quinta-feira, 29 de maio de 2025

Política migratória de Trump alerta para aventuras bolsonaristas, Frederico Vasconcelos, FSP

 As políticas migratórias de Donald Trump "têm causado pânico", diz a brasileira Priscila Sousa, que tem cidadania americana e é deputada estadual pelo Partido Democrata no estado de Massachusetts.

Em entrevista à repórter Angela Boldrini, da Folha, ela diz que "as crianças não estão indo para a escola por medo."

"Deve ter gente que não está buscando cuidado médico, vítimas de violência doméstica ficando em casa por medo de procurar a polícia, de serem entregues para a imigração."

A imagem mostra dois homens em um evento ao ar livre. O homem à esquerda está de perfil, com a mão levantada, enquanto o homem à direita está em foco, mas parcialmente desfocado. Ambos parecem estar em um momento de discurso ou apresentação, com microfones à frente. O fundo é desfocado, sugerindo um ambiente de conferência ou coletiva de imprensa.
Ex-presidente Jair Bolsonaro ouve, ao fundo, fala do presidente americano Donald Trump, em coletiva de imprensa na Casa Branca, durante o período em que ainda ocupava o cargo - Brendan Smialowski - 19.mar.19/AFP

"Os policiais estão simplesmente falando 'we don't need a warrant' [nós não precisamos de mandado]. Ou não estão se identificando, ou estão usando máscaras."

"O sistema não está funcionando, (é) quase uma sensação de sequestro."

As avaliações da deputada democrata servem de alerta para o risco, mesmo distante, de se repetir no Brasil o que ocorre nos Estados Unidos.

Em 2021, diante da suspeita de transtorno de personalidade e incapacidade de Bolsonaro para exercer a Presidência, acadêmicos e advogados pediram ao STF que o ex-capitão fosse submetido a exames psiquiátricos.

Na petição ao STF, os autores fazem referência aos norte-americanos, que optaram por construir um procedimento a partir de emenda constitucional, modelo recomendado para o caso brasileiro.

Na peça, citam artigo da National Geographic ("Calls to replace Trump via the 25th Amendment are growing. Here’s why it’s never happened before").

O debate avançou com a edição ampliada do livro "The Dangerous Case of Donald Trump", publicado originalmente em 2017 pelo psiquiatra forense Bandy Lee.

A obra reúne ensaios de 27 psiquiatras, psicólogos que alertam para "o perigo claro e presente" que a saúde mental do presidente dos EUA representa para a nação e o bem-estar individual.

Segundo a petição ao STF, "Bolsonaro mostra-se incapaz, vítima das armadilhas da inflexibilidade de sua configuração de personalidade, neurótica para alguns especialistas, psicótica, para outros, na falta de empatia com o sofrimento do povo brasileiro, em decorrência da pandemia."

Afirma-se que Bolsonaro apresenta indícios de transtorno de personalidade paranoide. Tal condição faz com que a pessoa tenha "um padrão de desconfiança e suspeita difusa dos outros, de modo que suas motivações são interpretadas como malévolas", segundo o Manual Estatístico e Diagnóstico (DSM) da Associação Psiquiátrica Americana.

Em carta aberta, 600 médicos formados na Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo, também concluíram que os atos e omissões de Jair Bolsonaro determinariam sua incapacitação.

A interdição de Bolsonaro foi requerida não por crimes, pois a eventual responsabilidade criminal deve ser aferida em outros processos, mas pela "incapacidade do presidente de entender o que é certo ou errado".

"O exame de especialistas pode elucidar, para saber se se trata (…) de indício forte de incapacidade cognitiva, ou então de um comportamento que esconde simplesmente o desejo de praticar ilícitos", registra o documento.

Morosidade do relator

O pedido ficou dois anos no gabinete do ministro Gilmar Mendes. Com a eleição de Lula, o processo foi extinto. Bolsonaro não exercia mais a função, e não competia ao STF analisar a matéria.

Entre a proposição da ação e o desfecho, o decano reforçou sua influência nas indicações de candidatos e promoções no governo Bolsonaro.

Presidente da Academia Paulista de Direito, o desembargador Alfredo Attié, um dos subscritores do documento, afirmou que "as instituições não funcionaram para defender o regime".

"Os Poderes Legislativo e Judiciário, Ministério Público e sociedade civil paralisaram-se no cortejo de morte que se construiu desde o lançamento de uma candidatura insana."

Também assinaram a petição os professores Renato Janine Ribeiro, da USP; Roberto Romano, da Unicamp, morto em 22 de julho de 2021; Pedro Dallari, da USP; José Geraldo de Sousa Jr, da UnB; e os advogados Alberto Toron e Fábio Gaspar.

Eles foram representados pelos advogados Mauro de Azevedo Menezes e Roberta de Bragança Freitas Attié.


Pedágio urbano de Nova York é um sucesso, e por isso pode ser extinto, Lucia Guimarães, FSP

 Na semana passada, voltei a ter um sonho que reflete uma angústia recorrente: não me lembro onde estacionei meu Chevette Hatch, modelo de 1978. Como acordei no meio da noite, por alguns segundos acreditei que ia encontrar multas no para-brisas por não ter removido o carro no horário estabelecido para a passagem do caminhão varredor de meio fio.

Só há um problema: não possuo um Chevette Hatch desde 1991. O modelo não é fabricado desde 1986, o ano em que comprei o carro já com 135 mil km rodados. Nunca mais fiz a besteira de comprar outro carro em Manhattan, onde uma vaga de garagem custa, em média, o equivalente a R$ 3.000 por mês.

A imagem mostra uma rua movimentada em Times Square, Nova Iorque, com muitas pessoas caminhando. Há mesas com guarda-sóis vermelhos em um lado da calçada e várias lojas e anúncios visíveis ao fundo. O clima parece ensolarado e há uma grande quantidade de pessoas, incluindo turistas e locais, interagindo no espaço público.
Pedestres caminham na região da Times Square, em Nova York - Charly Triballeau - 19.mai.25/AFP

O relacionamento entre o automóvel e a mais densa aglomeração urbana dos Estados Unidos é profundamente disfuncional. Os nova-iorquinos passam 200 milhões de horas por ano procurando estacionamento grátis na rua. A qualquer momento, em Park Slope, no Brooklyn, metade dos motoristas em circulação está procurando vagas.

A grande maioria dos donos de automóveis aqui não dirige para o trabalho, não só pelo medo de não encontrar outra vaga, mas porque a velocidade média do tráfego, na hora do rush, pode cair para 8 km por hora. O que torna mais difícil explicar a ameaça de extinção do pedágio urbano instituído no começo de janeiro no centro de Manhattan, foco de congestionamentos épicos.

pedágio urbano se mostrou um sucesso. Os engarrafamentos diminuíram, os acidentes também, e um temor inicial —de que o trânsito ia piorar nas vizinhanças adjacentes ao perímetro do pedágio— não se realizou. As lentas linhas de ônibus circulam com maior rapidez. Há mais nova-iorquinos usando as faixas de bicicletas e o metrô, e até a frota de táxis amarelos, esmagada por aplicativos como Uber e Lyft, conta com mais passageiros.

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Numa era em que tudo vira política de identidade, resultados com vantagens reais —econômicas, ambientais e de qualidade de vida— são ignorados pelo impulso de fazer campanha permanente. O estado e a cidade de Nova York são governados por democratas.

Um juiz federal acaba de bloquear até o dia 9 de junho uma ameaça de represália do secretário de Transportes, Sean Duffy, sob ordens do presidente republicano que cresceu no Queens, separado de Manhattan por um túnel ou uma ponte. Duffy tem o poder de cortar fundos para a extensão de uma linha de metrô ou atrasar obras de reparo de estradas na dilapidada infraestrutura estadual.

O excesso de carros particulares alimenta toda uma indústria de corrupção, seja na cobrança de multas ou na concessão de cartões especiais para estacionamento em locais proibidos —como a identificação de médico. Cartões falsificados são vendidos por até US$ 2.600 (R$ 14,8 mil).

Minha conta de luz traz embutida esta distorção urbana. A concessionária de energia de Nova York gasta milhões de dólares por ano com monitores de vagas. São donos de carros que estacionam numa rua e bloqueiam vagas para a chegada de equipes de manutenção. Não é incomum os monitores passarem dias dormindo nos carros, usando banheiros de mercearias e enfrentando temperaturas abaixo de zero.

Essa insensatez coletiva foi brilhantemente satirizada em "Bananas" (1971) quando Woody Allen confessa seu sonho recorrente: figuras encapuzadas tentam estacionar a cruz em que ele foi martirizado e entram em batalha com um grupo que queria estacionar outra cruz na mesma vaga.