segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

O que mais precisa acontecer no Brasil para dar um basta no obscurantismo?, FSP

 Jogou o líder do Covidão-20, logo mais tem o Dérbi na casa verde e o jogador Valdívia, do Avaí, foi retirado de campo no meio do jogo contra o CSA, em Maceió, por ter testado positivo para Covid-19.

Há sérias suspeitas de tramoia por parte do laboratório ligado ao clube alagoano.

Se o teste é à vera, o jogador expôs sabe-se lá quantos outros. Se foi cafajestagem, revela apenas mais uma faceta da elite nacional, capaz de usar a pandemia para enriquecer de todas as maneiras e até ganhar um jogo de futebol.

Porque genocida não é apenas o mentiroso terrorista e corrupto patrono das rachadinhas milicianas que mora no Alvorada e diz viver “num prédio com mais de 200 infectados” que teriam se tratado com as cloroquinas da vida.

Genocidas são os ministros, do apalermado general que pôs no chão a imagem do Exército ao esquecer de comprar seringas e mandar avião buscar vacinas onde não havia para comprar, aos demais que aceitam estar na mesma tragédia.

Genocidas são os da imprensa que aderiram ao negacionismo, que ouvem barbaridades e, além de não contestá-las, as repetem como papagaios alimentados com alpiste contaminado.

Genocidas são os cartolas do futebol que promovem aglomerações de torcedores para incentivar seus times nas portas dos estádios e disseminam o vírus sem dó nem piedade.

Genocidas são os donos das Big Techs que se fizeram de inocentes úteis para dar vazão ao crime organizado da necropolítica. Os banqueiros calados com seus lucros ensanguentados, industriais, “pastores”, donos de jornais, TVs, rádios, que em vez de explicar espalham opinião como se fosse informação, pisoteiam a ciência, dão espaço para charlatães marqueteiros e depois ocultam o que matou alguns deles.

Por falar em morte, porque é só disso que se trata, quem dera só morressem os que aglomeram, não usam máscaras e fazem propaganda dos genocidas.

Canalhas! Canalhas! Canalhas! Genocidas! Genocidas! Genocidas!

A questão não é mais a economia, estúpido!

Nem a política, estúpido!

A questão é humanitária, estúpido!

O único cálculo a ser feito agora é mostrar todos os cúmplices da matança para que, seja lá quando for, em tribunais nacionais ou no exterior, venham a ser condenados por Manaus e por grande parte dos 210 mil mortos que poderia sobreviver.

Revelar os adeptos do tal Tradicionalismo, desvario de extremistas diante da nova revolução tecnológica que poupa mão de obra, determinados a exterminar milhões de vidas tratadas como peso nas contas públicas.

A palavra de ordem do terror moderno é destruir, é desacreditar vacinas, é jogar o jogo dos bárbaros, naturalizar a desgraça, diabolizar a cultura e usar os deuses para, com o perdão da redundância, fanaticamente queimar tudo, dos livros às florestas, em nome do privilégio de quadrilheiros ensandecidos.

O que mais precisa acontecer no Brasil para que se dê um basta ao obscurantismo assassino?

Por quanto tempo mais veremos pessoas morrerem asfixiadas no “pulmão do mundo”?

Ainda não chegou em você?

Você que desdenha da máscara, que aglomerou no Natal, na passagem de ano, que recusa a vacina, que não é maricas, apenas idiota, alienado ou ignorante, cúmplice?

Viver é muito perigoso, escreveu Guimarães Rosa.

Mais perigosa é a covardia, a apatia, a falta de caráter, a canalhice.

Genocidas! Genocidas! Genocidas!

Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

Caixa é o novo operador do seguro DPVAT, diz Susep, FSP

 Diego Garcia

RIO DE JANEIRO

A Caixa Econômica Federal é o novo gestor do seguro DPVAT, informou neste sábado (16) a Susep (Superintendência de Seguros Privados). O contrato foi assinado nesta sexta-feira (15).

De acordo com o órgão, a estatal recebe os avisos de sinistro desde o primeiro dia deste ano. Aqueles ocorridos anteriormente continuam na responsabilidade da Seguradora Líder.

No fim de 2020, o TCU (Tribunal de Contas da União) havia determinado que a Susep obrigasse a Líder a continuar operando o seguro obrigatório, para viabilizar o repasse de R$ 2,25 bilhões que a empresa precisava para cobrir as apólices de 2021.

Caixa é novo operador do DPVAT
Caixa é novo operador do DPVAT - Eduardo Anizelli - 4.set.2020/Folhapress

O CNSP (Conselho Nacional de Seguros Privados) ainda aprovou a indicação de prêmio zero para o DPVAT em 2021, graças ao excedente de recursos de R$ 4,3 bilhões.

Esse dinheiro adicional no caixa poderia ser resultado de irregularidades na gestão do DPVAT. Fiscalização específica do tribunal apurou 2.119 despesas (saídas de caixa) com recursos do seguro DPVAT consideradas suspeitas.

Entre elas, doações sob influência política, contratação de consultoria com interesse próprio da Líder, pagamento de participações nos lucros, convênios e patrocínios sem evidência de prestação de serviços.

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Essas operações correspondem ao valor, atualizado pela Selic, de R$ 2,25 bilhões. No total, o saldo a mais no caixa chega a R$ 4,2 bilhões, ainda segundo o TCU.

O seguro DPVAT foi tema de uma série de reportagens da Folha que mostraram denúncias de mau uso do dinheiro arrecadado —como a compra de veículos e garrafas de vinho— e de conflito de interesses e favorecimento de sindicatos de corretores.

As primeiras denúncias foram feitas em relatório da consultoria KPMG, contratada pela própria Líder para averiguar suas contas após apurações que sinalizavam um suposto esquema para a concessão de sinistros fraudulentos.

Em 2015, a Polícia Federal deflagrou a Operação Tempo de Despertar em que identificou fraudes e irregularidades no pagamento de indenizações do DPVAT.

Enquanto a gestão do seguro vai para a Caixa, a atual superintendente da Susep, Solange Vieira, corre o risco de perder seu posto para um nome indicado pelo governo em troca de apoio ao deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para o comando da Câmara.

Vieira foi indicada pelo ministro Paulo Guedes (Economia) para o cargo, mas desde o meio do ano passado políticos vêm pressionando o governo para substituir a gestora por alguém alinhado com o centrão.

Com a eleição para a presidência da Câmara e do Senado, a pressão aumentou. Segundo relatos, a superintendência e cargos atrelados a ela foram oferecidos em mais de uma ocasião por parlamentares ligados a Lira e pelo próprio candidato, em busca de votos.

O órgão entrou no jogo por ser considerado estratégico para um grupo de deputados —em 2020, teve orçamento atualizado de R$ 419,7 milhões. De acordo com integrantes do Legislativo e do mercado de seguros, são fortes os pedidos para que seja feita a troca de Solange.

Fiasco da operação Índia evidencia incompetência do governo Bolsonaro, FSP

 Indiferente ao sofrimento dos outros, deslumbrado com o prestígio de uma função que nunca sonhou exercer e ignorado por embaixadores de Brasília, o chanceler Ernesto Araújo era um dos raros brasileiros serenos durante a pandemia. Até o dia em que o general Pazuello entrou em sua sala para tentar salvar a honra do governo.

À primeira vista, o plano de buscar as primeiras vacinas na Índia podia fazer sentido. A visita presidencial ao país é lembrada como uma das raras agendas aproveitáveis do Itamaraty em 2020. Jair Bolsonaro regressara maravilhado com o projeto etnonacionalista formulado pelo premiê Narendra Modi.

O alinhamento de Brasília e Nova Déli na distribuição das vacinas daria uma robustez inesperada ao argumento do chanceler sobre uma nova ordem mundial conservadora e religiosa. O seu cargo, cada vez mais ameaçado, seria certamente reconduzido até o final do mandato.

Faltou avisar os indianos. Embora tenha dito que iria "ajudar toda a humanidade" em seu discurso na Assembleia Geral da ONU em setembro, Modi já deixou claro que vai cuidar primeiro dos seus cidadãos. O seu governo espera que a brutalidade do lockdown e o colapso da economia sejam compensadas por uma campanha épica de vacinação com fortes tons nacionalistas.

Apesar de ainda estar em fase inicial de testes, a vacina Covaxin, desenvolvida localmente, foi aprovada junto com a vacina de Oxford para promover o “made in India”. Em breve, a política do governo vai virar um problema geopolítico: as potências ocidentais vão precisar da Índia, responsável por 60% da produção mundial da vacina, para imunizar a suas próprias populações.

Olhando retrospectivamente para os fatos, parece incrível que um diplomata minimamente funcional tenha acreditado que a Índia toparia arriscar a credibilidade da maior campanha de imunização do mundo só para ajudar o Brasil. Discretos, os indianos tentaram baixar as expectativas e ficaram incrédulos, para não dizer ofendidos, quando viram o circo criado em torno do avião parado no Recife.

Isso sem falar da dimensão moral da operação. Na semana passada, países como Nepal e Bangladesh também enviaram emissários à Índia para negociar vacinas em caráter emergencial. Outros aguardam ansiosamente pela sua vez. Em plena crise humanitária, o governo Bolsonaro, que tem a Coronavac à disposição, achou sensato criar um constrangimento diplomático com o gigante da vacinação só para marcar pontos na sua briga provinciana contra o governador de São Paulo.

O mais frustrante de toda essa história é que o Brasil, com uma indústria de farmacêutica de ponta, uma estrutura logística consolidada, e a presença de laboratórios estrangeiros interessados em desenvolver vacinas, tinha todas as condições de ser a Índia da América Latina.

Ora, enquanto Modi ambiciona vacinar o equivalente da população brasileira até maio, Bolsonaro continua lutando para comprar seringas. A operação Índia mostra que, no governo Bolsonaro, é impossível separar a incompetência da má fé e a crueldade da falta de noção.

Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento e doutor em ciência política pela Universidade de Oxford (Inglaterra).