sábado, 21 de janeiro de 2023

Governo busca apoio do agronegócio a texto da reforma tributária, OESP

 Na articulação para a aprovação da primeira etapa da reforma tributária, o Ministério da Fazenda mapeou as resistências à proposta no Congresso, e identificou o setor do agronegócio como um dos principais focos de oposição às mudanças nos impostos que incidem sobre bens e serviços.

A avaliação é de que essa resistência seria ainda maior do que a feita pelo setor de serviços, que há anos vem liderando uma frente contrária à aprovação da reforma no Congresso e defendendo a tese de criação de uma nova CPMF – rejeitada pela equipe atual.

Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Lula, presidente da República, buscam apoio para a reforma tributária
Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Lula, presidente da República, buscam apoio para a reforma tributária  Foto: André Borges/EFE

A equipe econômica aposta em “diálogo transparente” e em material informativo para derrubar “mitos” que o governo Lula considera que foram sendo construídos nos últimos anos para impedir o avanço da criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA).

O ministro da Economia, Fernando Haddad, já conversou com o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República, Paulo Pimenta, para afinar a comunicação da reforma tributária, que ele vê como central na sua estratégia de política econômica para o crescimento.

Segundo o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), diretor da Frente Parlamentar do Agronegócio – e que será o vice-presidente da instituição –, o setor tem participado ativamente no Congresso dos debates em torno da reforma tributária, tanto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110 quanto da 45. A primeira cria a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), unindo PIS e Cofins, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), unindo ICMS e ISS. Já a 45 substitui cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um Imposto sobre Bens e Serviços e um Imposto Seletivo sobre cigarros e bebidas alcoólicas.

“Fomos propondo um conjunto de medidas, e nos sentimos muito próximos de posições que estão esboçadas no relatório que foi apresentado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Há ainda pontos a detalhar, mas houve um avanço”, afirmou. Ribeiro relatou o texto de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP).

‘Cadeia toda’

Ele diz que a FPA pleiteia que o setor seja contemplado “na amplitude da sua cadeia”. “Muitas vezes se dissemina uma imagem de que o setor é menos taxado em relação a outros setores da economia, como comércio e indústria. Quando nós vemos como um todo a cadeia, vemos que a elevada taxação que existe no Brasil também atinge o setor agro”, diz.

Já a Confederação Nacional do Agronegócio avalia que, nos projetos de reforma tributária que tramitam no Congresso (como as PECs 45 e 110), o “aumento da carga tributária recai nos insumos, nas vendas dos produtos agropecuários e, também, na cobrança do Imposto de Renda da atividade rural”.

Texto de reforma costurado por Haddad deve ser mistura de PECs

O novo texto de reforma tributária será mesclado da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 110) do Senado e da PEC 45, em tramitação na Câmara, para a construção da proposta do governo Lula a ser apresentada até abril, de acordo com compromisso assumido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Segundo apurou o Estadão, a proposta deve permitir a devolução do imposto cobrado no preço dos produtos em forma de crédito para famílias de baixa renda, num cenário de eliminação da isenção do PIS/Cofins dos produtos da cesta básica – política considerada distorcida pela atual equipe econômica. Hoje, os itens da cesta básica são isentos, mas o beneficio alcança pobres e ricos. A isenção acabaria, mas as famílias com menor renda receberiam a devolução do imposto embutido nos produtos que compram.

O governo ainda não bateu o martelo se vai fazer um modelo de IVA dual (um tributo federal e outro dos Estados e municípios), previsto na PEC 110. Ou criar logo o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o IVA nacional, que reúne todos os impostos sobre consumo e está no desenho da PEC 45. A expectativa é de que a equipe econômica opte pela criação do IBS, substituindo cinco tributos – PIS, Cofins, IPI (federal); ICMS (estadual) e ISS (municipal).

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Segundo a diretora de cursos da York University e coordenadora executiva do grupo de trabalho sobre IVA do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Melina Rocha, o agronegócio em geral possui uma série de regime e tratamento especiais e tem medo de perdê-los porque a reforma do IVA propõe e extinção de benefícios e regimes diferenciados de tributação.

“Mas eles não veem que as vantagens que a reforma vai trazer, especialmente para os exportadores. É um grande benefício, em termos de possibilidade de compensação de crédito e devolução do crédito acumulado”, diz Melina, que participou como técnica do texto da PEC 110. Ela aposta que o secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, fará um resgate da PEC 45, já que foi um dos seus autores técnicos. Segundo ela, deve-se manter mecanismo da PEC 110 para compensação de perdas na transição para a Zona Franca de Manaus.

Zona Franca

“A negociação foi feita com eles, mas achamos que a própria questão da PEC não ter sido votada na foi por conta da pressão da Zona Franca e do agronegócio”, destaca a tributarista, que lembra que faltou quórum na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para a votação. Segundo ela, um dos grandes pontos de discussão é o IPI. Na PEC 110, o relatório manteve o IPI para trazer o apoio da Zona Franca. Já na PEC 45, o IPI é extinto e é incorporado.

Vanessa Rahal Canado, do Insper e ex-assessora do Ministério da Economia para a reforma tributária, atribui as resistências do agronegócio e de serviços ao fato de que os setores olham apenas a foto de curto prazo, sem ver o impacto na cadeia como um todo. É o caso do produtor rural, que tem uma alíquota nominal de zero e não quer ser taxado com uma alíquota de 25% do IBS.

“É essa fotografia que eles olham, mas como o imposto é creditável para a próxima fase da cadeia, a alíquota de 25% para o produtor rural, na dinâmica de compras e vendas, é melhor que o zero e a isenção”, diz.

A maioria dos produtores rurais, devido a um incentivo, opera como Pessoa Física porque a apuração é mais vantajosa do que na pessoa jurídica. Entre os incentivos, que o agronegócio não quer perder é o incentivo do crédito presumido do custo com a compra de insumos. Na sua avaliação, foi muita positiva a decisão de priorizar a reforma do consumo ao invés do Imposto de Renda. “Em termos de prioridade, é mais relevante. Vamos ver o Brasil crescer com a aprovação do IVA”, diz.

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Árvore e floresta

Pelos cálculos do Professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Edson Domingues, todos os setores ganham, em maior ou menor grau. “O setor de serviços tende a ganhar um pouco menos do que o industrial. A agricultura tende a ganhar também em termos gerais”, diz. Ele considera que há um entendimento um pouco equivocado do que seria a nova estrutura tributária com o IVA.

Domingues diz que o setor já participou de discussões com o setor agrícola e de serviços, que segundo ele têm dificuldade de perceber as vantagens da reforma. “O setor é uma árvore e não olha a floresta. Parte da resistência vem daí. A reforma tende a homogeneizar a carga tributária com imposto igual para todo mundo com débitos e créditos”, explica.

Hélio Schwartsman Um sigilo a preservar - FSP

 Hoje eu vou defender Jair Bolsonaro. Não acho que o sigilo sobre seu prontuário médico e cartão de vacinação deva ser retirado. É verdade que essa é uma defesa bem indireta. Não tenho nenhuma intenção de agradar ao ex-presidente nem coloco seu bem-estar entre as minhas prioridades. Penso, porém, que o sigilo médico é uma instituição que precisa ser respeitada, inclusive no caso de Bolsonaro.

São duas as razões que me levam a advogar por uma confidencialidade forte para informações médicas. A primeira é a proteção da intimidade. Uma boa anamnese pode incluir o que há de mais íntimo sobre uma pessoa, de suas preferências sexuais a hábitos alimentares, passando por eventuais vícios e histórico de doenças, do próprio indivíduo e de sua família. Não é por outro motivo que o prontuário é considerado um documento de propriedade do paciente, ainda que fique sob a guarda de profissionais ou instituições de saúde.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) retira máscara no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 10.jun.21/Folhapress

Mais importante, a garantia de sigilo em relação ao que o paciente conta para o médico (e vai para seus registros) tem por finalidade a preservação da vida e da saúde. Ela existe para que ninguém deixe de procurar socorro por medo de encrencar-se com a Justiça. Se a polícia tivesse acesso irrestrito a todos os prontuários que indiquem consumo de drogas ou tentativas de aborto, muita gente deixaria de buscar hospitais na hora do aperto, o que teria graves consequências sanitárias. Hospital não é nem pode tornar-se delegacia.

É claro que nenhum direito é absoluto, de modo que existem situações em que o sigilo pode ser levantado. Mas elas devem ser excepcionais, coisas como impedir que o paciente psicótico assassine alguém ou evitar que o sifilítico que recusa antibióticos siga infectando amantes. A curiosidade pública não está entre essas razões.

sigilo médico é importante para a sociedade. Não devemos permitir que Bolsonaro destrua também essa instituição.

Cérebro eletrônico, editorial FSP

A inteligência artificial, mais exatamente a IA generativa, surge como bode expiatório da vez na seara das novidades tecnológicas. Há razões para temer desvios com programas capazes de gerar textos que parecem escritos por humanos, não tanto, porém, para pânico.

Tecnologias inovadoras sempre despertaram desconfiança. Foi assim com rádio e TV, transplantes de órgãos, computadores, fertilização in vitro, telefones celulares, manipulação genética etc. Contudo, a seu tempo, todas foram assimiladas —em alguns casos apoiadas sob regulamentação necessária.

Com a velocidade crescente de disseminação, a reação inicial costuma revestir-se de alarmismo.
No caso da IA em questão, a polêmica começou no final de 2022, quando a empresa OpenAI —apoiada pela Microsoft— disponibilizou o acesso gratuito ao seu programa ChatGPT, colocando assim um gerador de textos nas mãos de qualquer pessoa conectada. Concorrentes já estariam em aquecimento para adentrar na competição que se afigura bilionária.

Não demorou para o recurso ser empregado por estudantes e pesquisadores na confecção fraudulenta de trabalhos intelectuais. Trata-se de variedade sofisticada de plágio, afinal o programa se vale do que já existe na rede mundial para articular conteúdos emulando de modo convincente a linguagem humana natural.

Instituições acadêmicas já providenciam formas de contenção dos desvios, como novas modalidades de avaliação e algoritmos para detectar escritos de máquinas. Nada tão diverso do desafio que já enfrentam com o copia e cola a partir de mecanismos de busca.

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Outra maneira de encarar a IA direciona o foco para suas potencialidades. Ela pode liberar mentes humanas de uma série de tarefas tediosas para dedicarem mais tempo àquilo em que brilham: exame de particularidades para criar soluções impensadas e tomar decisões adequadas a cada caso.

Entre as aplicações mais promissoras se encontram diagnósticos e relatórios médicos, pareceres jurídicos, geração e correção de códigos para softwares, compilação de dados e assim por diante. Não haveria motivo para tolhê-las com interdições paternalistas.

Dito isso, é legítima a preocupação com distorções da tecnologia, como facilitar a viralização de notícias falsas e a difusão de programas para infectar computadores.

A prevenção de malefícios, como de hábito, se fará com controle social, autorregulamentação, regulação e responsabilização judicial dos abusos. Nada de novo sob o sol.

editoriais@grupofolha.com