segunda-feira, 5 de junho de 2023

Lula usa o varejo para casos do atacado, Elio Gaspari ,FSP

 Churrascos, verbas ou mesmo troca de ministros não resolverão as dificuldades do governo com o Congresso. Lula foi eleito com a escassa vantagem de 1,8 ponto percentual e tem uma base parlamentar instável, mas acredita que pode resolver problemas do atacado com soluções do varejo. O Congresso tem uma maioria conservadora pressionada por uma minoria radical, até troglodita. O presidente, contudo, vocaliza uma agenda que o afasta de um equilíbrio.

Lula está de pé e fala em ao microfone em coletiva, ele veste terno escuro e gravata vermelha. Ao fundo bandeira do Brasil
O presidente Lula em entrevista coletiva no Palácio do Itamaraty, em Brasília, após receber o presidente da Finlândia - Gabriela Biló - 1.jun.2023/Folhapress

Um exemplo:

Durante a campanha eleitoral ele disse que "o agronegócio, sabe, que é fascista e direitista. [...] Porque os empresários que têm um comércio com o exterior, que exportam para a Europa, para a China, não querem desmatar". Coisas da campanha.

Em maio, quando o ministro da Agricultura foi desconvidado para a abertura da Agrishow de Ribeirão Preto, voltou a crer na ação de "fascistas". Isso levando o líder do MST na sua comitiva para a China.

Há grandes empresários do agro que o apoiaram. Essa retórica pode agradar a ilustrados das cidades, mas, para os empresários do campo, torna-se um fator de isolamento. Quando um parlamentar ligado aos agricultores reivindica uma verba, ele pode até vir a votar com o governo na terça-feira, mas na quinta atende de novo sua base.

As arcas da Viúva não têm dinheiro suficiente para garantir uma base parlamentar alimentada pelo varejo. Num tempo bem mais confortável, o governo de Lula tentou isso com o mensalão e deu no que deu.

Também não se vai a lugar algum dizendo que o problema é de coordenação. Trocando-se o ministro Alexandre Padilha pelo ilusionista Issao Imamura, o problema continuará do mesmo tamanho.

Coordenar o quê?

O veneno de Zelenski na ponta da ironia ao falar de Lula

Presidente ucraniano disse que 'Lula quer ser original' e 'devemos dar essa oportunidade a ele'

Quando o presidente ucraniano Volodimir Zelenski disse à repórter Patrícia Campos Mello que "Lula quer ser original e nós devemos dar essa oportunidade a ele", havia veneno na ponta da ironia.

O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, concede entrevista a veículos de imprensa da América Latina, no palácio presidencial, em Kiev
O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, concede entrevista a veículos de imprensa da América Latina, no palácio presidencial, em Kiev - Oleksandr Popenko/Public Interest Journalism Lab/Divulgação

Noves fora suas posições em relação à Ucrânia e ao governo da Venezuela, em apenas cinco meses, Lula já propôs ao mundo as seguintes mudanças:

A criação de uma governança mundial para a questão ambiental.

A criação de uma moeda comum para a América do Sul.

Insistiu numa reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, criando assentos permanentes para a África, mais a América do Sul e o Caribe.

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MADAME NATASHA

Natasha vota em Lula sempre que ele se candidata e emudece a televisão sempre que ele começa a falar.

Lendo os jornais, viu que ele incorporou a palavra "narrativa" à sua retórica. Usou-a para mimosear o presidente venezuelano Nicolás Maduro. Para Lula, as malfeitorias do regime chavista compõem uma narrativa de adversários. A senhora viu que Lula tomou um contravapor vindo dos presidentes do Uruguai, de um lado, e do Chile, de outro, mas seu cuidado restringe-se ao uso do idioma.

Tudo o que é contado é narrado. Se um sujeito diz que viu um disco voador na esquina, está fazendo uma narrativa. Na narrativa de Jair Bolsonaro, o vírus da Covid podia ser chinês e a vacina poderia ser prejudicial à saúde. Ainda assim, Bolsonaro teve 58 milhões de votos, contra 60 milhões dados a Lula.

Pela narrativa alemã, no dia 30 de agosto de 1939, tropas polonesas tomaram uma rádio alemã da fronteira. A Polônia havia invadido a Alemanha. Essa narrativa foi contada por Hitler e repetida em Moscou pelo jornal Pravda. Em Roma, o Papa Pio 12 evitou abençoar a Polônia

Nos dias seguintes, começou a Segunda Guerra. O Duque de Westminster, um dos homens mais ricos da Inglaterra, culpava os judeus.

Tudo narrativa.


Celso Rocha de Barros - JUNHO, 13-23 - A culpa é de Junho de 2013?, FSP

 Nesta semana celebraremos dez anos do início das manifestações de Junho de 2013. Desde os protestos, a democracia brasileira passou por uma enorme crise, emendando Lava Jato, impeachment e Bolsonaro. Foi culpa de junho?

É bom deixar claro: o Movimento Passe Livre não obrigou Dilma Rousseff a bagunçar o orçamento para se eleger em 2014. Nenhum black bloc obrigou a direita a fazer o impeachment de 2016. As empreiteiras não pagavam as campanhas dos partidos em Cubocards. Moro Dallagnol não mutretaram o julgamento do Lula a pedido da militante Sininho. Não foi o Mídia Ninja que elegeu Bolsonaro.

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Manifestantes na avenida Brigadeiro Luís Antonio, em SP, durante protesto contra a alta da tarifa de transporte - Fabio Braga - 17.jun.2013/Folhapress

Quaisquer que sejam os defeitos dessa turma toda, Dilma poderia ter preservado as contas públicas em seu primeiro mandato. Isso certamente lhe teria custado a derrota em 2014, mas perder é do jogo. A direita poderia ter esperado 2018 para ganhar a Presidência. Havia algum risco de não ganhar, mas, novamente: é do jogo. E, mesmo se tudo isso tivesse dado errado, o outsider de 2018 não precisava ter sido um fascista que amava Ustra e odiava vacina.

Por outro lado, em 2013 explodiu um sentimento contrário à política institucional que certamente influenciou a maneira como lidamos com a Lava Jato e, após a esperança virar desespero, elegemos Bolsonaro.

Por que não fomos capazes de administrar melhor esse sentimento de insatisfação? Talvez fosse mesmo difícil.

Em "Treze – A Política de Rua de Lula a Dilma", recém-lançado pela Companhia das Letras, a socióloga e colunista da Folha Angela Alonso argumenta que faltou um diálogo com a rua de direita ainda em 2013.

Alonso mostra que os protestos de direita cresceram nos dez anos anteriores, e já estavam lá no começo de junho. A direita na rua teria sido "o ponto cego" e "o ponto de fuga" de 2013. O governo Dilma teria sido incapaz de entender esses manifestantes e chamá-los para o diálogo para isolá-los dos extremistas.

A rua de direita teria topado esse diálogo?

O que é notável é que ninguém na esquerda tenha lucrado politicamente com 2013. Os autonomistas e anarquistas, como seria de se esperar, não investiram em construir partidos ou grandes organizações. Os pequenos partidos de esquerda que ajudaram a organizar os protestos de 2013, como o PSOL e o PSTU, não ganharam muitos votos por isso. Conforme a rua de direita crescia, o PT se tornava cada vez mais crítico das Jornadas de Junho.

A Rede Sustentabilidade de Marina Silva talvez tenha sido a força política que mais tentou tirar uma síntese de 2013. Como disse Roberto Andrés em "A Razão dos Centavos" (Companhia das Letras, 2023), Marina já falava para o manifestante médio de 2013 desde 2010. Entretanto, a Rede ainda não conseguiu se consolidar como grande partido. Talvez porque seja mesmo difícil fazer essa síntese.

O que não se discute é que o centrão, a velha direita fisiológica, é o grande vencedor desses dez anos de contestação sistêmica. Manda mais do que antes, e a única concessão que seus membros precisaram fazer a 2013 foi adotar o "sem partido" no batismo de suas legendas: agora se chamam Patriotas, Republicanos, Cebola, Armando, qualquer coisa que não tenha "partido" no nome.

Como parte das festividades pelos dez anos das Jornadas de Junho, o centrão passou maio de 2023 desmontando o ministério de Marina Silva.

Deputados do Cidadania articulam saída em bloco da legenda, FSP

 Deputados federais, estaduais e dirigentes do Cidadania articulam uma saída em bloco da legenda, alegando perseguição política e financeira por parte de membros das estruturas partidárias.

Uma das medidas que o grupo prepara é a contratação de uma auditoria independente para analisar a movimentação financeira da sigla. Com base nas conclusões, acreditam ter segurança jurídica para deixar a legenda sem correr o risco de perder o mandato.

Presidente do Cidadania, Roberto Freire
Presidente do Cidadania, Roberto Freire: deputados articulam deixar partido - Antonio Molina/Folhapress

A movimentação inclui a bancada federal, hoje restrita a quatro deputados, além de ao menos 12 dos 18 deputados estaduais e ex-parlamentares.

A revolta do grupo não é direcionada ao presidente do Cidadania, Roberto Freire, que tenta esvaziar o movimento, mas a dirigentes internos. O pano de fundo é uma avaliação de que o Cidadania tende a desaparecer nos próximos anos e que não é mais uma opção eleitoral viável.

Caso a saída seja concretizada, os destinos prováveis dos dissidentes seriam PSD, PSB, PSDB e MDB.