sexta-feira, 23 de maio de 2025

Forças opostas moldando a história da amazônia, Marcia Castro, FSP

 Floresta pristina. Inferno verde.

amazônia já foi associada a expressões e visões diferentes. Durante o governo militar era o inferno verde que precisava ser vencido. Expressões como "Para unir os brasileiros nós rasgamos o inferno verde" e "Chega de lendas, vamos faturar", entre outras, ilustravam jornais e revistas.

A ideia de que a amazônia era um vazio demográfico era usada para justificar obras e para distribuir "terras sem homens para homens sem terra". Povos indígenas e comunidades locais eram totalmente ignorados.

A imagem mostra uma vista aérea da Floresta Amazônica, com uma vasta extensão de árvores verdes e um rio serpenteante que corta a paisagem. O céu está parcialmente nublado, e a luz do sol ilumina a vegetação, criando um contraste entre as sombras e as áreas iluminadas.
Rio Manicoré, no Amazonas - Mauro Pimentel - 7.jun.2022/AFP

Em 2003, um artigo publicado na revista Science trouxe novas descobertas arqueológicas que questionavam se a amazônia era uma floresta pristina ou uma grande área em que civilizações prosperaram, se extinguiram, e cujas ruínas foram tomadas pela floresta. Em 2024, descobertas semelhantes foram feitas no Equador.

No Brasil, o professor Eduardo Góes Neves lidera o projeto Amazônia Revelada. Científico, inovador, disruptivo e humanitário, o projeto busca mapear sítios arqueológicos encobertos pela vegetação, em parceria com as comunidades da floresta.

Para isso, o projeto usa uma tecnologia (chamada Lidar) que permite mapear variações de elevação no solo coberto pela floresta. Resultados mostram a presença de geoglifos, estruturas geométricas escavadas no solo que começaram a ser identificadas na amazônia com o aumento do desmatamento a partir da década de 1970. Revelam, ainda, uma rede de cidades pré-colombianas baseadas na agroecologia.

O projeto Amazônia Revelada reescreve a história sem a influência colonialista. Quem frequentou a escola durante o regime militar, como eu, sabe que os livros retratavam uma história distorcida.

Além disso, o projeto põe em xeque a discussão do marco temporal (que ainda paira no Supremo), revoluciona a forma de se fazer arqueologia e abre espaço para que áreas na amazônia sejam protegidas pelo Iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) por meio do registro dos sítios arqueológicos que estão sendo descobertos.

É a ciência aliada à justiça humanitária. É a ciência revelando a história e mostrando o caminho correto para o futuro.

Entretanto, outros interesses caminham na direção oposta da ciência. Na última quarta-feira (21) o Senado aprovou o projeto de lei (2159/2021) que flexibiliza o licenciamento ambiental.

O chamado "PL da Devastação" cria uma modalidade de licença ambiental especial, concedida em até 12 meses para iniciativas que o governo considere prioritárias.

Além disso, empreendimentos de médio porte e médio impacto poluidor podem emitir licença por adesão e compromisso (LAC), ou seja, com base na autodeclaração do proprietário.

Terras indígenas e territórios quilombolas ainda não demarcados deixam de ser áreas protegidas, e sítios arqueológicos ainda não explorados ficam ameaçados.

O Ministério do Meio Ambiente considera o PL um retrocesso ambiental, um risco a segurança ambiental, uma proposta que ignora por completo a crise climática e que é inconstitucional no que se refere à LAC para atividades de médio impacto ambiental.

O Senado argumenta que o PL é necessário para impulsionar o desenvolvimento do país.

Desenvolvimento para quem? A que custo?

EaD no Brasil: limites indispensáveis à garantia da qualidade, FSP

 A Educação a Distância (EaD) é uma modalidade educacional relevante para a democratização do acesso à educação em países com dimensões continentais como o Brasil. Entretanto, nas últimas duas décadas, o processo de expansão da EaD está marcado pela oferta de cursos com qualidade questionável em meio a um processo fragilizado de regulamentações e inócuo acompanhamento.

Em 2017, o Decreto nº 9.057 autorizou instituições a ofertar cursos de graduação e pós-graduação lato sensu em EaD, mesmo sem experiência em cursos presenciais. A medida foi considerada um retrocesso para a modalidade, sendo tema de debates e embates.

O crescimento desordenado da oferta de cursos EaD em instituições de ensino superior com fins lucrativos atingiu índices alarmantes. De acordo com o Censo da Educação Superior, houve aumento de 232% no número de cursos, passando de 3.177 em 2018 para 10.554 em 2023.

Mão segurando uma agulha junto de um balão na cor azul
Meyrele Nascimento/SoU_Ciência - Meyrele Nascimento/SoU_Ciência

Com base nos dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), é possível observar que, entre 2015 e 2023, o número de cursos superiores a distância aumentou 615%. Foram criados 9.078 novos cursos nesse período, dos quais 97,3% são ofertados por instituições privadas.

A Portaria do Ministério da Educação (MEC) nº 528/2024 suspendeu a criação de novos cursos, polos e vagas na modalidade a distância e foi seguida do anúncio da elaboração de um novo marco regulatório. A nova política pública se materializou no Decreto nº 12.456 e na Portaria MEC nº 378, em 19 de maio último, que uniformizam definições como atividades presenciais e EaD e instituem o modelo semipresencial.

Ficam proibidos cursos 100% online ou semipresenciais para Medicina, Enfermagem, Odontologia, Direito e Psicologia. Os demais cursos da saúde e as licenciaturas também foram impactados e só podem ser presenciais ou semipresenciais. Cabe acompanhar as estratégias de regulação que serão implementadas para garantir o cumprimento da carga horária presencial no modelo EaD e semipresencial.

A Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) manifestou-se contrária à proposta de limitação de 50 estudantes em determinadas atividades síncronas. Tal medida tem sido debatida como forma de conter a massificação de turmas com centenas ou milhares de alunos que se traduz em aulas por vídeos com pouco potencial de promover o ensino-aprendizagem. Na nova legislação, a atividade síncrona mediada pode ter no máximo 70 estudantes.

O Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) também se posicionou, sendo contrário à oferta integral de cursos de Engenharia a distância. Atendendo à demanda, o MEC vetou a modalidade a distância em Engenharia, Produção e Construção e também nas áreas de Educação, Ciências Naturais, Matemática e Estatística, Saúde, Agricultura, Silvicultura, Pesca e Veterinária.

A nova política pública aponta diretrizes e estabelece limites necessários, há muito esperados, para que os cursos garantam pelo menos alguma qualidade formativa. Ao que parece, a medida tem potencial para dar início a um novo patamar de avaliação e monitoramento dessa modalidade educacional em prol de cursos com qualidade socialmente referenciada

Soraya Smaili , Maria Angélica Pedra Minhoto , Pedro Arantes , Suelaynne Lima da Paz e Weber Tavares da Silva Jr

Tarcísio e Derrite têm noite de pré-campanha com líderes da centro-direita e recado a Lula, FSP

 O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e seu secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, protagonizaram um evento com ares de pré-campanha eleitoral durante a festa de filiação de seu auxiliar ao PP.

O evento ocorreu nesta quinta-feira (22) em uma casa noturna da Vila Olímpia, na zona sul de São Paulo.

Derrite foi explícito ao se colocar como candidato ao Senado, justificando que esse é o motivo de seu retorno à legenda —da qual havia saído em 2022. Já Tarcísio, apontado como possível presidenciável no próximo ano, disse que o grupo de dirigentes partidários que os acompanhava estava unido e que "quer fazer a diferença".

"Uma coisa que é importante, que não pode passar despercebida, é o simbolismo desta reunião aqui. É a quantidade de lideranças que nós temos aqui, do Brasil inteiro. Para quem duvida que esse grupo vai estar unido no ano que vem, eu digo para vocês: esse grupo estará unido", afirmou o governador.

A imagem mostra dois homens em um evento, ambos aplaudindo. O homem à esquerda tem cabelo grisalho e usa um terno escuro, enquanto o homem à direita tem cabelo curto e usa um paletó claro. O fundo é iluminado com luzes que criam um efeito visual. Ambos parecem estar em um momento de celebração.
Filiação do secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite ao PP, com participarão do governador Tarcísio de Freitas - Bruno Santos/Folhapress

O grupo citado por Tarcísio era composto por presidentes nacionais de partidos que estavam com ele no palco: Valdemar Costa Neto (PL), Renata Abreu (Podemos), Gilberto Kassab (PSD), Antonio Rueda (União Brasil) e Ciro Nogueira (PP).

À exceção de Valdemar e Renata, os demais dirigentes integram o primeiro escalão do governo Lula (PT). Apesar disso, já se articulam para lançar uma candidatura de oposição à reeleição do presidente em 2026.

"Esse grupo vai ser forte, esse grupo tem um projeto para o Brasil. Esse grupo vai fazer a diferença. Esse grupo sabe o caminho", discursou Tarcísio, sem citar diretamente Lula.

"No momento em que há dúvida, no momento em que tem muita gente lá em Brasília perdida, que não sabe o caminho, e em que as decisões são tomadas de forma casuística, às vezes até de forma irresponsável, tem o grupo aqui, que está unido, que sabe o caminho, que quer fazer a diferença."

Segundo aliados de diversos desses dirigentes, o grupo aguarda um aval de Jair Bolsonaro (PL) para a indicação de Tarcísio como candidato à Presidência no próximo ano. Oficialmente, o governador afirma que disputará a reeleição.

Ciro Nogueira foi o primeiro a abordar o tema no palco, pouco antes do discurso do governador. "Os governadores de São Paulo sempre erram ao serem eleitos: querem logo disputar a Presidência e se colocam como candidatos", disse o dirigente.

Nogueira, que já chamou Bolsonaro de fascista e disse que Lula foi melhor presidente do Brasil, na sequência, completou.

"E é por isso que talvez o Brasil vá chamar o governador Tarcísio de presidente muito em breve. Ou agora ou em 2030. E quem vai decidir isso é o povo de São Paulo e o povo do Brasil. Mas pode ter toda a certeza: se houver essa decisão, governador, tanto o União Brasil quanto o Progressistas estarão ao seu lado."

Valdemar, embora defenda que Bolsonaro —atualmente inelegível— será o candidato à Presidência em 2026, afirmou que o PL também aguarda uma definição sobre a situação eleitoral de Tarcísio. "Nós temos que ver o que o Tarcísio vai resolver para que a gente possa resolver a nossa vida", declarou.

O presidente do PL também ressaltou que, no fim das contas, a decisão sobre quem será o candidato ao Planalto caberá ao próprio Bolsonaro. "Quem vai dizer quem será o candidato a presidente é o Bolsonaro. Por quê? Porque ele é o dono dos votos", disse.

O evento ocorreu na casa noturna Vila JK, que, segundo a equipe de Derrite, tem capacidade para mil pessoas e estava lotada de prefeitos e vereadores do interior, além de deputados, senadores e convidados dos partidos.

De acordo com assessores do PP, mais de 80 prefeitos estavam no local. O partido comanda 47 prefeituras em São Paulo.

Dois presidentes de partidos que apoiam Tarcísio no estado não compareceram: Baleia Rossi (MDB) e Marcos Pereira (Republicanos). Há mais de um ano, circulam rumores —alimentados por Valdemar— de que Tarcísio poderia deixar o Republicanos e migrar para o PL. No caso do MDB, parte da bancada federal da sigla insiste em apoiar Lula em 2026.

Outra ausência foi a do prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB). Embora Derrite tenha se colocado como pré-candidato ao Senado, integrantes de partidos avaliam que ele também poderia disputar o governo paulista caso Tarcísio realmente concorra à Presidência. Nunes também tem interesse no cargo.

Ciro Nogueira reforçou, ao chegar à cerimônia, que, caso Tarcísio se lance à Presidência, o partido defenderá a candidatura de Derrite ao Governo de São Paulo. "Aí, o Derrite deve ser candidato ao governo. Nós vamos defender isso, mas é lógico que é uma construção", afirmou.

O secretário da Segurança comentou as ausências. Sobre Nunes e Baleia Rossi, disse que ambos tinham compromissos, mas que o prefeito o telefonou. "Existe uma rivalidade minha e do Ricardo [Nunes] aqui em São Paulo contra a criminalidade."

Derrite, ex-capitão da Polícia Militar, foi eleito deputado federal em 2018 pelo PP e desde então manteve proximidade com o grupo político de Bolsonaro. Em 2022, porém, o PP apoiou a campanha de Rodrigo Garcia (então no PSDB) ao governo paulista, no primeiro turno, o que motivou Derrite a trocar o partido pelo PL.

Agora, o secretário retorna ao PP para disputar o Senado, já que o PL pretende lançar Eduardo Bolsonaro. Em 2026, cada estado elegerá dois senadores. A troca partidária foi negociada de forma amigável por Ciro e Valdemar.

"Não tem por que esconder que o desejo nosso, que a minha saída do PL, tem um contexto —e o contexto principal é a vaga para o Senado", disse Derrite a jornalistas, após o evento.