quinta-feira, 18 de agosto de 2022

TJ-SP cria novo auxílio no salário por alegado excesso de trabalho de magistrados, FSP

 Artur Rodrigues

SÃO PAULO

TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) criou um novo auxílio financeiro para magistrados por alegado excesso de trabalho. O novo benefício será de até um terço do subsídio pago a juízes e desembargadores.

O tribunal já tomou medidas que envolvem aumento de gastos com benefícios neste ano. Por exemplo, o órgão triplicou o limite do reembolso pago a título de auxílio-saúde, de 3% para 10% do valor dos salários.

A implementação da chamada gratificação por acumulação de acervo processual, publicada nesta quinta (18) no Diário Oficial, vale para magistrados que recebem processos em patamar igual ou superior ao estabelecido pela direção do TJ.

 Fachada do prédio do Palácio da Justiça de São Paulo, sede do Tribunal de Justiça
Fachada do prédio do Palácio da Justiça de São Paulo, sede do Tribunal de Justiça - Eduardo Knapp/Folhapress

Segundo o Órgão Especial do TJ-SP, o benefício não vale para o presidente e para o corregedor do órgão. Com exceção deles, a publicação cita critérios para o pagamento a juízes e desembargadores. Adicional do tipo é pago em outras cortes, com base em indicação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Os desembargadores ganham R$ 35.462,22, mas com os chamados penduricalhos esse valor pode chegar a R$ 56 mil, sem contar os descontos. Já os salários menores, de juízes substitutos, são de R$ 28.883.

Assim como o auxílio-saúde, o CNJ recomenda o adicional por excesso de trabalho desde 2020. No entanto, os tribunais não são obrigados a adotar as medidas. De acordo com recomendação do conselho, somado ao auxílio de um terço do subsídio, o salário não pode ultrapassar o teto, referente aos vencimentos dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), de R$ 39.293.

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Entre os dados que basearam a recomendação do CNJ está um levantamento segundo o qual, de 2010 a 2019, o número de magistrados no Brasil cresceu 7,2% (de 16.883 para 18.091), enquanto os casos novos no Poder Judiciário avançaram 26%, passando de 24 milhões a 30,2 milhões por ano.

No início do ano, a corte aumentou a possibilidade de reembolso mensal de auxílio-saúde dos magistrados. Assim, os limites mensais de reembolsos para os desembargadores, que chegavam a pouco mais de R$ 1.000, podem saltar para mais de R$ 3.500. Para pagamento desse auxílio, no entanto, é necessária a comprovação da despesa pelo magistrado.

O TJ-SP também quer criar um novo cargo, o do quinto assistente para os gabinetes. O projeto, nesse caso, necessita de aprovação da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo).

No ano passado, o TCE flexibilizou um acordo feito com o TJ para que o órgão reduzisse progressivamente o percentual de suas despesas com pessoal até o fim de 2021. O prazo para que esse ajuste chegasse ao fim passou para 2023. Apesar dos problemas financeiros, o órgão frequentemente chama a atenção em razão dos gastos. Algumas vezes, após repercussão negativa, acaba recuando.

Por exemplo, a Folha mostrou que até o ano passado o tribunal usava uma verba reservada a situações urgentes e imprevisíveis para comprar petiscos e outras regalias aos seus 360 desembargadores.

A chamada "verba de adiantamento" vinha sendo usada pelo tribunal para fazer compras que incluíam produtos como queijo maasdam holandês (R$ 67,90/quilo) e salame hamburguês Di Callani (R$ 60,25/quilo), além de frutas como kiwi gold (R$ 59,99/quilo). Após reprimenda do TCE, a corte informou internamente que deixaria de fornecer lanches a gabinetes de desembargadores por meio dessa verba.

Em 2019, a construção de um prédio bilionário para abrigar gabinetes de desembargadores foi suspensa após repercussão negativa. Em 2020, o órgão anunciou prêmio de até R$ 100 mil a desembargadores que julgassem processos durante a crise. O CNJ foi acionado, e o órgão suspendeu a medida.

Sérgio Rodrigues - Patos mancos só tomam café frio, FSP

 O título aí em cima, que junta duas expressões divertidas do vocabulário político para falar de governantes que estão de saída do poder, me veio à cabeça quando vi a antológica cena em que toda a República aplaude o elogio à urna eletrônica feito por Alexandre de Moraes em sua posse como presidente do TSE.

Quer dizer, toda a República menos seu atual presidente. O ar infinitamente desacorçoado de Jair Bolsonaro naquele momento renova e revitaliza a iconografia histórica do pato manco a quem, de hoje em diante, servirão cafés cada vez mais frios.

Se o Pato Donald fosse atropelado por um tanque fumacento do Exército, não pareceria mais manco do que Bolsonaro ao ver seu delírio golpista ser declarado oficialmente delirante por todos os principais atores institucionais do país.

Imagem mostra Bolsonaro ao centro, ao lado de Alexandre de Moraes e outros ministros; ele olha para Lula e Dilma, que estão à frente
Posse de Alexandre de Moraes no TSE reuniu ministros de Estado, embaixadores e ex-presidentes, como Lula e Dilma, além de Jair Bolsonaro - Mateus Vargas - 17.ago.22/Folhapress

Deve-se somar a isso o fato de que, apenas um dia antes e a um mês e meio da eleição, as últimas pesquisas tinham jogado água fria em seu sonhado café (meio quilo a R$ 20) de uma virada eleitoral contra o favorito Lula.

Pato manco é a tradução literal de "lame duck", expressão do vocabulário político americano que começou a circular no Brasil há cerca de meio século, a princípio apenas no noticiário internacional.

Um de seus registros mais antigos em nossa imprensa é uma notícia do extinto diário carioca Jornal do Brasil sobre o presidente Richard Nixon em 1973, quando o caso Watergate já estava em andamento. Curiosamente, a expressão vinha com iniciais maiúsculas: "Nixon é um Pato Manco".

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Nascida no século 18 para designar uma pessoa ou empresa falida, incapaz de pagar suas dívidas e obrigações, a expressão circulava nos EUA desde meados do século 19 com o sentido de político que cumpre penosamente o fim de seu mandato após não conseguir se reeleger —e mais tarde, por extensão, de qualquer um que viu sua Bic ficar sem tinta, esteja em que ponto do mandato estiver.

Uma curiosidade etimológica extra é que "lame" (manco, deficiente) é uma palavra vinda do inglês antigo "lama". Qualquer semelhança com a nossa lama pode até ser providencial mas é, sim, mera coincidência.

O melhor equivalente nacional do "lame duck" é o do mandatário em fim de linha a quem passam a servir café frio no próprio palácio de governo. O jornalista Elio Gaspari, ilustre colega de Folha, foi o responsável por consagrar a expressão.

Em 2002, Gaspari perguntou ao senador José Sarney: "No final do seu governo o café vinha frio?". A resposta do ex-presidente (1985 a 1990), que em 1987 fora chamado de "lame duck" pela revista Newsweek e que estava esta semana na plateia do TSE aplaudindo Moraes: "Nunca. Isso é folclore".

Nada disso quer dizer que Jair Bolsonaro já não ofereça risco à democracia brasileira. No entanto, o apoio geral e efusivo ao novo presidente do TSE —desde já uma das cenas mais marcantes do atual governo— ampliou seu isolamento a um nível inédito.

Se a "Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito" "aumentou o preço do golpe", como bem observou Celso Rocha de Barros, a cerimônia de posse de Alexandre de Moraes elevou esse preço a patamares estratosféricos.

Era isso que se podia ler nos olhos perdidos de Jair Bolsonaro enquanto seu grande desafeto era ovacionado: o olhar do trabalhador brasileiro médio diante da vitrine em que se desnudam as curvas aerodinâmicas de uma pornográfica Ferrari.