância cognitiva dos eleitores?

Se, como defende a teoria, quem mais perde com o logro é também quem tem mais dificuldade de enxergar, que é que falta aos espertos? É fácil aplicar a teoria da dissonância cognitiva aos outros quando somos nós que acreditamos ver. Em que pese a tautologia do conceito, parece que ele ainda é capaz de explicar o comportamento suicida dos que creem que nunca perdem.

Prepotência pôs Alexandre de Moraes no topo da lista de malas do ano, Mario Sergio Conti - FSP

 A política disputa com a Sansonite o galardão de maior produtora de malas do Brasil. É uma praga mundial, quem sabe interestrelar: eis aí o narcisista e desonesto Donald Trump, exemplo escarrado do que a política se tornou, impondo seu obsceno corpanzil a terráqueos e alienígenas.

Com isso, políticos hipertrofiam a lista dos malas do ano, perturbando a sensata gente que não se liga em baixarias. O adágio atribuído a Platão tem seu grão de verdade: quem não gosta de política é governado pela choldra que gosta. Aos políticos, pois, mas sem ranhetice. Desprezá-los é uma forma de crítica, senão de vingança.

Uma pessoa caminha da direita para esquerda da ilustração, ela carrega uma bolsa tira colo, uma mala de mão e outra mala de rodinhas. A pessoa está vestida com trajes de verão: camisa verde, shorts azul e chinelo de dedo verde. 
Ilustração de Bruna Barros para coluna de Mario Sergio Conti de 27 de dezembro de 2025 - Bruna Barros

Hugo Motta
Ninguém sabia da sua existência até ontem, salvo o povo bom e amigo de Patos, na Paraíba, que há três gerações elege estropícios do clã Motta. Tornou-se deputado aos 22 anos e não largou mais o uniforme de janota e a rapadura. Como não se lhe conhece uma ideia, requisito imperativo para triunfar no Poder Legislativo, elegeu-se cacique da Câmara. Sua obra mais vistosa é o topete, mantido à força de barris de gomalina trazidos da Paraíba por comboios de jamantas.

Davi Alcolumbre
Sabe-se vagamente quem é porque veste os ternos mais amarfanhados de Brasília, além de presidir o Senado, ao que parece pela segunda vez. Tentou se formar economista na sua Macapá natal e em boa hora malogrou —um a menos!— virando vendedor de não se sabe o quê. Homem de princípios de aço, enalteceu Bolsonaro em prosa e verso e exalta Lula em verso e prosa. Na hora do vamos-ver, quebrou lanças em defesa de Aécio Neves, mala metafórico vidrado em malas literais.

Eduardo Bolsonaro
O zero à esquerda dispensa apresentações. Mas relembre-se que iniciou sua pândega carreira quando papai mexeu os pauzinhos e foi nomeado escrivão de polícia em Guajará-Mirim, o segundo maior município de Rondônia —pensa que o Bananinha é pouca porcaria?

Michelle Bolsonaro
A prisão de sua cara metade lhe avivou o ar de megera. O casal traz à memória o dito de Samuel Butler, escritor britânico do século 19: "Deus foi bom ao casar o sr. Carlyle com a sra. Carlyle, fazendo duas pessoas infelizes em vez de quatro". Nossa literatura melhoraria muito se, para fazer troça dos Bolsonaro, Reinaldo Moraes plagiasse o darwinismo de Butler em "O Caminho de Toda Carne".

PUBLICIDADE

Sóstenes Cavalcante
Mergulhou num lago de óleo de peroba para lustrar a cara de pau. A polícia achou R$ 470 mil em espécie num flat do prócer bolsonarista e ele disse que esqueceu de pôr a dinheirama no banco devido à "correria do trabalho". Vá trabalhar assim no raio que o parta.

Fábio Jr.
Chega de políticos, ô raça! Tutty Vasques disse tudo: "Toda vez que entra no ar o comercial da Amil com o Fábio Jr. cantando ‘Pai’, que Deus me perdoe, tenho vontade de dar um tiro na televisão e matar o velho. Anota aí: no meu governo, conto de fadas sobre plano de saúde em propaganda enganosa será considerado crime hediondo inafiançável."

Ivete Sangalo
É uma mala que não fecha, tantos são os badulaques que leva. Frango, tintura para cabelo, sidra, remédio, comida congelada, um troço chamado Piracanjuba, viagens, cerveja, banco, eletrodoméstico, café, sabonete —anuncia de tudo. É ligar o rádio, ou a televisão, ou o celular, ou o computador e lá está ela, engabelando os bugres. Nem com a bufunfa de Sóstenes Cavalcante daria para comprar tudo o que propagandeia.

Neymar
Abandonou o futebol há mais de uma década, mas não há quem lhe tire o título de jogador mais ranzinza da Via Láctea desde o Big Bang.

Galvão Bueno
Tem gente que não liga o desconfiômetro nem toma simancol. Já deu, é hora de pendurar as chuteiras e parar de aporrinhar o próximo.

Dias Toffoli
Acreditou-se que atingiu o ápice da sabujice ao impedir Lula de ir ao enterro do irmão. Santa ingenuidade. Assim que Lula foi eleito, ajoelhou-se a seus pés, açoitou-se, verteu lágrimas de crocodilo e implorou perdão. Agora, em junho, superou-se e foi de jatinho com uma turma de tipos suspeitos ver um jogo no Peru. Como os maus vinhos, piora com o passar dos anos. Logo, logo vira vinagre.

Alexandre de Moraes
Ao apagar das luzes de 2025, atropelou o páreo e abiscoitou a taça de mala do ano. Aliás, não é um mala, e sim um contêiner de prepotência e arrogância. Como se acha acima da gentalha maledicente, não se digna a esclarecer se sua mulher assinou um contrato de R$ 129 milhões com o Bando Master. Almeja ser estátua equestre.