O que já se esperava a Embrapa acaba de confirmar com pesquisas e resultados. Após vários anos de experimentos, a empresa constatou a viabilidade da terceira safra anual de grãos no Paraná.
Estudos que vêm sendo desenvolvidos há cinco safras por pesquisadores da entidade apontam que a terceira safra no sequeiro (não irrigada), além de movimentar economicamente toda a cadeia produtiva do setor, traz sustentabilidade ambiental em um período em que o clima fica cada vez mais adverso e incerto.
O estudo começou com a preocupação dos pesquisadores da Embrapa Soja com a sequência quase contínua da dobradinha soja e milho pelos produtores paranaenses. São produtos importantes para a região, principalmente pela necessidade deles no Paraná, um dos principais produtores de proteína animal do país.
Essa continuidade, porém, traz problemas para a própria agricultura. Ao longo dos anos, a dobradinha foi gerando uma compactação do solo que reduz a infiltração de água, dificulta o aprofundamento das raízes e facilita a erosão.
O resultado é um aumento de custo para o produtor, perda de produtividade, proliferação de plantas daninhas e efeitos sobre o meio ambiente, diz o pesquisador Henrique Debiasi, da Embrapa Soja, um dos participantes da pesquisa.
Os estudos buscam aumentar a diversificação e a intensificação de modelo de produção e gerar mais renda para o produtor. Renda, no entanto, passa também pela qualidade do solo, diz Alvadi Balbinot, pesquisador da Embrapa Trigo, que também participou da pesquisa.
Os pesquisadores vêm estudando uma maneira de fechar a janela de tempo que os produtores deixam após a colheita do milho safrinha e o plantio de soja, um período sem culturas e prejudicial para o solo. Estudaram modelos para um aproveitamento da terra durante os 365 dias do ano.
Com esse modelo, não fica janela nenhuma sem plantio durante o ano. E Debiasi alerta: erra quem pensa que a ocupação contínua da terra prejudica o solo. Se ela ficar parada, é passível de erosão e, sem plantas vivas, interrompe-se um ciclo de penetração das raízes levando água para o solo.
A melhoria da estrutura do solo proporciona maior taxa de infiltração e armazenamento de água disponível para as plantas, diz o pesquisador Júlio Franchini, da Embrapa Soja, outro pesquisador envolvido nesse estudo.
Avaliando essas necessidades de ocupação de área e de conservação de solo, os pesquisadores observaram uma viabilidade não só de aumento de renda para o produtor como também um aumento do volume da palha no solo com essas culturas.
A pesquisa, feita em parceria com a Copacol, cooperativa do oeste do Paraná, apontou que essa terceira safra de sequeiro não é possível no estado todo, mas apenas nas regiões centro-oeste e oeste, onde as chuvas são mais regulares durante o ano. O Paraná teria próximo de 1,5 milhão de hectares que poderiam ser utilizados com esse modelo.
Na conta dos pesquisadores, o calendário ideal de plantio, em um ano regular de chuvas, seria 20 de setembro para soja, com colheita 120 dias depois. O plantio do milho viria a seguir, no final de janeiro, com colheita desse cereal no início de junho. Na sequência, viriam o trigo ou aveia, que seriam colhidos antes do novo plantio da soja.
Se o produtor optar por três safras em um ano, não terá calendário ideal para mais três no seguinte. Nesse caso, os pesquisadores recomendam, após a colheita da soja, o plantio consorciado de milho com o capim da espécie Brachiaria ruziziensis, a braquiária.
Os pesquisadores destacam os ganhos econômicos e de produtividade, mas um dos pontos básicos é a eficiência a longo prazo que esse sistema vai dar ao solo.
Essa diversificação de cultura eleva, em média, em 11% a rentabilidade do produtor, mostraram os estudos da Embrapa. No consórcio milho e braquiária, vindo após a colheita de soja, a produtividade da oleaginosa cresce 11% na safra seguinte. Os ganhos com a terceira safra de aveia como cobertura são de 10%. Se a opção da terceira safra for para o trigo, a rentabilidade no sistema produtivo é 6,6% superior à tradicional dobradinha soja com o milho.
Deve ser levada em consideração, além dos rendimentos econômicos, a recomposição do solo. A palhada do milho safrinha é pesada, mas não cobre adequadamente o solo no sistema de plantio direto. Seriam necessárias de 7 a 8 toneladas por hectare, e a cultura não rende isso. O peso está basicamente concentrado no caule.
Já o trigo cobre a área com três toneladas de palha, e a braquiária, quando consorciada com o milho, acrescenta de 2 a 3 toneladas. Seriam necessárias quatro. Se ela é utilizada para pastagens, o esterco do gado traz novos nutrientes, ativando a biologia do solo.
"Já provamos a viabilidade econômica desse sistema. Agora vêm novas etapas na busca das melhores cultivares, densidade das plantas, quantidade de fertilizante e um desenho melhor para a cultura do trigo", diz Balbinot.
Segundo o pesquisador, por ser uma janela de ocupação de área que estava vazia, não se busca para o trigo uma alta produtividade no período, mas a obtenção de uma produção média de três toneladas por hectare e a recomposição do solo com palhada.
É um modelo intensivo com diversificação, que vai movimentar toda a cadeia do setor, diz Balbinot. O produtor vai dar novos usos para suas máquinas, obtendo uma renda maior por hectare, enquanto as cooperativas vão movimentar mais insumos e adquirir mais grãos, afirma.
O pesquisador da Embrapa Trigo diz que o desenvolvimento desse modelo no centro-oeste e no oeste do Paraná é importante porque as propriedades são pequenas e médias, permitindo um aumento de renda.
Além do suporte econômico, os pesquisadores destacam a sustentabilidade ambiental. A melhoria da qualidade física e biológica do solo permite uma manutenção maior da água, indispensável para esses períodos de incertezas climáticas.
Parte dessa palhada e as raízes vão virar carbono armazenado na terra, o que ajuda a mitigar as emissões de gases de efeito estufa, segundo Debiasi.