terça-feira, 21 de julho de 2020

PF suspeita que fundador da Qualicorp usou gráfica e TI para transferir R$ 5 mi de caixa 2 a Serra e aponta ligação com empresa da F1, OESP

Rayssa Motta e Pepita Ortega

21 de julho de 2020 | 12h59

O fundador da Qualicorp José Seripieri Junior. Foto: Denise Andrade/Estadão

Os investigadores da Polícia Federal apontaram indícios de que a Qualicorp tenha fraudado contratos para dissimular repasses à campanha de José Serra (PSDB-SP) ao Senado Federal em 2014. O delegado Milton Fornazari Júnior, responsável pela operação que prendeu nesta terça, 21, o fundador do conglomerado de planos de saúde, José Seripieri Junior, afirmou que o empresário montou uma ‘estrutura financeira e societária’ para ocultar a transferência do dinheiro da Justiça Eleitoral.

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Houve por parte do controlador desse conglomerado empresarial da área de Saúde uma solicitação para uma pessoa que era sócia dele em uma empresa para que criasse toda essa estrutura que tinha por objetivo a transferência de recursos para o candidato investigado”, afirmou o delegado.

Ouça por que a Lava Jato Eleitoral está no rastro de Serra:

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Ainda segundo Fornazari, os recursos foram repassados a um grupo que se encarregou da simulação de negócios jurídicos e contratos de compra e prestação de serviços para ‘justificar os repasses’ que teriam como destinatário final o tucano. De acordo com a PF, Serra teria recebido R$ 5 milhões em três parcelas – duas de R$ 1 milhão e outra de R$ 3 milhões.

“Foi criada assim uma estrutura financeira autônoma e profissional ali para que os recursos fossem repassados de maneira dissimulada visando impedir que as autoridades estatais tivessem o conhecimento daquela fraude”, explicou Fornazari.

A PF apontou indícios de fraudes em pelo menos duas frentes: na aquisição de licença de software e na contratação de serviços gráficos.

Além disso, os investigadores apuram a ligação do senador com uma empresa produtora de eventos de fórmula 1, que comercializa camarotes para corridas na capital paulista.

“Nas investigações em relação a essa empresa, que supostamente comercializava camarotes de Fórmula 1, nós identificamos uma elevada troca de valores com o partido do então candidato nas eleições de 2010. Nós identificamos também na busca de hoje a existência de contratos entre um dos sócios da empresa e o partido do então candidato. Nós conseguimos identificar robustos indícios da existência de vínculos entre os donos dessa empresa, que recebeu esses repasses por meio da criação de uma sociedade por conta de participação, e o candidato”, disse o delegado.

O senador José Serra. Foto: Alex Silva / Estadão

Caixa 2 eleitoral. Polícia Federal e o Ministério Público Eleitoral de São Paulo deflagraram na manhã de hoje a operação Paralelo 23 – a terceira fase da operação Lava Jato junto à Justiça Eleitoral de São Paulo – para investigar o suposto caixa dois na campanha de Serra.

Os agentes cumpriram três mandados de prisão temporária e outros 15 de busca e apreensão em São Paulo e no Distrito Federal. Entre os alvos das buscas na capital federal estava o gabinete de Serra. No entanto, a entrada dos policiais no Senado foi barrada pelo presidente da Casa, Davi Alcolumbre, que acionou o Supremo Tribunal Federal e obteve parecer favorável do ministro Dias Toffoli para suspensão das buscas.

A PF busca provas que demonstrem se a Qualicorp pagou o tucano em troca de uma atuação favorável no mandato como senador. “Nós vamos aprofundar a investigação agora na fase ostensiva para identificar se eventualmente o repasse desses valores foi uma doação eleitoral apenas ou se foi uma doação eleitoral não contabilizada visando uma contrapartida desse candidato, dada a atuação dele na área da Saúde, que poderia favorecer a empresa do investigado que efetuou esses pagamentos de maneira dissimulada”, adiantou delegado Fornazari.

COM A PALAVRA, JOSÉ SERRA

O senador José Serra foi surpreendido esta manhã com nova e abusiva operação de busca e apreensão em seus endereços, dois dos quais já haviam sido vasculhados há menos de 20 dias pela Polícia Federal. A decisão da Justiça Eleitoral é baseada em fatos antigos e em investigação até então desconhecida do senador e de sua defesa, na qual, ressalte-se, José Serra jamais foi ouvido.

José Serra lamenta a espetacularização que tem permeado ações deste tipo no país, reforça que jamais recebeu vantagens indevidas ao longo dos seus 40 anos de vida pública e sempre pautou sua carreira política na lisura e austeridade em relação aos gastos públicos. Importante reforçar que todas as contas de sua campanha, sempre a cargo do partido, foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.

Serra mantém sua confiança no Poder Judiciário e espera que esse caso seja esclarecido da melhor forma possível, para evitar que prosperem acusações falsas que atinjam sua honra.

COM A PALAVRA, A QUALICORP

“A nova administração da Companhia informa que adotará as medidas necessárias para apuração completa dos fatos narrados nas notícias divulgadas nesta manhã na imprensa, bem como colaborará com as autoridades públicas competentes”.

COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA CELSO VILARDI, QUE DEFENDE O FUNDADOR DA QUALICORP

O advogado Celso Vilardi, que defende o empresário José Seripieri, irá se manifestar assim que tiver acesso aos autos.

COM A PALAVRA, FLÁVIA RAHAL, ADVOGADA DE SERRA

A reportagem fez contato com a criminalista Flávia Rahal, que defende o senador José Serra. O espaço está aberto para manifestação.

COM A PALAVRA, O PSDB

O PSDB de São Paulo reitera sua confiança no senador José Serra, pautada nos mais de 40 anos de uma vida pública conduzida de forma proba e correta. Mantemos nossa confiança no poder judiciário e no esclarecimento dos fatos.


Governo fecha acordo do Fundeb em troca de apoio para criar o Renda Brasil, FSP

BRASÍLIA

O governo Jair Bolsonaro (sem partido) cedeu e fechou acordo com congressistas para que seja votado na Câmara o texto que renova o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

Principal mecanismo de financiamento da educação básica no país, o Fundeb vence neste ano. Desde o ano passado, uma nova proposta vem sendo discutida pela Câmara para, entre outros pontos, tornar o fundo permanente e ampliar a participação dos recursos federais. O complemento federal atual é de 10% —cerca de R$ 16 bilhões no ano.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) em tramitação na Câmara amplia a complementação e também altera o formato de distribuição dos recursos.

Ausente nas discussões que ocorrem no Congresso desde o ano passado, o governo tentava nos últimos dias destinar metade da complementação extra prevista no projeto para o Renda Brasil, programa de assistência social que Bolsonaro planeja implementar em substituição ao Bolsa Família.

Na manhã desta terça-feira (21), o governo chegou a orientar partidos aliados a obstruírem a votação caso não houvesse acordo.

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O acerto firmado em reunião nesta terça, na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não prevê recursos para o Renda Brasil. Também impede transferências para escolas privadas por meio de voucher, outra proposta do governo.

Para manter as linhas gerais do texto, lideranças do Congresso se comprometeram a garantir a verba para que o governo consiga tirar do papel a reformulação do Renda Brasil, projeto de assistência social.

Outra mudança é que o impacto da alta da complementação para o ano que vem também será suavizado.

A sessão será nesta terça. Após aprovação na Câmara, o texto precisa seguir para o Senado.

Há consenso para que a proposta preveja uma alta dos atuais 10% de complementação da União para 23%, contanto que se resguarde 5% para gastos na educação infantil, segundo integrantes da Economia, do Palácio do Planalto e congressistas.

O acordo segue a proposta discutida na segunda-feira (20). ​O texto em trâmite na Câmara previa complementação de 20%, de forma escalonada até 2026.

Sem conseguir emplacar sua versão, o governo topou ampliar a complementação a 23% para que haja recursos exclusivos para a educação infantil, prioridade no discurso do governo.

Segundo o texto acordado, os 10% atuais de complementação continuam sob o mesmo formato de distribuição. Dos recursos extras, 2,5% vão para municípios que obtenham bons resultados, o que já era previsto.

Os 10,5% restantes serão distribuídos com base no gasto municipal (o que atinge cidades pobres em estados mais ricos). Quase metade desse recurso (5%) terá de ser investido pelos municípios na educação infantil.

Após atualizações, a PEC da relatora, deputada Professora Dorinha (DEM-RJ), previa que, no primeiro ano de vigência do novo fundo, a complementação subisse para 12,5%. Agora, a progressão será mais lenta, começando com 12% em 2021.

O governo, com apoio de congressistas alinhados, insiste em estabelecer um teto, de 85%, para o uso dos recursos do Fundeb no pagamento de profissionais da educação. O texto da Dorinha vai na linha contrária, e fala em uso de ao menos 70% para salários, mas exige que 15% seja destinado a investimentos.

Atualmente, o pagamento de profissionais ativos consome cerca de 80% do fundo em estados e municípios, segundo estudo da organização D3E. Não há consenso sobre esse ponto.

A equipe econômica reclama que o texto não aponta de onde virá o dinheiro novo. Congressistas defendem, por sua vez, que a definição da origem é papel do Executivo.

Integrantes da equipe econômica afirmam que o governo pretende usar a reforma do Imposto de Renda como forma de gerar recursos para cobrir essa despesa com o Renda Brasil. Neste caso, a proposta mais firme é estabelecer um limite de deduções de gastos com saúde. Outra saída seria a tributação de dividendos, algo que exige um projeto de lei específico. Alguns auxiliares de Guedes cogitaram a reoneração da cesta básica, mas a ideia perdeu força.