terça-feira, 25 de novembro de 2025

Quem ocupará os milhões de novos empregos verdes?, FSP

 

Pedro Hartung

CEO da Alana Foundation e Diretor de Políticas e Direitos da Criança do Instituto Alana

Lideranças de todo o planeta, capitaneadas pelos esforços brasileiros durante a COP30, em Belém, debatem metas, ferramentas tecnológicas e fontes de financiamento para viabilizar a tão necessária transição climática em mitigação e adaptação.

Entretanto, mesmo diante da crescente importância dada ao tema e da significativa projeção de novos empregos verdes, um ponto essencial permanece invisível ao debate público: a educação baseada na natureza.

O mundo avança para uma economia de baixo carbono e de restauração ecológica. Estimativas como as do relatório Returns on Resilience (Retornos sobre a Resiliência), da consultoria Systemiq, apontam que países emergentes poderão gerar até 280 milhões de novos empregos verdes até 2035.

A imagem mostra um vasto campo de painéis solares dispostos em fileiras organizadas, cobrindo uma grande área de terra. O céu está parcialmente nublado, e a paisagem ao fundo é composta por uma extensão de terreno plano.
Imagem aérea mostrando as placas solares do maior parque de geração de energia solar da América do Sul, localizado em Janaúba (MG). A área é dedicada à produção de energia sustentável, com a pecuária cedendo espaço para a instalação das placas fotovoltaicas - Eduardo Anizelli/Folhapress

São vagas que exigirão profissionais que dominem as chamadas green skills —competências necessárias para criar e adaptar produtos, serviços e processos às transformações decorrentes das mudanças climáticas.

E, por sua combinação única de biodiversidade, agricultura tropical, estoques florestais e potencial de bioeconomia, o Brasil é o país mais bem posicionado do mundo para ocupar muitos desses postos. Há, contudo, um obstáculo primordial em nosso caminho: o déficit na formação em ampla escala desses profissionais.

economia verde requer profissionais capazes de compreender ciclos ecológicos, manejo de água, biodiversidade, agricultura sustentável, recuperação de ecossistemas e tecnologias verdes. Essa compreensão não surge de maneira repentina, no ensino técnico ou universitário.

Ela nasce no quintal da escola, na sombra de uma árvore, no plantio de uma horta, na observação de insetos, em projetos de ciência cidadã. É da experiência concreta com a natureza, logo na infância, que se constrói o repertório que sustenta a transição climática. Não protegemos ou criamos soluções para aquilo que não conhecemos e não amamos.

A realidade, no entanto, é bastante distinta. Crianças brasileiras passam, em média, menos de 2% do tempo ao ar livre, e muitas escolas, especialmente nas capitais, não têm uma única área verde. Esse "déficit de natureza" compromete saúde, atenção, aprendizado e, sobretudo, o vínculo das novas gerações com o meio ambiente.

No mercado de trabalho, o descompasso é semelhante. Profissões essenciais desse novo ciclo, como restauradores florestais, gestores de bacias hidrográficas, especialistas em soluções baseadas na natureza, técnicos em biodiversidade, guardiões territoriais, bioeconomistas, geógrafos, biólogos e agrônomos, ainda são subvalorizadas ou nem sequer reconhecidas formalmente —caso emblemático dos agroecólogos.

É preciso, portanto, atualizar valores, marcos regulatórios e uma cultura educacional que ainda coloca a natureza como um tema lateral. A Educação Baseada na Natureza (EBN) aponta um caminho possível: aprender com e na natureza, do berçário à universidade.

Isso começa com escolas que ofereçam sombra, árvores, hortas, água, espaço vivo —e com currículo e educadores preparados para transformar esses ambientes em oportunidade de aprendizagem.

Avança no ensino médio e técnico, quando itinerários formativos em energias renováveis, agroecologia, sistemas agroflorestais, gestão de resíduos, monitoramento ambiental e restauração ecológica ganham espaço.

Esses percursos educativos podem aproximar estudantes de problemas reais dos territórios, em parceria com institutos federais, SENAI, SENAR e universidades.

O movimento também se consolida no ensino superior, com o reconhecimento oficial da profissão de agroecólogo, a expansão de cursos em bioeconomia, florestas e clima, e o incentivo à pesquisa aplicada em tecnologias socioambientais.

Alunos ticunas durante aula do curso de Agroecologia da Universidade Estadual do Amazonas em Tabatinga. Esse curso foi criado pela universidade especialmente para atender os indígenas das comunidades da região - Lalo de Almeida/Folhapress

Nada disso avançará, contudo, sem o papel decisivo do Estado e um alinhamento entre agentes privados. O Senado tem a oportunidade de dar um passo decisivo, com a aprovação do projeto de lei 2.225/2024, conhecido como ECA Ambiental, que visa garantir o direito de crianças e adolescentes à natureza e estimula a adoção da EBN na rede de ensino.

A transição climática é inevitável. Já a transição de habilidades é uma escolha —e está atrasada. Se queremos ocupar os empregos verdes que despontam no horizonte, precisamos agir agora: mais natureza para as crianças e mais crianças na natureza. O futuro do Brasil —e do planeta— depende disso.

A nova empreitada antivax, Bruno Gualano- FSP

 Uma vez mais, a ciência teve de expelir um parasita. O artigo "Síndrome pós-spike: solução simples com resultados resolutivos, relato de cinco casos", publicado pela desconhecida IDCases, descrevia uma nova condição clínica supostamente causada tanto pelo SARS-CoV-2 quanto pelas vacinas de mRNA.

Assinam a obra Roberto Zeballos, Mariely Helbingen, Paulo Melo, Francisco Cardoso Alves, Caio Salvino, Ewerton Seródio e Edimilson Carvalho. A manobra foi criar uma síndrome (pós-spike ou spikeopatia) a partir de outra bem documentada (pós-Covid ou Covid longa). Esta é consensualmente reconhecida (CDC, OMS, NIH etc) como uma condição decorrente da Covid-19 (não das vacinas) que afeta milhões. Aquela não existe. Como a ciência não trabalha com ficção, o artigo foi despublicado.

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Vacina contra a Covid em UBS de São Paulo - Danilo Verpa - 2.fev.23/Folhapress

Estaríamos diante apenas de hipóteses inverossímeis, métodos frágeis e conclusões exorbitantes? A "spikeofobia" é isso tudo, mas talvez mais. Segundo reportagem do jornal Estado de S. Paulo, Zeballos, Cardoso e Melo teriam lucrado com vendas de conteúdo online, consultas particulares e protocolos terapêuticos para a "nova síndrome" —com direito à eclética ivermectina. No artigo, porém, declararam não possuir conflitos de interesse, outra falta ética entre tantas.

A situação não é inédita. Em 1998, Andrew Wakefield protagonizou um dos maiores escândalos científicos modernos ao publicar, no The Lancet, um artigo fraudulento que sugeria associação entre a vacina tríplice viral e o autismo. Investigações posteriores revelaram que recebera pagamentos substanciais de advogados interessados em processar fabricantes de vacinas.

Além disso, buscava vantagens comerciais: havia submetido pedido de patente para um imunizante concorrente à vacina tríplice e planejava vender kits diagnósticos para a suposta "enterocolite autística" – esquema que, segundo documentos obtidos pelo jornalista Brian Deer, projetava faturamento superior a US$ 40 milhões anuais. O caso culminou na cassação de seu registro pelo Conselho Médico Geral do Reino Unido e na retirada definitiva do artigo.

No Brasil, o negacionismo vacinal corre em ondas. Surge na resistência pré-científica do início do século 20, marcada pela desconfiança no Estado; amaina durante as décadas de 1970 a 2000, quando o Programa Nacional de Imunizações sustentou coberturas exemplares; infiltra-se na primeira era da desinformação digital, nos anos 2000, com boatos importados de movimentos antivacina estrangeiros; ganha tração com a polarização pós-2016, quando a recusa vacinal vira marcador identitário; e atinge seu ápice na pandemia, com o negacionismo estatal bolsonarista.

É nesse terreno da pós-verdade que floresce no país o negacionismo de mercado —a conversão sistemática da pseudociência em commodity. Há quem invente "deficiências hormonais" para vender anabolizantes; e quem crie "síndromes pós-vacinais" para prescrever protocolos detox. Na certeza da impunidade —e diante de um público aturdido pela infodemia— proliferam os ilusionistas sanitários: agentes que descobriram no negacionismo um negócio extremamente rentável.

Para conter a ameaça, o Ministério da Saúde promete acionar conselhos de medicina, plataformas digitais e Ministério Público. Os primeiros, porém, abrigam certos profissionais que defendem publicamente teses pseudocientíficas —como a spikeofobia—, o que compromete sua capacidade de resposta. As segundas, escudadas na deturpação ética do conceito de liberdade, obedecem apenas ao imperativo do engajamento, do qual o negacionismo é sócio. À saúde pública, resta confiar na atuação firme da Justiça.


segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Dá até para beber, diz Lula sobre biodiesel da Petrobras; veja vídeo, FSP

 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que biodiesel refinado produzido pela Petrobras "dá até para beber", durante discurso em Moçambique, nesta segunda-feira (24), em visita oficial em que se reuniu com o presidente do país africano, Daniel Chapo.

"Há muito tempo a gente está tentando introduzir o biodiesel no mundo, e os fabricantes de motor sempre recusam, inventando um monte de coisa. Não existe mais isso. Com um agravante: a Petrobras está agora refinando o biodiesel já misturado 100% com o diesel. Sai um biodiesel melhor do que o qualquer outro, dá até para beber, Haddad [Fernando Haddad, ministro da Economia]. Os carros bebem, e bebem muito", brincou Lula, sem explicar qual era exatamente o produto ou a mistura a que se referia.

Dois homens sentados em cadeiras de madeira com estofado claro, separados por uma mesa pequena com duas garrafas de água, em um ambiente com parede de mármore branco. À esquerda, a bandeira do Brasil; à direita, a bandeira de Moçambique. Acima deles, um brasão dourado fixado na parede.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao lado do líder moçambicano, Daniel Chapo, em Maputo - Amilton Neves/AFP

O presidente brasileiro lembrou de ter sugerido produzir biocombustíveis, com investimento brasileiro, na África, no seu primeiro mandato.

"Quantas vezes eu tentei convencer os empresários brasileiros, quando nós decidimos, em 2003, fazer o biodiesel, quantas vezes eu conversei com empresários, 'vamos tentar fazer na África', mas é difícil. É difícil, porque me parece que as pessoas têm medo de arriscar", disse.

Além disso, Lula sugeriu que a Petrobras explorasse gás natural em Moçambique.

"O Brasil precisa muito de gás. E Moçambique tem muito gás. Nada impede que a dona Petrobras mande sua engenharia de perfuração vir aqui se reunir com a empresa de vocês para saber aonde e quando a gente vai poder assinar um acordo e aonde e quando a gente vai começar a tirar gás", disse Lula.

No último dia 15, Brasil e Moçambique comemoraram 50 anos do estabelecimento de relações diplomáticas. Em março do ano seguinte, em 1976, o governo brasileiro abriu sua embaixada em Maputo —a representação moçambicana em Brasília foi aberta em 1998.

Segundo o governo brasileiro, Moçambique é o maior beneficiário de recrusos da Agência Brasileira de Cooperação em áreas como saúde, agricultura e educação, entre outras. O comércio bilateral foi de US$ 40,5 milhões em 2024, sendo US$ 37,8 milhões em exportações brasileiras, principalmente de carne de aves, e US$ 2,7 milhões em importações.

Lula saiu do encontro de líderes do G20, em Joanesburgo, na África do Sul, direto para Maputo, a capital de Moçambique, no domingo (23). Na visita oficial de um dia, ele recebe nesta segunda o título de doutor honoris causa da Universidade Pedagógica de Maputo.