quarta-feira, 20 de outubro de 2021

São Paulo tem 546 mil motoristas em apps de transporte, revela CPI municipal, FSP

 Artur Rodrigues

SÃO PAULO

A cidade de São Paulo tem mais de 546 mil motoristas cadastrados por aplicativos, que fazem 25 milhões de viagens por mês, revelam dados municipais citados na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Aplicativos apresentados nesta terça-feira (19).

Presidida pelo vereador Adilson Amadeu (DEM), que tem base eleitoral entre taxistas, a CPI visa apurar irregularidades nos aplicativos que circulam na cidade. Os parlamentares consideram que haja uma espécie de caixa preta no setor, com problemas que vão de sonegação fiscal a atuação irregular de empresas.

A comissão ouviu nesta terça o secretário-executivo do CMUV (Comitê Municipal de Uso do Viário), Felipe Pereira.

Vereador Adilson Amadeu, que preside a CPI dos Aplicativos
Vereador Adilson Amadeu, que preside a CPI dos Aplicativos - André Bueno /CMSP

Durante a comissão, o vereador Marlon Luz (Patriota), vice-presidente da comissão, citou dados informados pelo governo municipal que mostram que há 546 mil motoristas de aplicativos cadastrados na capital. Para efeito de comparação, a cidade tem hoje cerca de 38 mil alvarás ativos de taxistas.

Segundo documentos apresentados pelo vereador, 25 milhões de viagens foram feitas em julho deste ano por esses aplicativos de transporte.

A CPI também apura a questão das empresas de entrega via aplicativos, mas não foi informada a quantidade de veículos utilizados pelas empresas.

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Em 2020, essas empresas pagaram R$ 151 milhões em taxas à gestão da capital paulista, segundo Felipe Pereira, da CMUV. Os valores são pagos à prefeitura como uma contrapartida pelo uso do viário da cidade.

Ao menos uma empresa não consta entre as credenciadas pela prefeitura. Questionado por vereadores sobre a empresa inDriver, Felipe Pereira informou que não consta que ela esteja credenciada na cidade.

A reportagem procurou a empresa na manhã desta terça, mas não recebeu retorno até o momento. No site dela, consta que ela tem escritório na Sibéria, Rússia.

Marlon Luz citou caso de motorista que teria sido multado em R$ 5.000 por rodar na cidade usando aplicativo da empresa não credenciada. "Ela opera sem o cadastro, não paga taxa, não informa o município sobre o uso do viário, não sabemos se ela valida o cadastro dos motoristas", diz Marlon.

Adilson Amadeu afirmou que a empresa deve ser fechada. "Vamos fazer uma diligência e levar os órgãos competentes e fechar. Aliás, ela nem poderia estar atuando", disse.

Os vereadores também questionaram o membro do CMUV sobre diversas irregularidades e lacunas relativas ao controle das empresas na cidade, como motoristas com ficha criminal, carros e condutores não cadastrados.

"O que me chamou a atenlão foi como as regras feitas para o CMUV deixam margem para que tenham a sonegação de taxas dos aplicativos", disse Marlon Luz.

Já Amadeu afirmou considerar que o resultado da CPI foi de "arrepiar" e que a comissão vai abrir a "caixa preta" do setor. "Como pode numa cidade como São Paulo em que as empresas de aplicativos vêm de fora, elas têm o controle de tudo, pagam por estimativa, pagam da cabeça dela 0,10 por km rodado", diz. "Para mim, vai ser a maior evasão no cenário de São Paulo".

Um dos principais objetivos da comissão relacionada aos aplicativos é investigar eventual sonegação de impostos e evasão fiscal por parte das empresas. Recentemente, a Câmara fez uma CPI que investigou os bancos, recuperando valores e também rendendo holofotes aos parlamentares que participaram.

Outro ponto a ser investigado é o uso de contas falsas por mototistas nos aplicativos. O documento do requerimento também cita roubos praticados dentro dos veículos "com fortes indício de negligência" das empresas que, segundo o requerimento, falha "em realizar o mínimo de verificação acerca dos usuários da plataforma bem como filtrar e bloquear a criação de contas falsas".

Os vereadores querem apurar ainda o impacto que esse tipo de transporte tem no transporte público. O setor vive uma crise nos últimos anos, com perda de passageiros para os aplicativos.

A pandemia piorou a situação, o que obrigou a Prefeitura de São Paulo a aumentar o bilionário subsídio às empresas de ônibus, que ultrapassou os R$ 3 bilhões.

Segundo o requerimento da CPI, a "prévia análise de estudos que indicam que este modal vem angariando passageiros do transporte coletivo de massa (ônibus e metrô) bem como apuração do pagamento de Km rodado, participação de locadoras, trabalho eventual por condutores, precarização das relações de trabalho, equiparação, jornada de trabalho e possivel vinculo empregada".

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Demanda por combustíveis fósseis mostra fragilidade das energias renováveis, Helio Beltrão ,FSP

 Em seu recente livro, "How to Avoid a Climate Disaster" (Como evitar o desastre climático), Bill Gates define o “ágio verde” (“green premium”) como a diferença de custo entre fazer algo (produto, serviço ou atividade) da maneira tradicional (com emissão de carbono) e fazer o mesmo de forma limpa, “verde”.


Organismos multilaterais e governos de países desenvolvidos têm forçado as empresas a implementar uma transição rápida para o mundo verde. Do lado privado, a mudança no comportamento do consumidor de países ricos e o ESG também contribuem na mesma direção.

A transição energética –cuja meta é alcançar zero emissões líquidas em 2050–, é o maior desafio que a humanidade já teve, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA). Poucos, no entanto, compreendem a magnitude dos sacrifícios necessários para chegarmos lá.

Operações de extração de petróleo em Midland, nos Estados Unidos - Nick Oxford - 11.mai..2021/Reuters

O ágio verde ainda é muito alto, e o encarecimento dos produtos frequentemente os torna inacessíveis para a população de mais baixa renda. A fabricação de aço mais limpo custa 30% mais caro, e o querosene de aviação mais limpo custa mais que o dobro que o tradicional.

Os ambientalistas argumentam que este é um preço baixo a pagar para salvar a humanidade da catástrofe das mudanças climáticas. Mas não são os ambientalistas da ONU que pagam este “imposto verde”. Ao contrário dos pobres no Brasil e em países subdesenvolvidos, a população de países ricos pode se dar ao luxo de pagar mais caro.

Neste ano, a volta à normalidade econômica em um cenário ainda com rupturas das cadeias de suprimento por conta da pandemia revelou a fragilidade da transição: irrompeu uma crise energética global. A crise elevou os preços do carvão, gás natural e petróleo, que por sua vez encarecem quase todos os produtos e aumentam o ágio verde. É o greenflation (inflação dos produtos verdes).

China tem sofrido com cortes de energia elétrica e racionamento; quase 150 mil empresas em Guangdong sofreram cortes em setembro. O crescimento econômico chinês, pujante no primeiro semestre, desacelerou significativamente neste terceiro trimestre, para 4,9%.

A Europa está sob ameaça de apagões e diminuição de produção, em particular com a chegada do inverno. A crise hídrica no Brasil está conectada com a escassez de energia na Europa e Ásia. O Brasil tem importado uma quantidade recorde de gás natural liquefeito, contribuindo com a alta de preços internacionais e a alta nas tarifas de energia por aqui. Ironicamente, o mundo está no momento dependendo de mais combustíveis fósseis.

Porém, a despeito dos aumentos de preços dos combustíveis fósseis, não há aumento correspondente na sua produção. Nos últimos dez anos, os investimentos em exploração e produção das maiores petroleiras caíram à metade e migraram para a transição para energia renovável.

As energias solar e eólica são intermitentes e difíceis de armazenar. E são muito deficientes em uma métrica importante: o EROI (uma comparação entre energia economizada e energia utilizada). Por exemplo, é preciso muito alumínio, cobre e outros metais –que consomem muita energia em sua fabricação– para fabricar turbinas eólicas e painéis solares.

Está claro que a transição rápida para a economia de baixo carbono será conturbada e pode não ocorrer no prazo almejado pelos organismos multilaterais. Quando se mexe na matriz energética, algo complexo e interdependente, de cima pra baixo, de forma brusca, aumenta o risco e a fragilidade do sistema. Isso ficou explicitado pela crise global. Enquanto não se superam os imensos desafios tecnológicos para energia renovável acessível, uma solução pode ser a energia nuclear. A ver qual será a visão dos ESGistas.