sexta-feira, 15 de abril de 2022

Enquanto Lula descamba para o palavrório, Mélenchon apresentou programa para a França, Mario Sergio Conti, FSP

 A derrota não inspira, abate. A fala com que Jean-Luc Mélenchon admitiu que não iria ao segundo turno foi uma exceção. O candidato da França Insubmissa até puxou o coro "a luta continua", um clássico da esquerda vencida. Mas não semeou ilusões.

"Não vamos esconder a violência da decepção", disse. Ele perdeu de Marine Le Pen por 421 mil votos, menos de 1% do eleitorado. Seu desencanto não foi com o PS, o PCF e os Verdes. Se tivessem se juntado a ele, venceriam a candidata racista e empatariam com o dos ricos, Macron.

Ilustração da coluna de Mario Sergio Conti de 16 de abril de 2022
Bruna Barros

Sua decepção era com o amanhã, com o "que poderia ser feito e não será". Quanto ao futuro mais à frente, alertou: "Como o mais velho entre vocês, é meu dever dizer que nossa única tarefa é a que o mito de Sísifo realiza: o rochedo cai no barranco, e o puxamos para cima".

Falar que o futuro será íngreme e não se triunfa sem engajamento é um realismo raro na política. Mas algo foi feito: "Temos uma estratégia, a do polo popular. Temos um programa. Temos outras eleições à frente". Com 70 anos, Mélenchon passou a tocha para os jovens: "Façam melhor".

Ele foi o preferido entre de 18 a 34 anos. Teve mais votos que a soma dos adversários nos departamentos de ultramar. Venceu na Grande Paris, em Marselha e Lyon, em Lille e Toulouse. Tinha um programa e as palavras certas para convencer as gentes.

Para Mélenchon, a França está dividida em três polos. O do liberalismo predatório de Macron. O da extrema direita de Le Pen. E o polo popular da França Insubmissa. Defendeu que o país vive quatro crises combinadas: social, energética, europeia e política.

Para enfrentar a primeira, propôs aumentar o salário mínimo para 1.400 euros; aposentadoria aos 60 anos (Macron a quer aos 65, e Le Pen, mantê-la aos 62); taxação das grandes fortunas; mais verbas para escolas e hospitais. Na energia, queria trocar usinas nucleares por combustível limpo.

No plano continental, pregou que a França saia da Otan —o que exorcizaria guerras— e que a União Europeia sirva aos povos, e não ao capital. Contra a Constituição caduca, convocaria uma assembleia constituinte soberana para fundar uma república livre, fraterna e igualitária.

Nada disso tem a ver com o Brasil. O polo liberal daqui é uma briga de foice no escuro. Já o da extrema direita tem começo (provocação), meio (putsch milico-miliciano se perder a eleição) e fim (ditadura). Aposta na arruaça, em instituições lassas e em liberais tíbios.

O PT poderia pôr de pé o polo popular, mas prefere abarrotar de cobras e lagartos uma arca de Noé maior que o Maracanã. Sua meta é vencer Bolsonaro por meio de conchavos com bichos do arco da velha. E tome coquetéis com monstros furta-cor e furta-tudo. Se alguém critica, lá vem o berro: senta que o leão é manso!

Caso a nau bolsonarista vá a pique, a arca de Lula se verá num dilúvio sem o mapa de um programa. Por isso ziguezagueia e solta pombas para achar um porto. Jura que, se o mar fosse de cerveja, Putin não invadiria a Ucrânia. Profetiza um tempo sem maremotos.

A arca do polo sem prumo nem rumo navega num mingau de palavras. Não cabem comparações à França porque a palavra política tem pesos diversos. Lá, ela está colada à luta. Cá, é deixa-disso pastoso.

Lá: a oratória popular se assenta numa história de embates que remonta a 1789. Passa pelo regicídio de Luís 16 e a Comuna de Paris, pela resistência ao nazismo e o Maio de 1968. Ainda ontem, pulsava na fronda dos coletes amarelos. Tribuno nato, Mélenchon é fruto dessa tradição.

Cá: à força de escravidão e analfabetismo, as classes dominantes fizeram da palavra política uma ferramenta de dominação. Vide o rococó dos preclaros confrades, as bacharelices que prostram e engabelam a malta.

A verve elétrica de Lula vem do sindicalismo combativo, mas às vezes descamba para o palavrório de Silvio Santos e Faustão. Ele parece se deliciar com a algaravia, lembra mais um animador de auditório que um líder. Orra, meu.

A diferença é nítida nos comícios. Em Paris, Mélenchon falou uma hora num palanque sem papagaios de pirata. O som era claro e dezenas de milhares o escutaram em silêncio. Sem vulgaridades, convenceu-os que só persuadindo quem não estava ali poderiam vencer.

Mesmo após a proibição de showmícios, há no Brasil mais gente no palco que na plateia. Partidos se estapeiam numa cacofonia de palavras de ordem e bandeiras. O som é horrível e não se ouve o orador. Como na Proclamação da República, assistimos a tudo bestializados.

Conheça as novas funções do WhatsApp: de reação com emojis a grupo ampliado pós-eleição, FSP

 O WhatsApp lançou nesta quinta-feira (14) em estágio experimental um novo recurso chamado "comunidades", que funcionará como um guarda-chuva abrigando vários grupos com milhares de usuários.

Na prática, trata-se de um grande grupo de grupos, que pode ter milhares de membros, com toda a comunicação criptografada. Hoje, cada grupo de WhatsApp tem, no máximo, 256 integrantes.

O recurso estará em teste com alguns usuários nos próximos meses.

Imagem do aplicativo do WhatsApp em celular
Imagem do aplicativo do WhatsApp em celular - AFP

WhatsApp se comprometeu com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a não estrear as "comunidades" no Brasil antes do eventual segundo turno da eleição presidencial, marcado para 30 de outubro. A empresa, porém, não promete segurar o lançamento das comunidades entre o segundo turno e a posse presidencial no Brasil.

Em entrevista à Folha, Will Cathcart, presidente global do WhatsApp, disse não temer que o "comunidades", recurso que permitirá enviar mensagens criptografadas para milhares de usuários, signifique um retrocesso na luta contra a desinformação.

"Estamos desenhando o produto de forma cuidadosa, com intencionalidade. Há vários produtos no mercado que não foram pensados com o mesmo cuidado. Conseguiremos oferecer um recurso muito útil para os usuários, ao mesmo tempo em que teremos decisões cautelosas de design para combater desinformação", disse.

PUBLICIDADE

Confira, a seguir, outras novidades da plataforma de mensagens.

O QUE MUDA NO APLICATIVO

Comunidades

  • Vão englobar até 10 grupos com limite de 256 pessoas em cada. O WhatsApp estuda aumentar a capacidade dos grupos para 512 usuários;
  • Um administrador poderá mandar um aviso para todos os grupos de uma comunidade e atingir até 2.560 usuários de uma vez;
  • Mensagens encaminhadas podem ser retransmitidas a um grupo por vez, e não mais para cinco como é hoje. A medida é uma das que estão em desenvolvimento para coibir a desinformação no aplicativo;
  • O WhatsApp garante que as funcionalidades não estarão disponíveis antes das eleições presidenciais

Mudanças no formato atual do aplicativo

  • Administradores poderão excluir mensagens erradas ou problemáticas dos grupos. Hoje cada usuário só pode remover a própria postagem;
  • Arquivos compartilhados, como vídeos, fotos e documentos vão poder ter até 2 Gb de tamanho máximo, contra os 10 Mb atuais;
  • Usuários vão poder reagir a mensagens de outros usuários com emojis;
  • Chamadas de voz vão poder reunir até 32 pessoas. O WhatsApp quer concorrer com aplicativos que ganharam força na pandemia, como o Meet e o Teams

quarta-feira, 13 de abril de 2022

Helio Beltrão A função social da riqueza, FSP

 John Rawls, em Teoria de Justiça (1971), se contrapõe ao utilitarismo, constrói princípios inéditos de justiça, e chega a conclusões indefensáveis e socialmente instáveis, como argumentei nesta coluna na semana passada.

Hoje sigo no assunto para ilustrar que o libertarianismo é uma alternativa não apenas mais justa, mas especialmente mais eficaz, em especial aos menos favorecidos.

A solução igualitária e construtivista de Rawls implicaria uma máquina estatal de contínua redistribuição coercitiva da propriedade privada. Ele afirma defender o status moral de cada indivíduo, mas enfraquece sua posição ao deixar de assegurar a propriedade e a livre associação, aspectos fundamentais de nossa individualidade, daquilo que nos torna humanos. Por exemplo, o direito básico de fundar um pequeno negócio, de contratar e ser contratado no mercado de trabalho em termos mutuamente aceitos, ou mesmo de possuir meios de produção triviais (como um computador ou uma van).

0
Cédulas de dólar - Gabriel Cabral - 24.jan.2019/Folhapress

A história desconhece qualquer ordem social que tenha respeitado direitos políticos e individuais sem assegurar a propriedade privada. Como dizia Cícero há 2.000 anos, "não há nada tão absurdo que algum filósofo já não tenha defendido".

Durante sua carreira, Rawls evitou endereçar a filosofia política do libertarianismo. Esta, entre as demais liberdades individuais, reconhece a propriedade privada, que por sua vez é gerada a partir dos talentos, paixões e trabalho.

Robert Nozick, filósofo do libertarianismo deontológico, tira Rawls do conforto em Anarquia, Estado e Utopia (1974). Sustenta que qualquer padrão de distribuição da renda, riqueza ou bens entre indivíduos, não importa quão desigual, é justa desde que derivada de meios legítimos, por exemplo trocas voluntárias com terceiros.

Segundo o libertarianismo deontológico, somos donos de nós mesmos e, por extensão, titulares daquilo que resulta de nosso trabalho e de nossas trocas voluntárias. O esbulho da propriedade por terceiros é, portanto, ilegítimo. Para os libertários, o Estado possui legitimidade apenas ao proteger os cidadãos contra agressões (ou fraude) à pessoa, liberdade e propriedade. Para os libertários anarcocapitalistas, mais estritos, o Estado age de forma legítima apenas se o serviço estatal em questão ocorrer em bases voluntárias e contratuais.

Rawls acreditava que não havia relação entre os mercados e a propriedade, e que, para a formação de preços, tanto fazia o socialismo ou o mercado. Tampouco se ocupou com as precondições para o aumento da oferta de educação, saúde, e outros produtos e serviços voltados a aprimorar as oportunidades e a renda dos mais pobres. Caolho, só olhava a demanda.

Em seu paradigma de contínua redistribuição com altos impostos, haveria muito menos acumulação de poupança, investimento, inovação, e empreendedorismo do que em um ambiente de proteção à propriedade privada e liberdade de contratação e associação. E por extensão, haveria menos oportunidades e prosperidade para os mais precarizados.

O período desde 1800 –denominado pela economista Deirdre McCloskey como "O Grande Enriquecimento"–, multiplicou a renda média de países mais liberais entre dez e 20 vezes, com melhoria ainda mais acentuada dos mais pobres, que na média possuem padrão de vida similar ou superior ao dos nobres de então. Nem Rawls nem Marx compreenderam que, em um ambiente liberal, os lucros e riqueza acumulados pelo empreendedor e pelo provedor de capital representam apenas uma fração do enorme valor gerado aos demais.

Para o libertarianismo consequencialista, portanto, a ciência econômica e a história salientam o motivo mais pertinente para favorecer mercados mais livres, com proteção à propriedade privada: a prosperidade dos menos favorecidos.