domingo, 26 de outubro de 2025

O desafio da democracia brasileira é reconhecer o que realmente estará em jogo em 2026, Fernando Schuler, OESP

 As pesquisas mostram que uma maioria consistente de eleitores não gostaria de ver nem Lula, nem Bolsonaro em 2026. Seria ótimo que uma esquerda e uma direita renovadas no País, discutindo o futuro. Mas não irá acontecer. Por vezes me lembro de meus vinte e poucos anos. Era a primeira eleição da Nova República, em 1989, e Lula já estava lá. Agora vamos para a décima eleição e algo soa como a reprise infinita de um velho filme.

Lula sai na frente. Das quatro reeleição que tivemos, apenas uma não funcionou: Bolsonaro, em 2022. Na América Latina, o índice de reeleição chega a 85%. Há exatos cinco meses, o governo chegou ao seu fundo do poço, com cerca de 40% de aprovação. De lá para cá, vem se recuperando. Grosso modo, uma reeleição é muito improvável com aprovação abaixo de 40%, e muito provável acima de 50%. Lula sabe disso. Se o governo crescer mais 4 ou 5 pontos, é difícil perder. Se a inflação está sob controle, desemprego baixo e as gratuidades correndo soltas, o curto prazo está bem resolvido. E o curto prazo é 2026.

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No mundo da direita as coisas andam difíceis. De um líder da oposição escutei que o Brasil teria uma faixa de eleitores “flexíveis” que tendem à “direita” no terreno econômico, mas rejeitam o radicalismo e há muito perderam a paciência com Bolsonaro. De modo que haveria espaço para uma direita moderada, com Tarcísio ou Ratinho Jr. A tese soa plausível. Lula ganhou o centro em 2022. A direita poderia fazer algo similar agora. Lula ajuda, sob certo aspecto: empurra seu governo para a “esquerda”. A escolha de Boulos como seu ativista-chefe simboliza bem isso.

Um pouco abaixo do mise-en-scène político, 2026 seguirá um padrão. Estarão frente a frente as duas turmas que se opõem, na vida brasileira, desde o início dos anos 1990. Desde as privatizações, Lei de Responsabilidade Fiscal, até a autonomia do BC e o novo marco do saneamento, passando por todas as reformas relevantes que o País fez nas três últimas décadas. Em todas elas, sempre tivemos dois lados. Isto é apenas um dado sobre iniciativas de governos e votos no Congresso. Lula se elegeu em 2022 dizendo que acabaria com as privatizações, reformas liberalizantes, teto de gastos. Disse que retomaria o “protagonismo do Estado” e cumpriu. Nossa situação fiscal é a prova de sua perfeita coerência.

Nada disso será diferente em 2026. Desta vez com um componente a mais: o tema institucional. A chancela à lógica da exceção que presidiu a vida brasileira nos últimos anos, em especial a partir dos inquéritos, em 2019. Ou sua rejeição. Por ora, a oposição sai atrás. Dispersa, uma parte insistindo na estratégia suicida do apoio ao tarifaço de Trump. Isso e o espectro de uma eleição sob a tutela de opinião do sistema de justiça, como em 2022. Quem sabe vá aí o sentido último da disputa de 2026. A dúvida sobre se teremos ou não um debate livre, nas eleições. Seria, no fim do dia, ganhe quem ganhar, nossa vitória como País, em 2026.

50 anos numa noite mágica e cidadã, Juca Kfouri, FSP

 No sábado (25), à tarde, o Corinthians ganhou do Vitória, se afastou do risco de queda e aliviou o Santos.

À noite, o Flamengo conseguiu perder para o Fortaleza e alegrar o Palmeiras, que estava murcho com o desastre de Quito.

Também à noite, o São Paulo ganhou bem do Bahia.

Mais: a Ponte Preta ganhou sua primeira taça nacional em 125 anos de história, ao ser campeã da Série C.

Três jogadores do time com uniforme preto e branco comemoram com os braços abertos durante partida de futebol. O jogador central, com número 17, está em destaque, expressando entusiasmo. Ao fundo, público desfocado e árbitro com uniforme verde.
Toró comemora primeiro gol da Ponte Preta na final do Brasileiro da Série C, contra o Londrina (PR), em Campinas - Douglas Moreti/Agência F8/Folhapress

De quebra, neste domingo, João Fonseca foi campeão no ATP 500 da Basileia, na Suíça.

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Convenham, a rara leitora e o raro leitor, que assuntos não faltaram para a coluna, que dos cinco eventos citados viu dois, o que envolveu o sofrido e assaltado, pelos cartolas, Corinthians, e o do magnífico jovem tenista brasileiro.

A derrota rubro-negra e a vitória tricolor concorreram com o que de mais importante aconteceu na vida brasileira no fim de semana, mais importante até que o encontro entre Lula e Trump.

João Fonseca ao vencer o espanhol Alejandro Davidovich Fokina, na Suíça - Fabrice Coffrini/AFP

Porque na noite de sábado, na Catedral da Sé, os dois órfãos de Vladimir Herzog, Ivo e André, voltaram ao palco onde, em 1975, aconteceu o culto ecumênico que marcou o início da redemocratização do Brasil. Estavam acompanhados do neto e das netas de Vlado, a quem novo ato inter-religioso homenageou.

Diferentemente de meio século atrás, o Estado se fez presente, com o presidente em exercício, Geraldo Alckmin, autor de discurso sóbrio, ao seu estilo, e firme: "Não esquecer, para jamais se repetir".

Antes dele, o rabino Uri Lam também falou com coragem e altivez, digno representante de Henry Sobel.

Vlado, como se sabe, era judeu, mas nem a Conib nem a Federação Israelita de São Paulo mandaram representantes ao ato, assim como foram eloquentes as ausências do governador de São Paulo e do prefeito do capital, como se não coubessem em cerimônia contra a tortura, pela democracia e pela paz.

Mas lá estavam, na memória de todos, as gigantescas figuras dos bravos dom Paulo Evaristo Arns, do reverendo presbiteriano Jaime Wrigth e do então presidente do Sindicato dos Jornalistas no Estado de São Paulo, Audálio Dantas, comoventemente aplaudidos em pé pela catedral lotada.

Tudo entremeado com a bela cantoria do Coro Martin Luther King, entre Marias e Clarices, heroínas do Brasil.

Aliás, das Marias, esteve também a presidenta do Superior Tribunal Militar, Maria Elisabeth Rocha, que em curta e arrepiante fala pediu desculpas por todos os erros cometidos pela corte que ora preside contra os que foram torturados e mortos pela ditadura instalada em 1964.

Delirantemente aplaudida, assim como o juiz Márcio José de Moraes, que, ainda em 1987, teve a coragem de condenar a União pelo assassinato de Vlado.

A carta ao magistrado, de dona Zora, mãe de Herzog, na voz de Fernanda Montenegro, em agradecimento pela histórica sentença, fez chorar boa parte dos presentes.

Quem esteve na catedral 50 anos atrás e voltou agora não pôde deixar de comparar o clima de medo de então com o de agora. Apesar de tudo, avançamos.

E avançamos a ponto de impedir que haja anistia aos que, em 8 de janeiro de 2023, quiseram repetir a barbárie instalada em 1964, algo que, também em uníssono, no ato comandado pelo bispo de São Paulo, Odilo Scherer, ficou patente.

Enfim, uma goleada cidadã e democrática.