segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Ruy Castro - O que desaprendi sobre sexo, FSP

 Num recôndito do armário de vassouras, encontro uma pequena coleção de livros antigos. Em 27 anos neste apartamento, nunca desconfiara da existência deles. Devem ter pertencido aos avós dos moradores originais. São livros sobre educação sexual, todos dos anos 1930, a maioria por médicos americanos. Tirei uma tarde para examiná-los.


No primeiro, "Minha Vida Sexual", de William Harrison, encontrei: "Aprendi em tenra idade que era prejudicial mexer indevidamente nos órgãos sexuais, por atrofiar o desenvolvimento normal". Sério? Mais adiante: "O excesso de afagos de uma jovem mãe numa criança de peito pode dar ao filhinho prejuízo irreparável". Bem, depende do peito.

Abri outro, "Porque os Homens Falham", de William White. E por que "falham"? Porque, segundo ele, "até ontem, as princesas estavam em seu jardim a comer pão com mel ou junto ao tanque ou a pia da cozinha, ao passo que hoje enxameiam nos escritórios". E cita o caso de uma estenógrafa que foi "noiva de todos os sócios da firma até casar-se com o mais velho". Bem feito, quem mandou os outros "falharem"?

Em "Perversões Sexuaes", J.R. Bourdon afirma que "aqueles que amam as louras, as morenas, as magras, as gordas, são fetichistas". Perfeito, mas por que omitir os que amam as ruivas, as canhotas, as de dieta? Já em "A Inversão Sexual", do celebrado Havelock Ellis, li que "a atração homossexual é provocada pela ausência do outro sexo. Exemplo: [por falta de frangas] os franguinhos se entregam a ensaios com indivíduos do mesmo sexo". Imagino o velho Havelock, excitadíssimo, diante do galinheiro.

E em "Psychoses do Amor", do brasileiro Hernani de Irajá, descubro que "o mecanismo que explica a necessidade sexual é um influxo que parte da organização somática, variando na intensidade ou no comprimento da onda". Não entendi, mas desconfio que isso, sim, é uma perversão.

Os livros dos anos 1930 sobre educação sexual - Heloisa Seixas

Lygia Maria - Ruídos na comunicação, FSP

 Atrás de uma vidraça trincada, Lula sorri enquanto ajeita a gravata. Essa foto causou grande polêmica nos últimos dias. Gabriela Biló, fotógrafa da Folha, usou a técnica de múltipla exposição (quando se captam duas imagens no mesmo frame do filme).


Para alguns críticos, isso é fake news, já que a cena não estava dada na realidade. Seria uma distorção que privilegia a visão pessoal da autora em detrimento dos fatos.

Objetividade na imprensa é fundamental. No entanto esse aspecto não é nem essencialista nem funcionalista: o jornalismo não é apenas o relato frio e distanciado da realidade atual. Daí o conceito de "jornalismo opinativo" —que engloba colunas, crônicas, artigos— assim como a quebra paradigmática do "jornalismo literário" de Hunter Thompson entre outros.

Encaro a peça de Biló como uma foto opinativa, com um mandatário alvo de agressão (o vidro partido) mas que, mesmo assim, a supera (o sorriso, a gravata). Uma legenda mais didática sobre a técnica e o contexto político evitaria ruídos na comunicação.

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Foto feita com técnica de múltipla exposição mostra o presidente Lula e vidro avariado após ataques do dia 8 de janeiro - Gabriela Biló - 18.jan.2023/Folhapress

Muito mais poderia ser dito sobre o tema, que é rico principalmente para pesquisadores e jornalistas. Mas o que chamou atenção foi a crítica ideológica distorcida e, em muitos casos, violenta. Sugerir que o jornal ou a fotógrafa incentivaram o assassinato do presidente é um disparate digno de teorias da conspiração.

Biló recebeu uma enxurrada de xingamentos e até ameaças. Qualquer semelhança com o tratamento dado a jornalistas por bolsonaristas não é mera coincidência: os extremismos se tocam.

Até a Secom da Presidência emitiu uma nota repudiando a foto de forma ignóbil e autoritária. Numa democracia liberal, não é papel do Executivo bancar o ombudsman da imprensa. A esfera do debate público consegue muito bem lidar com a controvérsia.

O lado bom do imbróglio é que, se radicais da esquerda e da direita atacam o jornalismo, ele deve estar no caminho certo. Como disse Millôr, "imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados".

sábado, 21 de janeiro de 2023

Múcio fala em fratura na relação com Exército ao oficializar troca de comando, FSP

 

BRASÍLIA

O ministro da Defesa, José Múcio, oficializou, na noite deste sábado (21), em uma fala de 1 minuto, a troca no comando do Exército, após a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de demitir do posto de comandante do Exército, o general Júlio Cesar de Arruda.

Afirmando ter havido uma "fratura" na relação de confiança com a Força, Múcio disse que a decisão pela troca teve o objetivo de estancar o problema "logo no início".

"Evidentemente que com esses últimos episódios, a questão dos acampamentos, a questão do [ataque] dia 8 de janeiro, as relações no comando do Exército sofreram uma fratura no nível de confiança. Achávamos que podíamos estancar isso logo no início", disse Múcio no breve discurso ao lado do novo comandante, que não se pronunciou.

Foi escolhido para o posto do atual comandante militar do Sudeste (responsável por São Paulo), general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva.

Lula, de camisa branca, cumprimenta com aperto de mãos o comandante do Exército, de farda, ambos sorriem
Lula cumprimenta o novo comandante do Exército, o general Tomás Ribeiro Paiva - Ricardo Stuckert/Divulgação

A Fala de Múcio ocorreu no Palácio do Planalto após reunião entre ele, Lula, o novo comandante e o ministro da Casa Civil, Rui Costa. O titular da Defesa afirmou que a passagem do posto ocorrerá na próxima semana.

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Em seu perfil no Twitter, Lula publicou foto cumprimentando o novo comandante e disse desejar "um bom trabalho ao general".

A reunião foi realizada assim que Lula desembarcou da viagem que fez neste sábado a Roraima para acompanhar a situação na terra indígena yanomami, que tem atualmente crianças e idosos em estado grave de saúde, principalmente com desnutrição grave, malária e infecções respiratórias.

A troca no Exército, a principal das três Forças Armadas, ocorreu em meio a uma crise de confiança aberta após os ataques do dia 8 de janeiro, em Brasília.

Arruda tinha sido nomeado para o comando da Força em 28 de dezembro, antes da posse de Lula como presidente. Ele havia sido escolhido por critério de antiguidade pelo ministro da Defesa, José Múcio Monteiro.

Segundo auxiliares do presidente, a decisão foi tomada porque Arruda não demonstrou disposição de tomar providências imediatas para reduzir as desconfianças de Lula em relação a militares do Exército após a invasão do Palácio do Planalto e das sedes do STF (Supremo Tribunal Federal) e do Congresso. Arruda relutou em expor o Comando Militar do Planalto, que no mínimo falhou no dia 8.

Arruda convocou reunião na manhã deste sábado com o Alto-Comando da Força para confirmar ao generalato a decisão de Lula. Três generais que participaram da reunião virtual afirmaram à Folha que Arruda não deixou claro qual teria sido a principal motivação para sua demissão.

Ele disse, segundo os relatos, que, na sexta-feira (20), passou horas junto com Lula em reunião que foi considerada produtiva sobre investimentos em projetos estratégicos na área da defesa.