domingo, 19 de julho de 2020

Brasil tem sido incapaz de fazer testagem em massa na epidemia, Drauzio Varella, FSP

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Os testes para o coronavírus nos deixam confusos.

Todos sabem que existem dois tipos: aquele do cotonete comprido, introduzido nas fossas nasais e na garganta (molecular ou RT-PCR), e o outro, colhido na ponta do dedo ou na veia (sorológico).

Ilustração de uma pessoa indo em direção a um precipício e arrastando várias pessoas com uma corrente que está em volta de todos. A pessoa está com uma faixa verde e amarela cobrindo os seus olhos e veste terno
Líbero/Folhapress

No RT-PCR pesquisamos diretamente o material genético do coronavírus nas secreções nasais e na orofaringe. Quando o resultado é positivo, há certeza da presença dele. O diagnóstico está feito.

No sorológico, procuramos detectar anticorpos específicos numa gota ou no sangue colhido na veia. É um exame indireto. Se existem anticorpos é porque houve contato com o vírus.

Enquanto RT-PCR faz o diagnóstico da infecção atual, o sorológico conta uma história do passado, já que o início da produção de anticorpos costuma ocorrer pelo menos uma semana depois da aquisição do vírus. Não serve para diagnosticar a infecção atual, sintomática ou não. Mostra apenas que ela ocorreu. Quando? Há uma semana, duas, dez? É impossível saber, porque um dos tipos de anticorpo (IgG) pode persistir no sangue por meses ou anos.

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Na coluna de hoje, prezado leitor, vamos falar das dúvidas mais frequentes sobre o teste RT-PCR.

1) Período de incubação

Os estudos revelam que o período médio de incubação do atual coronavírus, isto é, o tempo que vai do contágio ao aparecimento dos primeiros sintomas, é de 5,2 dias, em média.

Embora a Organização Mundial da Saúde, a OMS, recomende 14 dias de quarentena para quem entrou em contato com uma pessoa infectada, a experiência clínica revela que dez dias são suficientes. Instalação da doença depois de dez dias do contato são muito raras, se é que existem.

2) Momento ideal para testar

Nos que desenvolvem o quadro característico da doença (febre, tosse, fraqueza muscular, perda de olfato etc.), o ideal é que o exame seja realizado logo nos primeiros três dias contados a partir do primeiro sintoma. Se não for possível, quanto mais próximo desse período, melhor. Depois da primeira semana a positividade cai significativamente.

Nos casos graves, que exigem internação, o teste pode persistir positivo por mais tempo.

Naqueles que estiveram próximos de alguém infectado, mas permanecem sem sintomas, o melhor momento para a testagem é o quinto dia, contado a partir do contato. Caso o resultado seja negativo, o teste pode ser repetido no décimo dia. Se for negativo outra vez, na ausência de sintomas, não há necessidade de novos exames.

Os que estiveram em aglomerações e apresentarem resultado negativo no décimo dia dificilmente estarão infectados.

3) Falsos negativos

Há várias explicações para encontrarmos pessoas com todos os sintomas da doença, nas quais o resultado deu negativo: a) a coleta não foi bem feita ou o cotonete não atingiu os locais da mucosa em que o vírus estava presente; b) o exame foi colhido mais de uma semana depois do início dos sintomas; c) o material não foi mantido em geladeira entre 2 ºC e 8 ºC, por no máximo 72 horas, período a partir do qual necessita de estocagem em nitrogênio líquido.

4) Positividade prolongada do teste

Muitas empresas exigem repetição do teste depois dos 14 dias de quarentena, para admitir a volta ao trabalho dos funcionários infectados. É razoável?

Com frequência, o teste se torna negativo depois de duas a três semanas após os primeiros sintomas, mas não são raros os casos de positividade mantida por mais de um mês. A OMS recomenda que, depois de cumprir 14 dias de isolamento, os infectados voltem ao convívio social sem necessidade de novo teste, porque considera que fragmentos de RNA viral detectados depois desse período, não sejam
capazes de causar doença.

Qual o significado desses exames positivos por tanto tempo? Ainda há dúvidas, mas o fato é que não se consegue cultivar vírus viáveis nas secreções nasais depois do oitavo dia, em pelo menos 95% dos casos. Nos pacientes que estiveram internados em UTI esse período pode ser mais longo, achado que justifica prolongar a quarentena nesses casos.

Os países que conseguiram enfrentar a epidemia com menor número de mortes, foram os que fizeram testagem em massa. Nós temos sido incapazes. Quando a epidemia chegou, não dispúnhamos dos kits de RT-PCR. Agora temos 10 milhões estocados, mas faltam programas de abrangência nacional. O Brasil desanima a gente.

Drauzio Varella

Médico cancerologista, autor de “Estação Carandiru”.

Como abraçar alguém durante uma pandemia. NYT, FSP

Tara Parker-Pope
THE NEW YORK TIMES

Uma canadense ficou tão desesperada para abraçar sua mãe durante a quarentena que criou uma "luva do abraço", usando uma cortina de plástico transparente com mangas para que elas pudessem se abraçar sem se tocar. Um vídeo de dois primos no Kentucky se abraçando e chorando depois de semanas de separação em quarentena foi compartilhado milhares de vezes.

"Não esperávamos que reagissem desse modo", disse Amber Collins, que registrou a reunião de seu filho Huckson, 8, com a prima Rosalind Arnett, 10. "Eles ficaram tão felizes que não souberam como se expressar, a não ser chorando. Esse abraço mostra como o toque humano é realmente poderoso."

Não apenas sentimos falta dos abraços; nós precisamos deles. O afeto físico reduz o estresse ao acalmar nosso sistema nervoso simpático, que durante momentos de preocupação libera hormônios de estresse prejudiciais ao nosso corpo. Em uma série de estudos, simplesmente ficar de mãos dadas com uma pessoa amada reduzia a perturbação de um choque elétrico.

Mulheres em asilo na Bélgica se abraçam por meio de cortina de plástico para impedir infecção pela Covid-19 - Reuters

"Os seres humanos têm caminhos cerebrais que são especialmente dedicados a detectar o toque afetuoso", diz Johannes Eichstaedt, cientista social computacional e professor de psicologia na Universidade Stanford. "O toque afetuoso é o modo como nossos sistemas biológicos comunicam um ao outro que estamos seguros, que somos amados e não estamos sozinhos."

Para aprender a maneira mais segura de abraçar durante um surto viral, perguntei a Linsey Marr, cientista de aerossóis na Universidade Virginia Tech e uma das maiores especialistas mundiais em transmissão de doenças pelo ar, sobre o risco de exposição viral durante um abraço. Com base em modelos matemáticos de um estudo de Hong Kong, que mostra como os vírus respiratórios se deslocam durante um contato próximo, a doutora Marr calculou que o risco de exposição num abraço rápido pode ser surpreendentemente baixo, mesmo que você tenha abraçado uma pessoa que não sabia estar infectada e que por acaso tossiu.

Veja por quê. Não sabemos a dose exata necessária para que o novo coronavírus deixe alguém doente, mas as estimativas variam de 200 a 1.000 cópias do vírus. Uma tosse média pode carregar de 5.000 a 10.000 vírus, mas a maior parte deles cai ao chão ou sobre superfícies próximas.

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Quando as pessoas estão em contato próximo, geralmente apenas 2% do líquido da tosse —ou cerca de 100 a 200 vírus— seriam borrifados sobre ou inalados por uma pessoa próxima. Mas só 1% dessas partículas emitidas, apenas um ou dois vírus, será realmente infeccioso.

"Não sabemos quantos vírus infecciosos são necessários para deixar uma pessoa doente --provavelmente mais de um", disse a doutora Marr. "Se você não falar ou tossir enquanto estiver abraçando, o risco será muito baixo."

Há uma enorme variação em quantos vírus uma pessoa emite, por isso é mais seguro evitar abraços. Mas se você precisar de um, tome precauções. Use uma máscara. Abrace ao ar livre. Tente evitar tocar o corpo ou as roupas da outra pessoa com seu rosto e sua máscara. Não abrace alguém que estiver tossindo ou com outros sintomas.

E lembre-se de que alguns abraços são mais arriscados que outros. Apontem seus rostos em direções opostas —a posição do seu rosto é o mais importante. Não fale ou tussa enquanto estiver abraçando. E faça isso rapidamente. Aproximem-se um do outro e se abracem depressa. Quando terminarem, não fiquem parados. Recuem rapidamente para que não respirem nos respectivos rostos. Lavem as mãos depois.

E tentem não chorar. Lágrimas e narizes escorrendo aumentam o risco de entrar em contato com mais fluidos que contêm o vírus.

Algumas precauções podem parecer muito esforço para um simples abraço, mas as pessoas precisam de opções, já que a pandemia estará entre nós por algum tempo, segundo Julia Marcus, epidemiologista de doenças infecciosas e professora-assistente na Escola de Medicina de Harvard.

"Existe um verdadeiro desafio neste momento para as pessoas mais velhas que temem que não poderão tocar ou se conectar com parentes pelo resto da vida", disse a doutora Marcus. "Dar abraços rápidos é especialmente importante porque o risco de transmissão aumenta com o contato mais prolongado."

Aqui estão conselhos sobre como se deve abraçar, segundo a doutora Marr e outros especialistas.

Não se abracem frente a frente
"Essa posição é de maior risco, porque os rostos ficam muito próximos", disse a doutora Marr. "Quando a pessoa mais baixa olha para cima, a respiração exalada, por causa do calor e da animação, se desloca para a zona de respiração da pessoa mais alta. Se esta estiver olhando para baixo, há uma chance de que as respirações das duas se misturem."

Não se abracem de rostos colados, virados na mesma direção
Esta posição, com as duas pessoas olhando na mesma direção, também é de maior risco porque a respiração exalada de cada uma estará na zona de respiração da outra.

Olhem em direções opostas
Para um abraço seguro, com o corpo inteiro, virem seus rostos em direções opostas, o que impede que uma pessoa respire diretamente as partículas exaladas pela outra. Usem máscaras.

Deixe as crianças a abraçarem pelas pernas ou a cintura
Abraçar na altura do joelho ou da cintura reduz o risco de exposição direta a gotículas e aerossóis, porque os rostos estão distanciados. Há um potencial de que o rosto e a máscara da criança contaminem as roupas do adulto. Por isso você poderia trocar de roupas e lavar as mãos depois de uma visita que inclua abraços. O adulto também deve olhar para o outro lado para não respirar sobre a criança.

Beije seus netos na nuca
Neste cenário, os avós são minimamente expostos à respiração da criança. A criança pode ser exposta à respiração da pessoa mais alta, por isso beije-a através de uma máscara.

Julian Tang, virologista e professor-associado na Universidade de Leicester, na Grã-Bretanha, que estuda como os vírus respiratórios viajam pelo ar, disse que acrescentaria uma precaução ao abraço pandêmico: segure a respiração.

"A maioria dos abraços dura menos de dez segundos, então as pessoas devem conseguir fazer isso", disse o doutor Tang. "Recue a pelo menos dois metros de separação antes de voltarem a falar, para permitir que recuperem o fôlego a uma distância segura.

"Segurar a respiração impede que você exale qualquer vírus na zona respiratória da outra pessoa, se você estiver infectado sem saber --e impede que inale qualquer vírus dela, se estiver infectada."

Yuquo Li, professor de engenharia na Universidade de Hong Kong e autor principal do estudo que a doutora Marr citou para fazer os cálculos, disse que os abraços provavelmente representam menos risco que uma conversa demorada face a face. "O tempo de exposição é curto, ao contrário da conversa, que pode durar o tempo que quisermos", disse ele. "Mas nada de beijos."

Li disse que o risco de exposição viral pode ser maior durante o início do abraço, quando as pessoas se aproximam e podem respirar uma sobre a outra, e no final, quando elas se afastam. Usar máscara é importante, assim como lavar as mãos, porque diminuem o risco de pegar o vírus das mãos, da pele ou das roupas de outra pessoa.

Marr afirma que como o risco de um abraço rápido com precauções é muito baixo, mas não zero, as pessoas devem escolher muito bem quem vão abraçar.

"Eu abraçaria amigos próximos, mas evitaria outros mais casuais", disse ela. "Eu usaria a abordagem de Marie Kondo: o abraço tem de provocar felicidade."


Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves